segunda-feira, 26 de outubro de 2020

dos Comentários (72) Magalhães e a carta Hazine

Este assunto foi trazido pelo Djorge em resposta a um comentário de João Ribeiro, e também por email.

A carta Hazine nº1825, está no Museu Topkapi, em Istambul, e é provavelmente de autoria dos Reinel, do pai Pedro Reinel, ou do filho Jorge Reinel. Na sua generalidade apresenta-se assim:


Mas interessa especialmente a parte em que tem o contorno sul americano, pois evidencia o conhecimento das Ilhas Malvinas (ou Falkland) aqui destacadas com um círculo vermelho (mapa do site Malvinas-Falkland.net)


Na Portugaliae Monumenta Cartographica (PMC) a atribuição é feita a Pedro Reinel, em 1521, na sequência das informações trazidas por Estevão Gomes, que havia desertado. No entanto, na PMC é mencionada outra hipótese de M. Destombes, que invocava a possibilidade de esta ser a carta do próprio Magalhães. Argumenta-se que o estreito não está completo, e o que está escrito a vermelho, ao longo da costa é
  • hesta terra descobrio fernãdo de magalhães
Poderá ser inscrição posterior, e D. Couto (Anais de História Além-Mar, XX, 2019) avança uma possibilidade de se tratar de carta feita por Jorge Reinel, levada por Magalhães, e que Antonio Pigafetta teria entrado ao serviço do Império Otomano!

(...) fut vraisemblablement fabriquée par Jorge Reinel en 1519 et apportée à Istanbul par Pigafetta, l’un des dix-huit survivants du voyage de Magellan. Pigafetta déserta le camp chrétien peu de temps après son retour en Espagne, le 18 octobre 1522 ; il gagna l’Empire ottoman probablement après août 1524 et alla offrir ses services à Soliman le Magnifique (...)" 

ver também de Dejanirah Couto Em torno do globo: Magalhães, Pigafetta e a carta Hazine 1825

Em opinião de poder ser mesmo anterior a 1519, está Djorge que adiantou:

A dificuldade em conseguir uma resolução suficientemente boa para ler a toponimia, tb corrobora com a duvida se ela não será até anterior a 1519. 

De facto, esta é uma observação importante, porque tem todos os nomes indicados até ao Rio da Prata, e a partir daí, ao longo da costa da Argentina não aparece um único nome, excepto a menção que já referimos sobre a descoberta de Magalhães, mas que parece ser adição posterior.

Ora, ainda que a hipótese na PMC faça sentido, pois as informações de Estevão Gomes seriam recentes, isso não justificaria que não soubesse ou mencionasse os nomes com que haviam designado os diversos sítios onde tinham estado, nomeadamente o Porto de S. Julião e o Porto de Sta. Cruz, onde tinham invernado durante longos meses.

Teria sido esta a carta que Fernão de Magalhães teria usado, e que depois ficou na posse de Pigafetta, indo parar a mãos turcas? Bom, aqui é de duvidar que fosse a que indicava o Estreito, porque nela não encontramos essa passagem, parecendo mais sugerir uma possibilidade de contornar o Cabo Horn.

Em postal anterior, onde em comentário, Djorge já tinha sinalizado esta carta Hazine, parece-nos claro que a chamada carta de Piri Reis, é muito parecida, com as cartas de Reinel ou Lopo Homem no Atlas Miller:

Acresce, no entanto que, ao contrário de Piri Reis, o Atlas Miller tem mesmo uma possível continuação por um estreito... mesmo estando numa cartografia deformada, alargada a um continente antárctico.

Parece-me que há múltiplos factores que apontam no sentido de não haver grande dúvida que os portugueses tinham chegado ao extremo sul do continente americano, muito antes de Magalhães, e segundo Pigafetta, Magalhães era o primeiro a reconhecê-lo.
O que os impediria? Continuo a pensar que poderá ter sido Diogo Cão com Martin Behaim, ou João Afonso do Estreito com Fernão Dulmo, a explorarem esta parte sul. Mas sem outros dados, essa nomeação concreta mantém-se uma simples suposição.

Ainda mais concreto, é a referência ao mapa que o Infante D. Pedro trouxe, cem anos antes, e que mencionava a "Cauda do Dragão", a tal Draco Cola, na versão mais popular, Coca Cola.


sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Coreomania, epidemia dançarina

Coreomania, ou epidemia dançarina, foi um distúrbio mental ou físico que ocorreu na Idade Média, com casos reportados do Séc. VII ao XVII. Uma das histórias mais bem conhecidas passou-se em 1518 em Estrasburgo, quando uma mulher de nome Troffea começou a dançar sem parar, sem razão aparente.
Esta dança errática, mas não caótica, foi contaminando jovens, e muitos outros, até se estimarem centenas de pessoas dançando sem parar, nas ruas de Estrasburgo... até que foram hospitalizados, contando-se também que alguns teriam morrido por exaustão.


Pieter Brueghel (filho) reportou o fenómeno da coreomania.

Um tema que me pareceu importante rever, dadas as circunstâncias de paranóia impostas top-down, seria o de perceber como reagia a população em tempos de pandemia, nomeadamente, aquando da peste negra. 
Este caso da Frau Troffea, e da multidão dançarina que arrastou em Estrasburgo, não ocorre numa altura de peste, mas sim numa altura de fome... onde se suspeita que podem ter existido casos de intoxicação de ergotismo (que esteve na origem da síntese do LSD em 1943), causado pelo esporão-do-centeio, um fungo parasita do cereal. Isso causava alucinações, mas era especialmente notado pelas convulsões e gangrena associadas.

No entanto, a presença desta Coreomania tem um importante registo após a Peste Negra, em 1374, na Alemanha e Países Baixos - ver The Epidemics of the Middle Ages de J. F. C. Hecker, especialmente o capítulo "Dancing Mania in Germany and the Netherlands". 

Teve ocorrências anteriores, nomeadamente em 1237, envolvendo uma centena de crianças, que seguiram dançando sob a música, de Erfurt a Arnstadt, até caírem por exaustão... algo que poderá estar na origem da lenda do Flautista de Hamelin, que depois de encantar os ratos (responsáveis pela peste), e não se ver recompensado, encantou as crianças de Hamelin. 
Em 1278, em Utrecht, numa ponte, também cerca de duzentas pessoas dançando erraticamente em cima da ponte teriam levado ao colapso da estrutura, e ao seu afogamento.

Para além da possível relação com intoxicação pelo fungo, há quem suspeite de estímulo coordenado, ou resposta emocional imposta pelas dificuldades na Idade Média. Ou seja, não é muito claro qual será a resposta de uma população quando é encostada a um certo limite psicológico, e se nalguns casos poderá dever-se a eventual intoxicação, a adesão contaminante poderia ser um fenómeno social de libertação, exteriorizado da opressão para a dança. Em resposta a um comentário de João Ribeiro, brinquei que os "viras" poderiam ser uma alusão ao latim  "virus", dado que essa palavra latina declina em "viro", referente a veneno ou cheiro putrefacto. A coreografia da dança invocando trocas de par, mãos levantadas, e muito rodopio político, não deixa de poder ter outras leituras.

Peste negra e os judeus
No entanto, a resposta da população ao problema viral, causado pela Peste Negra, não deixou de ter outras componentes, mais ou menos expectáveis - os judeus!

No referido livro de Hecker, sobre a Peste Negra, há um capítulo sobre "Moral effects", e os efeitos morais, para além de um notado isolamento das pessoas, acompanhada por alguma solidariedade cristã, peregrinações de uns certos "Flagelantes" e da "Irmandade da Cruz", teve também os judeus como alvo, suspeitos de envenenarem os poços, e trazerem o mal. Fala em 12 mil judeus mortos em Mainz (Mayence), pois estes teriam inicialmente conseguido resistir, o que levou depois ao seu extermínio por acção dos cristãos com os "Flagelantes".
A wikipedia resume assim o início dos massacres contra os judeus:

"The first massacres directly related to the plague took place in April 1348 in Toulon, Provence where the Jewish quarter was sacked, and forty Jews were murdered in their homes; the next occurred in Barcelona. In 1349, massacres and persecution spread across Europe, including the Erfurt massacre, the Basel massacre, massacres in Aragon, and Flanders. 2000 Jews were burnt alive on 14 February 1349 in the "Valentine's Day" Strasbourg massacre, where the plague had not yet affected the city."

Portanto, uma das coisas em que convém haver algum cuidado, é numa certa percepção conspirativa de que os judeus são agentes financeiros, que lucram por trás de qualquer desgraça, e a Covid-19 não será excepção. Daí até serem apontados como suspeitos do costume... é apenas um passo, onde é fácil ver para onde os podem querer empurrar, certas tendências conspirativas de extrema direita.

São tempos de crendice, de muito rodopio, onde aqueles que parecem querer defender os nossos pontos de vista, são depois usados e manipulados no sentido oposto. E nesse vira dançarino, onde os governos optam pelas soluções de navegação à vista, sempre invocando cautela face à ignorância, mas recorrendo à mesma ciência ignorante, é aí que poderemos assistir a mais uma daquelas tragédias históricas, vivida nesta situação como testemunhas presenciais.

É daquelas situações em que muitos governantes gostariam de se poder desculpar com a resistência da população, mas ao invés disso, são pressionados a fazer pior, porque as populações amocham, e vão aceitando praticamente tudo... e não tendo desculpa para travar, só lhes resta passar por cima (para evitarem eles próprios serem cilindrados).

terça-feira, 20 de outubro de 2020

Fernão de Magalhães (3) pouco viral

Em 21 de Outubro de 1520, passam 500 anos, Fernão de Magalhães avistou a entrada no Estreito.
Conforme temos referido, não se passa nada, o que interessa são contas virais, soma e segue...

Demorou 3 dias, do Porto de Santa Cruz, onde estivera a invernar desde que saiu do Porto de S. Julião, a 23 de Agosto, a um ou dois dias de viagem. Ficou 2 meses parado, mas caso tivessem feito aquele percurso pela praia a pé, nem teriam demorado uma semana.

Ao cabo que define a entrada do estreito chamou das "Cabo das onze mil virgens", e ao estreito que ficou com o seu nome chamou "Estreito de Todos os Santos"... nomes apropriados, porque houve certamente muitos santos e virgens que por ali deixaram o seu suor e sangue, sem rasto histórico ter ficado da sua passagem.

Uma saída natural do estreito seria seguir para sul, pelo canal Magdalena, algo que encarregou a Estevão Gomes de fazer, ao que este achou por bem desertar e regressar a Espanha, conforme já mencionámos.

Durante um mês esteve provavelmente a procurar saídas viáveis, a cartografar, bom, creio que não se saberá muito bem, mas é depois suposto ter tomado a rota mais natural que lhe permitiu sair daquele labirinto de ilhas e entrar no Oceano Pacífico. Ficam aqui algumas das imagens do que poderá ter vislumbrado durante esse percurso... e pouco terá mudado:

Imagem do farol em Punta Dungeness - o Cabo das 11 Mil Virgens.

Em baixo, diversas imagens dentro do Estreito de Magalhães no Google Maps:



Há 10 anos atrás, disse e continuo a achar plausível, que Magalhães poderia também estar numa missão para apagar vestígios de presença portuguesa, ou outra, naquelas paragens. Ainda que se justifique a paragem à beira do Estreito, chegaram a Porto de São Julião a 31 de Março, portanto estão mais de 6 meses à boca do estreito, quase sem se mexerem. Quando saem de São Julião vão para o Porto de Santa Cruz que está a pouca distância, a um ou dois dias de navegação.

Tudo indica que Magalhães sabia que o Estreito era ali, conforme Pigaffeta diz, tinha isso assinalado em mapa, mas chegou justamente na pior altura, do inverno sul-americano. 

Creio que esses 6 meses em terra tiveram outro propósito, e levava portugueses suficientes para o fazerem. Esse propósito seria eliminar eventuais traços deixados, como padrões ou outras decorações, que aí tivessem ficado, de viagens portuguesas, ou ainda anteriores. 

Foi ainda durante este tempo que Magalhães teve contacto com os "Patagões", que dariam nome à Patagónia. Estes gigantes que Buffon dizia não se poder duvidar que existissem, desapareceram, para que também ninguém pudesse acreditar que tinham existido.

Mas toda esta situação, repetida incessantemente na História, tem levado a resultados nulos, ou perto disso, porque a população é completamente afastada de qualquer dúvida, porque quem determina o controlo está apostado em mostrar que não pode ser doutra forma. 

Dou um exemplo... em 30 de Junho de 2014 fiz um aditamento à Wikipedia inglesa onde juntei o seguinte no Estreito de Magalhães (também juntei na Wikipedia portuguesa, onde não houve alterações):

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Accounts before Magellan

It was reported by António Galvão in 1563 that the position of the Strait of Magellan was previously mentioned in old charts as Dragon's Tail (Draco Cola):[1]

... he (Pedro) brought a map which had all the circuit of the world described. The Strait of Magellan was called the Dragon's Tail; and there were also the Cape of Good Hope and the coast of Africa. ... Francisco de Sousa Tavares told me that in the year 1528, the Infant D. Fernando showed him a map which had been found in the Cartorio of Alcobaça, which had been made more than 120 years before, the which contained all the navigation of India with the Cape of Good Hope. - Galvano - | Discovery of the World, sub ann. 1428.

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Esse aditamento foi entretanto modificado (sublinho a amarelo)... mas vá lá, ficou a parte principal. Vejamos como está agora:

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Accounts before Magellan

There is no historical evidence of the knowledge of the strait prior to the Spanish expedition of Ferdinand Magellan [14]. In 1563, António Galvão reported that the position of the strait was previously mentioned in old charts as Dragon's Tail (Draco Cola):[a]

[Peter, Duke of Coimbra] brought a map which had all the circuit of the world described. The Strait of Magellan was called the Dragon's Tail; and there were also the Cape of Good Hope and the coast of Africa. ... Francisco de Sousa Tavares told me that in the year 1528, the Infant D. Fernando showed him a map which had been found in the Cartorio of Alcobaça, which had been made more than 120 years before, the which contained all the navigation of India with the Cape of Good Hope. [16]

Although this would suggest that the strait was mentioned in maps before the Americas were discovered by Europeans, the claim has been considered dubious.[14][b]

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As referências a [14] trata-se de um artigo "South America on Maps before Columbus? Martellus's ‘Dragon's Tail’ Peninsula" de William A. R. Richardson (2003), que visa apenas um mapa de Martellus e só o nome "Dragon's Tail" tem em comum com a referência de Galvão. Deixo o resumo do artigo:

Abstract: Henricus Martellus's four world maps of c.1489 show a non‐existent Asian peninsula east of the Aurea Chersonesus (the Malay peninsula). For some decades a group of scholars in Latin America has been claiming that this so‐called ‘Dragon's Tail’ peninsula is really a pre‐Columbian map of South America. In this paper, the cartographical and place‐name evidence is examined, showing that the identification has not been proved, and that perceived similarities between the river and coastal outlines on this ‘Dragon's Tail’ peninsula and those of South America are fortuitous. Ptolemy's depiction of an enclosed Indian Ocean was invalidated when Bartolomeu Dias rounded the Cape of Good Hope. Consequently, a year or two later, Martellus adapted the east Asian section of Ptolemy's world map, providing China with an east coast and turning the southward extension of Asia into a peninsula. The non‐Ptolemaic place‐names on these maps were derived from Marco Polo's writings.

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Vou fazer o quê?
Vou-me chatear pelo facto de alguém querer manter as aparências da versão oficial?
Claro que não...  Porquê?

- Porque um mundo em que a mentira e contradição se sobreponham à verdade e consistência, tem os dias contados. Mesmo que todos os dias provem que não, que é possível manipular todos até à exaustão, o que interessa a opinião de parasitas virais, face ao universo em que se inserem? 
Sim, os vírus parasitam o hospedeiro, mas o seu maior sucesso não é na morte dele que levará à morte dos próprios, o seu maior sucesso é reduzirem-se a uma certa insignificância, que garantirá a sobrevivência de ambos... e de preferência, sem que o hospedeiro perceba que está a ser parasitado.

domingo, 18 de outubro de 2020

Protocolos serpentinos (5)

Continuamos com os protocolos... denunciados por Serge Nilus em 1903-05, e que revelariam os passos de um plano judaico, sionista, para domínio do mundo. Ou, numa hipótese oposta, revelariam um esquema de culpar os judeus, por planos efectivos que estavam na cabeça da aristocracia russa.

Com o advento da segunda vaga, a população europeia começa a perceber melhor o significado do vírus. A palavra COVID não é nova, já existiu como unidade de medida no Oriente... na China, em particular:


Este é um trecho do livro Foreign Measures and their English values de Robert Carrington (1864), onde se percebe que Covid era um "pé chinês". No entanto a medida "Covid" era muito colonial, aparecia também na Índia, Indonésia, Malaca, etc. Poderia ser uma variante fonética do "côvado", uma antiga medida, representando um antebraço.

Em termos de abreviaturas Covid, como COrona VIrus Disease, faria mais sentido ser Covidis.
Bom, e se Quo Vadis é "para onde vais?", Quo Vidis, será mais "até onde vês?"...

5º Protocolo (Despotismo e Progresso)

  • Que forma de administração pode ser dada a comunidades minadas por corrupção? Onde a moralidade é apenas mantida por medidas penais, pois não há princípios respeitados de forma voluntária? A resposta é um despotismo que se propõe explicar. Desde logo anuncia que o governo será centralizado, para manter sob seu poder a força comunitária. A vida política será determinada por novas leis. Essas leis vão tirar uma a uma, todas as liberdades aos "goyim" (não-judeus). Reclama que o despotismo será tal, que em qualquer instante podem fazer desaparecer qualquer "goyim" que se oponha por actos ou palavras. A quem argumentar que o despotismo de que fala não é consistente com o progresso, ele pretende mostrar o contrário.
  • Acrescenta que antes as pessoas também olhavam para os reis como sendo a manifestação de vontade divina, mas eles induziram na população um olhar diferente, tornando os reis meros mortais, ao mesmo tempo que roubavam a crença em Deus.
  • Diz que sobre a arte de dirigir massas e indivíduos, pela arte da retórica e manipulação, não há quem se possa comparar aos judeus. Só nos planos de acção política encontraram rivais nos Jesuítas, que conseguiram desacreditar aos olhos da multidão acéfala, como uma organização aberta, enquanto eles conseguiam manter a sua organização submersa.
  • Considera a hipótese de poder haver uma coligação de "goyim" de todo o mundo, contra si, com sucesso temporário. Mas nesse caso, diz ele, há que confiar na permanente discórdia entre "goyim" que tem raízes tão remotas que nem os próprios imaginam, e que eles alimentaram durante 20 séculos. Não há nação que vá em ajuda de outra, sem temer o prejuízo que seria ficar sem apoio judaico. Clama que são demasiado fortes, e que as nações não conseguem acordar entre si, sem que esteja por trás uma mão judia.
  • Per me reges regnant - usa esta citação latina que invoca que Deus reina através dos reis, invocando os profetas que clamaram que eles foram os escolhidos por Deus para reinar sobre toda a Terra. Que Deus lhes deu o génio para essa tarefa, e que se alguma vez houvesse um génio do outro lado que lhes fizesse frente, teria toda a desvantagem de um novato, face a sábios já estabelecidos. Toda a maquinaria dos Estados, o dinheiro, foi inventada pelos velhos judeus, e deu prestígio ao capital.
  • Argumenta que o capital deve ser livre, para estabelecer monopólio do comércio e indústria, e que isto já é feito em todo o mundo. Essa liberdade do capital dá poder aos industriais, e ajudará a oprimir o povo. Agora, diz, é mais importante ir desarmando os homens do que levá-los para a guerra. É mais vantajoso manipular as suas paixões do que acicatar os seus ódios. O principal objectivo é debilitar a opinião pública pela crítica, afastá-los de reflexões sérias, calculadas para gerar resistência. Deve-se distrair as forças da mente para uma inútil luta de eloquência vazia.
  • Considera que em todas as eras, povo e indivíduos, tomaram palavras por acções, porque se satisfazem com o espectáculo, e raramente verificam se as promessas foram cumpridas. Por isso vão fundar instituições que darão eloquentes razões do seu benefício para o progresso. Vão-se misturar em todos os partidos e direcções, encontrando oradores que aborreçam de morte os seus ouvintes.
  • Para colocar a opinião pública nas suas mãos, é necessário dar voz a todas as opiniões contraditórias, por um longo período de tempo, para que os "goyim" percam a cabeça num labirinto de opiniões, e concluam que o melhor é não ter qualquer opinião política. Isto não pode ser dado a perceber ao público, e só é entendido por quem guia o público. Este é o primeiro segredo, diz ele.
  • O segundo segredo, para o sucesso do seu governo, é multiplicar os falhanços, hábitos, paixões e condições da vida civil, que será impossível a alguém se orientar no caos resultante. Em consequência todos discordam, e é semeado o caos, para guiar as forças colectivas que ainda não se queiram submeter. Enfatiza que não há nada pior do que a iniciativa individual... porque se tiver um génio por trás, pode fazer pior do que milhões de pessoas em que foi semeada a discórdia. Devem dirigir a educação dos "goyim" para que assim que surja alguma iniciativa individual ela redunde rapidamente em desesperante impotência; para que a liberdade de uns seja parada pela liberdade dos outros. Desse encontro resultam choques morais, falhanços e desencantamentos. 
  • Assim, diz ele, os goyim serão forçados a dar-nos o poder, que vão absorver gradualmente e sem violência, controlando os poderes do mundo num super-governo. Ao invés de dirigentes passa a ficar no seu lugar uma Administração Super-governamental, cujas mãos se estendem em todas as direcções. Uma organização tão colossal, que será impossível não dominar todas as nações do mundo.

terça-feira, 13 de outubro de 2020

Fernão de Magalhães (2) Saturno

Este postal começa com uma imagem de Saturno. É supostamente uma imagem tirada por um amador (Steve Hill), pois para efeitos de alguma relação com a realidade, prefiro isso, a usar imagens da NASA.

A questão é - por que razão haveria de colocar a imagem de Saturno num postal sobre Magalhães?

Numa versão simbólica, poderia dizer-se que representaria a volta ao mundo feita pelo português.
Afinal, o anel assenta bem numa ilustração dessa viagem, à volta ao globo.
Porém não é assim tão simples... e também não estou a insinuar que Magalhães foi até Saturno!

Por estranho que pareça, depois de ter feito o primeiro postal sobre Fernão de Magalhães, tinha pensado fazer o segundo postal agora, já que daqui a uma semana comemoram-se 500 anos da sua chegada ao Estreito que tem o seu nome, mais precisamente ao Cabo das 11 Mil Virgens, conforme lhe chamou.
Provavelmente poderia até me esquecer, mas as sonantes comemorações, as tais que ninguém vê nem ouve, talvez me fizessem lembrar mais tarde. 

No entanto, foi Sanchoniato que fez o favor de me lembrar... ou melhor, a tradução que já reencontrei, de Carlos Oliveira e Silva, feita em 1931, e publicada na revista "O Instituto" no seu número 82. Bom, e o que diz Sanchoniato (versão do latim de F. Wagenfeld):

  •  At vero Saturnus, dum orbem lustrat universum, Minervæ filiæ totius Atticæ regnum tradit. 
com o meu latim, que é rudimentar, não chegaria à tradução que Carlos Oliveira e Silva faz:
  • Foi após esta circunstância que Saturno doou toda a Attica a sua filha Minerva por ocasião duma viagem de circum-navegação da terra.
A tradução não é literal, e assim fui directamente ao grego que estava em Wagenfeld, que supostamente seria o lido do texto grego de Filo de Biblos, encontrado no convento português:

Sublinhei as palavras que são fáceis de perceber: 
  • "Kai" significa "E"; "Kpóvos" lê-se Cronos, ou seja, Saturno; "nepiïwv" lê-se "perion", como em périplo; "oikoumévnv" será ecúmena, ou seja, o mundo habitável. Depois vem "A&nva", que se lê Atena, etc... "Attixns" que será a Ática, e a última palavra é "basileia", que será rainha. 
Convém entender que a passagem para latim introduz uma série de lixo na tradução, mas do grego percebe-se que Cronos teria feito um périplo pelo mundo... se era habitável ou não, será mais uma interpretação actual, e Wagenfeld escolhe "universum", ou seja, o mundo. A tradução portuguesa para "circum-navegação" parece-me puxada, pois ainda que o prefixo peri seja similar a circum, não vejo a sugestão de navegação... ainda que não fosse imaginada doutra forma.

Portanto, este texto não fala propriamente de Magalhães, fala de Saturno, Cronos, ou ainda do correspondente fenício El (que é o nome judaico para Deus). 
Ainda que possa ser disputado qual o significado efectivo de tal afirmação, no contexto de divindades, convém notar que as divindades fenícias em Sanchoniato estavam associadas a reis humanos, a quem posteriormente foi declarado culto. Aliás essa mesma visão pode ser encontrada em Eumero de Messena, (ou Evêmero) que atribui a "circum-navegação" do mundo, por 5 vezes, a Zeus, filho de Cronos... talvez porque duas vezes não fossem suficientes para suplantar o pai.

Por coincidência, ou não, o planeta Saturno é quem tem o anel, o que meu ver representa bem a ideia de circum-navegação. 
Dir-se-à que quando os antigos atribuíram o nome ao planeta, não poderiam saber que este tinha um anel, já que mesmo Galileu não o conseguiu descortinar, e só Huyghens em 1655 atribuiu um anel a Saturno. 

Pois, mas isso é seguindo a velha filosofia de que os burros eram os outros, e os espertos somos nós.
À conta dessa historieta de cordel, já se podem ter acabado e recomeçado 12 mundos... sempre dizendo aos mais novos que antes o pessoal vivia na Idade de Pedra, depois veio a Antiguidade, etc. 
"Ah, e tal, mas os pais e os avós não deixariam que isso acontecesse" - sim, se restassem pais e avós.
"Que horror, quem poderia congeminar tal coisa?..." - dou um exemplo - quem quisesse tecnologia do Séc. XXI para brincar como se fosse faraó no Antigo Egipto.
O problema não é eu escrever isto, o problema é não ter já sido escrito por mais alguém...

Bom, mas deixando isso de lado, não havia vidro de grande qualidade na Roma Antiga?
Portanto, qual era a dificuldade de produzir lentes? 
Não sabia Arquimedes da focagem de espelhos, para queimar a frota romana? 
Por que razão não haveriam de se deparar com lupas, mesmo que não quisessem?
É claro que não nos chegaram estátuas de romanos com óculos.
Como é que isso haveria de entrar na narrativa?

A questão é que é perfeitamente natural que o nome de Saturno, Cronos ou El, esteja ligado ao primeiro rei que fez, ou mandou fazer, a primeira circum-navegação, mesmo que fosse atravessando pelo Panamá e não pelo Estreito de Magalhães. Só depois disso, poderia garantir que dominava de facto todo o mundo, e não apenas o cantinho que conhecia. 

Os Aztecas podem ter tido a ilusão de que dominando o seu cantinho no México, estavam com a situação sob controlo, até que... 200 anos depois apanharam com os espanhóis em cima. 
Podem ter havido tantas outras civilizações pré-colombianas que... subitamente, desapareceram. 
Será que já tinham crescido o suficiente, e achou-se ser precisa uma purga? 
Não é nada que os romanos não pudessem pensar.

O que é certo é que as civilizações mais antigas na América, Incas e Aztecas, estavam consolidadas há pouco tempo, tinham 100 ou 200 anos, quando apareceram os espanhóis. 
As civilizações americanas só se lembraram de aparecer nessa altura? 
As anteriores auto-destruiram-se? Ninguém sobrou para as reconstruir?
É lamentável dizer isto, mas creio que podemos não estar imunes de culpas...

Bom, da próxima vez falarei mesmo de Magalhães.
Aqui só achei interessante esta referência à circum-navegação de Saturno, que veio a propósito.

domingo, 11 de outubro de 2020

A massa da maça que amassa e maça (4)

Este texto é sobre um manuscrito de Sanchoniato, mas começo por lembrar alguns textos encadeados em 11 pontos, sobre o problema da Cobertura, escritos em 2013:

A história de Sanchoniato, é a versão fenícia da História, que terá sido escrita antes da Guerra de Tróia, que nos chegou através de um manuscrito grego, de Filo de Biblos

Bom, normalmente o que se sabia de Sanchoniato não vinha da tradução grega de Filo de Biblos, era apenas citada por Eusébio (de Cesareia) na sua Praeparatio evangelica, em que procurava mostrar a superioridade cristã sobre outras religiões. Curiosamente, Eusébio marca aí uma troca de cartas entre Jesus Cristo e o rei Abgar V, de Edessa.

Sobre o original de Filo de Biblos nada se sabia, até que após, as guerras liberais, surgiu a notícia de que teria sido encontrado num convento português... de nome "Merinhan". Este episódio é em si mesmo rocambolesco, e passo a explicar o que encontrei:

neste artigo o autor diz que os jornais anunciavam a descoberta, há seis meses:

Aussi a-t-il dû apprendre avec une joie bien sans doute mêlée de quelque incertitude, la nouvelle annoncé il y a environ six mois par les journaux, que la traduction grecque de Sanchuniathon, par Philon de Byblos, avait été retrouvée dans un couvent de Portugal.

mas aquilo que tinha saído publicado era uma primeira tradução para latim, depois publicada por F. Wagenfeld em Hanover (1837). Ao que parece nunca mais se viu o original grego... e num artigo inglês no The Foreign Quarterly Review, Volume 19 (1837), pág 184 diz-se isto: 

  • As to the place of discovery, we are informed by natives of Lisbon and Oporto that the name of Merinhan is not Portuguese at all, and that they know of no convent so called. It may be a similar name, and an obscure place; and this obscurity may have concealed the manuscript. We are aware that ancient Portuguese history has never been properly examined, even by the natives, and that many points of similitude or difference connect them with, or sever them from, the various tribes of the Peninsula of Spain. Some such cause might operate for the possession of the manuscript in question; but in any case the production of this manuscript will triumphantly answer all doubts, and vindicate the critical acumen of the learped Professor.

Ou seja, duvidava-se da existência do original... mas devemos ter em atenção que este "Merinhan" pode ser um fraco entendimento de "Marinha" (havia o Convento de Santa Marinha da Costa). 

O aparecimento de tal original grego, ou talvez apenas uma cópia monástica, seria facilmente ligado à pilhagem organizada pelos liberais, aquando do fim das Ordens Monásticas, em 1834. Se apareceu, voltou a desaparecer, e encontrar uma tradução do texto, mesmo em inglês, foi coisa em que não tive sucesso. 

O texto parece ter sido irritantemente inconveniente, e foi submerso de novo, pela falta de atenção que lhe foi dada. Ainda assim encontrei excertos de traduções portuguesas, feitas numa publicação chamada "Instituto" (Biblioteca da Univ. Coimbra). Neste fim de semana, deixei de ter acesso... azar!
Ficamos com a versão em latim, o que serve para praticar...

Hércules - Melqart - escultura fenícia (Museu de Cádis)


Hércules - Melicarto
Bom, e qual poderia ser a importância de tal manuscrito para a história ibérica?
A importância principal é que o nome Tartesso aparece mais de 40 vezes. Tartesso era um antigo reino ibérico cuja cidade principal foi Tarsis, ou Cádis. Tantas vezes quantas aparece o nome de Melicarthus, ou seja, Melqart, Hércules na versão fenícia, e que na versão de Bernardo de Brito será o Hércules Líbico.

Dou alguns exemplos...

  • Regnat autem ille in Tartessiorum regione, ultimi orbis populi
  • Ele reinava na região de Tartessos, a última cidade povoada.
Quem era este? Ou seja, que rei foi deposto por Hércules?
Alguém viu o nome Masisaba antes escrito?
  • Jam vero Liathanam Masisabas, Tartessiorum rex in hanc insulam demovit, ex qua effugere non potest.
Aqui fui ajudado pelo comentário do artigo inglês, que diz que Masisaba tinha aprisionado Liathanam, uma princesa com pés de serpente, numa ilha da qual não podia fugir. 
  • Per multos navigantes dies in Occidentem, arcem conspiciunt loco mediterraneo sitam. Jam vero erant in Tartesso atque arx illa erat Masisabæ. Qui cum navem conspexisset virosque, descendit, ut cum iis dimicaret. Erat autem Melicartho capite major, armis præclarus, corpore valido atque veloci. 
  • Navegando muitos dias para Ocidente, até encontrar aquele lugar mediterrânico. Mas agora, em Tartessos estava Masisaba. Que quando os navios viu, desceu, apenas para lutar. Hércules era o capitão maior, claro de armas, corpo e veloz.
Neste apontamento dá conta do confronto directo entre Masisaba e Hércules. Em texto anterior, na imagem do prólogo da Genealogia do Infante D. Fernando está uma imagem que pode reflectir esta suposta batalha. O rei peludo no centro da imagem será Hércules, e os adversários aparecem como faunos...

Ao lado coloquei a imagem de uma estátua que é suposto representar Hércules a dominar Caco. Ainda que Caco também apareça referido por Bernardo de Brito, é já numa fase bastante posterior, em que aparece um Hércules grego na expedição dos Argonautas. Mais correctamente seria Gerião, ou antes, os 3 Geriões, chamados Lomínios. 
Portanto, haverá uma eventual ligação deste Masisaba, que seria o tal Gerião. O mito grego apenas fala de um Gerião de 3 cabeças, que seriam os seus filhos...
  • Melicarthum autem, qui tanta peregerat facinora, Deum esse videbant, itemque ejus socios, sed minores. Freto autem adjacent duo promontoria et Melicarthus in utroque erexit columnam, quæ etiam nostris temporibus conspiciuntur, nominatæ a Melicartho.
  • Hércules pelo tanto que fez na juventude, vivia como um deus, assim como seus companheiros, porém menores. Num estreito de dois promontórios adjacentes, Hércules elevou em ambos pilares, que mesmo no nosso tempo são nomeados de Hércules.
Bom, e aqui nesta parte a habitual referência às Colunas de Hércules.

Mas talvez, o trecho mais inesperado, será este:
  • Sed longe prospicienti a genis tibi defluent lacrymæ humectantes terram, et pontus resonabit carmine lugubri; naves enim longæ in finibus Tartessiorum fractæ. sunt, filiorumque tuorum fortissimi in ripa longe remota obierunt.
  • No entanto, na face do teu rosto fluem lágrimas que humedecem a terra, e o mar entoa canções lúgubres. Os teus navios foram quebrados nos confins de Tartesso, onde os teus fortes filhos naquele rio distante morreram.
Isto encontra-se segundo o comentário inglês numa Canção de Sídon atribuída a Sanchoniato:
  • But lift up thine eyes afar! Tears shall roll down thy cheeks to water the land; and the sea shall resound with the voice of thy wailing.
  • For thy ships are broken to pieces in Tartessus, and the best of thy sons are laid on a foreign shore, a prey to the vulture and the fishes!
Apesar disto ser uma análise preliminar ao texto, e ainda não consegui enquadrar o contexto, nem ver todas as ocorrências, é bastante significativo de que a história de Tartesso não era, conforme pretendia o comentador inglês, a história de uma região de "espanhóis selvagens"... ou seriam tão selvagens que dos invasores fenícios não restavam nem navios, nem filhos.

domingo, 4 de outubro de 2020

Descobrimentos em diversos anos e tempos (6)

Em 2016 comecei a transcrever o tratado dos descobrimentos de António Galvão, com a intenção de fazê-lo até à parte «Descobrimentos das Antilhas & Indias pelos Espanhóis feitas», o que aconteceu, porque então me interessava essa primeira parte. 

Entretanto o tema dos descobrimentos repetiu-se e voltei a pegar no manuscrito, porque mesmo quando Galvão segue a versão oficializada, ele consegue juntar sempre alguma matéria de interesse. 
Ainda que escreva longe do período da expansão, 1480-1520, teria tido informações do pai, o cronista Duarte Galvão, para além da capitania das ilhas Molucas que exerceu em 1536, recheada de actos de grande heroísmo, sendo nesse caso um relato em primeira mão.

Por exemplo, Galvão dá nomes alternativos a todas as ilhas que os espanhóis "descobriram", para bom entendedor perceber que as ilhas tinham outros nomes, ou dos nativos, ou colocados pelos portugueses. 
  • Por exemplo, Porto Rico era Boriquem (ou talvez Boliqueime...), nome dado pelos nativos.
  • A descoberta de Colombo, deixou os espanhóis em alvoroço, ao ponto de quererem ir a nado...
  • Dá conta que a viagem de Caboto terá explorado a costa da América, desde 70ºN (Labrador) até à zona de Washington (38ºN), ou mesmo até à Flórida.
  • Fala de vários bichos, p.ex: um marsupial, que será o gambá, no monatim, etc.
  • É ainda curioso falar no Amazonas como rio das Mazonas.
  • Conta de uma exploração em 1501-02 que chegou a 32ºS, limite do Brasil, já perto do Uruguai.
  • É interessante que Isabel de Castela só permitisse o descobrimento por castelhanos.
  • Em 1506, na expedição de Tristão da Cunha, separou-se Álvaro Teles de tal forma, que terá sido o primeiro a atingir a ilha de Sumatra.
  • Em Sumatra usava-se moeda, "dracmas", que diziam vir do tempo do Romanos (ou gregos?).

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DESCOBRIMENTOS 
em diversos anos & tempos, 
& quem foram os primeiros que navegaram.
por António Galvão (1563)

continuação de (5) e (4) (3) (2) (1)
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Descobrimentos das Antilhas & Indias pelos Espanhóis feitas

No ano de 1492, estando el rey D. Fernando de Castela sobre a cidade de Grada [Granada], despachou Christovam Colom italiano, com três navios ao descobrimento da nova Espanha; o qual primeiro viera a Portugal a el rey D. João, e o não quis aceitar. Partiu da vila de Pallos a três de Agosto levando consigo por capitães e pilotos Martim Alonso Pição [Pinzón], e Bartolomeu Colon seu irmão, e 120 pessoas. E querem dizer alguns que fossem os primeiros que navegassem por alturas; nas ilhas Canárias tomaram refresco, daí foram na volta do Sagarço [sargaço]: e vendo o mar dele coalhado ficaram espantados e com grande arreceu chegaram às Antilhas a dez dias do mês de Outubro.
E a primeira ilha que viram se chamava Greinani [Guanahani (Galvão usa um nome diferente!)], saíram em terra e tomaram posse dela, puseram-lhe nome Sam Salvador: depois viram muitas a que chamaram as princesas, por serem as primeiras por eles vistas, mas os da terra lhes chamam os Lucayos, ainda que todas têm nomes separados, e estão na parte do norte, quase no Trópico de Cancro, da parte do Norte de 16 graus até 17, que é a ilha de Santiago.

Daqui foram à ilha a que os da terra chamam Cuba, e os castelhanos puseram o nome Fernandina, por el rey D. Fernando, a qual está em 22 graus, donde os índios os levaram a outra que eles chamam Ahyti [Haiti], e os castelhanos Isabela, em memória da rainha de Castela: e também a Espanhola [Hispaniola].
Aqui se perdeu a nau capitã, e da madeira dela fizeram uma tranqueira, onde deixaram 38 homens, e capitão deles Rodrigo darena [de Arena], para aprenderem a língua e costumes da terra, de onde trouxeram mostras de ouro, papagaios e outras coisas que lá havia, e 10 índios de que se escaparam 6 que se cá baptizaram. E pôs isto em tão grande alvoroço e desejo aos Espanhóis, que a nado queriam ir àquela terra; e na volta vieram pelas ilhas dos Açores. E a 4 de Março do ano de 493 entraram pela barra de Lisboa: de que el rey D. João lhe pesou tanto que teve diferença sobre estas terras com o de Castela.

Tanto que Christovam Colon chegou a Castela com esta nova, e de como el rey D. João lhe pesava ela, el rey D. Fernando e dona Isabel, mandaram logo ao Papa Alexandre Sexto, da qual nova ele e todo o povo ficaram maravilhados haver terra que os Romãos [Romanos] não tiveram notícia, havendo-se por senhores da redondeza, e fez logo doação delas aos reis de Leão e Castela, com tal condição que trabalhassem como se a idolatria desarreigasse, e a nossa santa fé multiplicada. Chegada esta resposta, tornou el rey D. Fernando mandar Christovam Colon ao descobrimento, já Almirante com outras honras, mercês e insígnias, e derredor das suas armas uma letra que dizia, por Castela & Leon novo mundo achou Colon.

No ano de 493, aos 25 do mês de Outubro, tornou Christovam Colon às Antilhas, e da barra de Calez [Cádis] tomou sua derrota, levando 17 velas e 1500 homens nelas, e seus irmãos, Bartolomeu Colon e Diogo Colon, e outros fidalgos, cavaleiros, e letrados, e religiosos com calezes, cruzes, e ricos ornamentos de grande poder do Papa Alexandre. E aos 10 dias chegaram às Canárias e delas a 25 ou 30 dias às Antilhas. A primeira ilha que viram está em 14º da parte norte lestoeste com o cabo Verde, diz que haveria dela às Canárias 800 léguas, puseram-lhe o nome a Desejada, pelos desejos que levavam de ver terra, e logo viram muitas outras, a que puseram o nome de Virgens: ainda que os da terra lhes chamem Quiribas, por ser de homens guerreiros e bons flecheiros, atiram com erva tão peçonhenta que quem morre dela morde a si mesmo, como cão danado.

Destas ilhas em outras foram ter à principal delas, a que os da terra chamam Boriquem [Porto Rico], e os castelhanos São João, de onde chegaram à Espanhola ou ilha Bela [Hispaniola ou Isabela], e acharam todos os homens mortos, que nela deixaram, por ofensas que aos da terra fizeram; aqui deixou o Almirante a maior parte da gente para povoá-la, e seus irmãos governadores dela; e embarcou em dois navios, foi descobrir a costada da ilha de Cuba, e daí a Iamaica [Jamaica], que agora se chama Santiago, todas estas ilhas estão de 17 até 20 graus de altura da parte do norte. E enquanto lá andou o Almirante, seus irmãos com os que ali ficaram passaram assaz trabalhos e desventuras por se alevantar a terra; tornou Christovam Colõ outra vez a Castela, a dar conta a el rey e à rainha do que lá passara.

No ano de 1494 e mês de Janeiro se averiguaram as diferenças que entre estes dois reis havia: e foi a isso Rui de Sousa e dom João seu filho, e o doutor Aires de Almada; e da parte de Castela, dom Anrique Anriquez, dom Iorge de Cardines, e o doutor Maldonado, ajuntaram-se todos em Tordesilhas e partiram a redondeza de Norte a Sul por um meridiano que está a poente das ilhas do Cabo Verde 370 léguas, e que a metade que ficasse ao Levante fosse de Portugal, e Ocidente de Castela, e o mar e terra para caminhar fosse a todos igual. No ano seguinte de 95 faleceu el rey D. João, e começou a reinar D. Manuel seu primo.

No ano de 1496 achando-se um veneziano por nome Sebastião Gaboto [Caboto] em Inglaterra, e ouvindo nova de tão novo descobrimento como este era: e vendo em uma poma [bola] como estas ilhas acima ditas estão, quase num paralelo, e altura, e muito mais perto de sua terra uma a outra, que de Portugal nem Castela; o amostrou a el rey D. Anrique sétimo [Henrique VII], do que ele ficou tão satisfeito, que mandou logo armar dois navios, partiu na primavera com 300 companheiros, fez seu caminho a loeste à vista de terra, e 45º de altura da parte do norte, foram por ela até 70º, onde os dias são de 18 horas, e as noites muito claras e serenas.
Havia aqui muita frialdade e ilhas de neve, que não achavam fundo em 70, 80, 100 braças, mas achavam grandes gelos [regelos], de que também receavam. E como daqui por diante torna-se a costa ao levante, fizeram-se na outra volta ao longo dela, descobrindo toda a baía, rio, enseada, para ver se passava da outra banda, e foram assim diminuindo de altura até 38º, de onde se tornaram a Inglaterra.
Outros querem dizer que chegassem à ponta da Florida, que está em 25º.

No ano de 1497, tornou el rey D. Fernando a mandar às Antilhas Christovão Colõ com 6 navios, ele armou 2 à sua custa,  mandou seu irmão à frente: partiu ele da baía de Calez [Cádis] levando consigo dom Diogo Colon, seu filho. Diz que foi tomar a ilha da Madeira, com receio dos franceses, de onde mandou 3 navios, outros querem dizer das Canárias; como quer que seja, ele e três foram à ilha do cabo Verde, e correu ao longo da linha, em que achou grande calmaria e chuveiros. E a primeira terra que viram das Antilhas foi uma ilha que está em 9º Norte, pegada com a terra firme; puseram-lhe o nome a Trindade: entraram no golfo de Parca, e saíram por uma boca a que chamam do Drago, tomaram na mão a costa, e acharam 3 pontas, a que puseram o nome: Testigos, e adiante a ilha Cubaga [Cubagua], que é grande pescaria de aljofre.
Também dizem que tem fonte de azeite, e mais adiante viram as ilhas de Paragry, Roques, e Heruma: e o Coraceo [Curaçao], e outras pequenas ao longo da praia. Chegaram à ponta que se chama da Vela, descobriram por costa 150, ou 200 léguas, onde atravessaram a Ilha Espanhola, e houveram vista da que se chama Beata.

Há nestas ilhas e terras uns bichos ou pássaros a que chamam Cocoyos, têm quatro estrelas, duas nos olhos, e as outras debaixo das asas, dão claridade como candeias: podem escrever ou fiar, cozer e tecer com elas, e as levam para alumiarem, e se untam as mãos, e rostos com estas estrelas, parece que ardem em fogo. Há outro bicho que chamam Nigu, salta como pulga, é muito mais pequeno, mete-se entre unha e carne, e põem ali de improviso tanta lêndea, que se não lhe acodem logo multiplicam de maneira que perdem os dedos, e ficam aleijados, alguns a vida.
Há também nestas partes outro bicho do tamanho de um gato, anda pelas árvores, dependura-se dos ramos pelo rabo, e depois que pare os filhos, tornam-se a meter por um buraco que tem junto da natura: neste entreolho da barriga tem uma mama com que o cria, por onde parece que anda prenhe até ser de idade que a natureza o despede, e vai buscar sua vida.
Galvão descreveu aqui um marsupial, que será o gambá, também dito opossum.

Há nestas ilhas muitos, e diversos pescados, e um que se não entende se é alimária se peixe, tem pés, e mãos como lagarto, focinho, e rabo como galgo, cria-se na água, e na terra pelas árvores, põem ovos como de galinhas, de que se geram, tem a casca delgada, se os fritam não se coalham com azeite, nem manteiga, senão com água: em quanto estes bichos são pequenos, passam por cima da água com tanta presteza, que se não vão ao fundo, mas parece que correm por terra até certo tempo, dali por diante andam por baixo de água ao longo da areia por não saberem nadar, nem tem para isso maneira, comem-nos no carnal [carnaval], e Quaresma.     [desconheço o bicho aqui tratado]

Galvão descreve de seguida o manatim.

Há lá um peixe que se chama Monatim [Manatim], é grande, e de coiro, tem a cabeça e rosto de vaca, e também na carne parece muito a ela, tem uns braços junto dos ombros com que nadam; o mais de seu comer é erva que nasce ao longo da água é muito saboroso, tem umas pedras na cabeça que são proveitosas para a dor de pedra, e a fêmea tem tetas nos peitos com que criam os filhos que nascem vivos.
Há outro pescado a que chamam Reverso pouco maior de um palmo, tem espinhos como ouriço cacheiro, criam-nos no mar em um covão, atam-nos num cordel comprido, tomam com eles monatins, e outros grandes pescados, e trazem-nos como furões aos coelhos; aqui há muitas sardinhas, estes bichos pescados se vêem em Maluco, e naquelas Ilhas, e a gente se parece com a da nova Espanha, e assim comem alguns lá carne humana.

No mesmo ano de 497, a vinte dias do mês de Julho, partiu Vasco da Gama por mandado del rey D. Manoel, de Lisboa para a India com três velas, iam por capitães Vasco da Gama, e Paulo da Gama seu irmão, e Nicolau Coelho, e cento e vinte homens nelas; ia mais um navio com mantimentos, e em treze dias foram ao Cabo Verde à Ilha de Santiago a tomar refresco, e daí foram ao longo da terra: e além do Cabo de Boa Esperança puseram padrões nela. Chegados a Moçambique, que está em 13º da parte do meio-dia [ou seja, sul], fizeram aí pouca detença: foram a Mombaça e a Melinde, el rey dele lhe deu pilotos, que os puseram na India, na qual travessia descobriram os baixos de Padua [em Cananor].

No ano de 1498. no mês de Maio, surgiram na cidade de Calecut, e Panane, e estiveram todo o Inverno, e o primeiro de Setembro se fizeram à vela, e foram contra o Norte descobrindo aquela costa até a ilha d'Angediva que está daquela parte em 15º de altura, onde surgiram na entrada do mês de Outubro; partiram de Angediva, e no de Fevereiro do ano de 499 houveram vista da terra de África, acima de Melinde contra o Norte 3º ou 4º: daí foram àquela cidade, e dela a Moçambique, e ao Cabo de Boa Esperança, e tomaram na mão a costa, e vieram às ilhas do Cabo Verde, e à cidade de Lisboa na entrada do mês de Setembro, e puseram 26 meses neste caminho.

No ano de 499, a treze dias do mês de Novembro, partiram de Palos, Vicente Anez Piçã, e seu sobrinho Aires Piçam com quatro navios que armaram à sua custa, para descobrimento do novo Mundo, com licença del rey de Castela, e regimento que não tocasse no que o Almirante Colon tinha descoberto, pelo que foram às ilhas do Cabo Verde, e passaram a Linha da outra parte do Sul, e descobriram o Cabo de Santo Agostinho que está daquela banda em 8º de altura, e escreveram em troncos de árvores, e penedos o nome del rei e rainha com alguns deles, e o ano e dia que ali chegaram; pelejaram com os Brasis, e não guardaram nada.
Tomaram na mão a Costa contra o Poente, e no rio Maria, Tambal, cativaram neste tempo trinta e tantos índios, tomaram o cabo primeiro, Angra de sam Lucas, a terra dos Fumos, o rio Maranhõ, e o das Mazonas [Amazonas], e rio Doçe, e outras partes ao longo da costa chegaram à Paria em 10º de altura da parte do Norte, perderam dois navios e gente. Puseram na viagem e descobrimento dez meses e meio.

No ano de 1500 e entrada de Março, partiu Pedralvarez Cabral com treze velas, com regimento que se afastasse da costa Dafrica [d'África], para encurtar a via. E tendo uma nau perdida, em sua busca perdeu a derrota, e indo fora dela, toparam sinais da terra, por onde o capitão mór foi em sua busca tantos dias que os da armada lhe requereram que deixasse aquela profia: mas ao outro dia viram a costa do Brasil. E mandou o capitão mór um navio apalpar se achava porto, tornou dizendo que achava bom, e seguro, e assim lhe puseram o nome, e dizem que está da parte do Sul em 17º de altura.
Daqui se fizeram à vela na volta do Cabo de Boa Esperança, e de Melinde, e atravessaram à outra banda, e no rio de Cochim que se ainda não sabia, e carregaram de pimenta. E à tornada Sancho de Thovar descobriu a cidade de Çofala [Sofala].

Neste mesmo ano de 500 diz que pediu Gaspar Corte Real licença a el Rey D. Manoel para ir descobrir a terra Nova. Partiu da ilha Terceira com dois navios armados à sua custa, foi àquele clima que está debaixo do Norte em 50º de altura. É terra que se agora chama de seu nome, tornou a salvamento à cidade de Lixboa. Fazendo outra vez este caminho, se perdeu o navio em que ele ia, e o outro tornou a Portugal. Pela qual causa seu irmão Miguel Corte Real foi em sua busca com três navios armados à sua custa. Chegados àquela costa, como viram muitas bocas de rios e abras, entrou cada um pela sua, com regimento que se ajuntassem todos até vinte dias do mês Dagosto [d'Agosto]: os dois navios assim o fizeram. E vendo que não vinha Miguel Corte Real ao prazo, nem depois algum tempo, se tornaram a este reino, sem nunca mais dele se saber nova, nem ficar outra memória, se não chamar-se esta terra dos Corte Reais ainda agora.

No ano de 1501 e mês de Março, partiu João de Nova com quatro velas da cidade de Lisboa, e além da Linha da parte do Sul em 8º de altura descobriram a ilha a que puseram nome da Concepção [Ascensão], e foram a Moçambique, e de Melinde atravessaram a outra banda, tomando carrega se tornaram, e dobrado o Cabo em 17º de altura, acharam a ilha a que puseram nome de Santa Elena [Helena] cousa pequena, mas muito nomeada.

Neste mesmo ano de 1501 e mês de Maio partiram três navios da cidade de Lisboa por mandado del rey D. Manoel, a descobrir a Costa do Brasil, e foram a ver vista das Canárias, e daí o Cabo Verde, tomaram refresco em Beziguiche [perto do cabo verde], passada a linha da parte do Sul, foram tomar terra no Brasil em 5º de altura, e foram por ela até 32º pouco mais ou menos, segundo sua conta, de onde se tornaram no mês de Abril por haver já lá frio e tormenta, puseram neste descobrimento, e viagem quinze meses, por tornarem a Lisboa na entrada de Setembro.

Neste ano, ou no seguinte, foram ao descobrimento da nova Espanha Alonso de hijada [Hijeda], e trouxe sua derrota até reconhecer a Provincia de Sinta. E no ano seguinte partiu Rodrigo de Bastidas de Sevilha, com duas caravelas armadas à sua custa, e a primeira terra que das Antilhas tomaram foi uma Ilha a que puseram nome Verde, que está junto da Guadalupe contra a terra, e tomada na mão a volta contra o Poente a Santa Marta, e a Cabo da Vela, e ao rio Grande, e descobriram o porto de Zamba, os Coroados, Cartagena, e as ilhas de S. Bernardo de Baru, e as áreas, foram diante à Ilha Forte, e à ponta de Caribana, que está no cabo do Golfão de Uraba, viram os Farelones, que estão da outra banda junto Dariem [d'Ariem], e do Cabo da Vila até esta enseada há trinta léguas, está em nove graus e meio de altura. Daqui atravessaram a ilha de Zamayca [Jamaica], onde tomaram refresco, e na Espanhola deram com os navios à costa pelo gusano que há muito, levaram quarenta marcos de ouro que por esta terra regataram, ainda que a gente da terra é mais guerreira que há na Nova Espanha, e atiram com erva [ou seja, com veneno nas setas].

No ano de 502 tornou Christovam Colom a quarta vez a este descobrimento com quatro navios por mandado del rey D. Fernando a buscar o estreito, que diziam cortar a terra à outra banda, levava consigo D. Fernando seu filho: foram ter à Ilha Espanhola, e de Iamaica, e ao rio Nheser [em Nicaragua?], e ao cabo de Figueira, e às ilhas dos Gamares, e ao porto das Fonduras [Honduras?]: e daí contra o Levante ao Cabo de Graças a Deos, e descobriu a província, e Rio Veraga, e o rio Grande, e outros que os da terra chamam Hievra, E daí foi ter ao rio dos Lagartos, que se agora chama Chegres [Chagres], que tem seu nascimento ao mar do Sul, e sai ao do Norte, passa de Panamá quarenta léguas, e foi à Ilha que pôs nome dos Bastimentos, e ao porto Bello, e a Nombre de Dios, e ao Rio Francisco, e ao porto do Retrete, e ao Golfão de Secativa, e às Ilhas de Caparrosa, e ao Cabo de Marmol, que são duzentas léguas de costa, donde começaram, tornou à Ilha de Cuba, e daí a Iamaica, onde acabou de dar com os quatro navios à costa por serem já mui gastados do gusano.

No ano de 502 tornou D. Vasco da Gama já Almirante à Índia, levou 19 ou 20 caravelas: partiu de Lisboa a 10 de Fevereiro, na fim dele surgiu no Cabo Verde, donde foi a Moçambique, e o primeiro que desta ilha atravessou para a Índia, e descobriu outra em quatro graus de altura, a que pôs nome a do Almirante, tomou carrega de pimenta, e drogas, e deixou lá por guarda da costa da India com cinco velas, Vicente Sodré. Estes foram os primeiros Portugueses que d'Armada correram a costa de Arábia, a que chamam Felix, ela é tão estéril que não se mantêm os gados, e camelos senão em peixe seco que do mar lhe levam, e serão eles tantos que os gatos os tomam. E no ano seguinte segundo dizem descobriu Antonio de Saldanha a ilha que se chama Dioscorodis, e agora Socotorá, e o Cabo de Guarda foy [Guardafui] com aquela terra.

No ano de 504. armaram João de Cosa, vizinho de Santa Maria del Puerto, e o piloto Rodrigo de Bastidas, com ajuda de Ioam de Ledesma, e outros de Sevilha, com licença del Rey D. Fernando quatro caravelas, e foram a descobrir a terra nova onde se chama Cartagena, que está em dez graus e meio da parte do Norte, e diz que acharam ali o Capitão Luis da Guerra, e juntos todos saltaram [assaltaram] na ilha do Codego, tomaram nela seiscentas pessoas, foram por aquela costa, e entraram no Golfão de Uraba: e na areia acharam ouro misturado com ela, e foi o primeiro que se dali trouxe a El Rey D. Fernando, onde foram à cidade de Sam Domingos carregados de escravos sem resgate nem mantimento: porque os da terra não quiseram contratar com ele e lhe fizeram muito dano. E no fim deste ano de 504 faleceu a Rainha Dona Isabel de Castella, e enquanto foi viva não consentiu que fossem do descobrimento da Nova Espanha, Aragões, Catalões, Valencianos, nem nenhuns do património del Rey D. Fernando seu marido, salvo se fosse seu criado, ou por especial mandado; somente Castelhanos, Galegos, Biscaínhos, e os de seu senhorio que esta terra descobriram.

No ano de 505. dia de Nossa Senhora de Março, partiu D. Francisco Dalmeyda [de Almeida], Viso Rey [vice-rei] da India com vinte e duas velas, fez seu caminho na volta do Brasil, como se já costumava. Chegado à cidade de Quiloa, assentou fortaleza, capitão dela Pero Ferreira, e além de Melinde atravessou a Ilha d'Angediva, onde fez Capitão Manoel Paçanha [Pessanha]. Em Cananor edificou outra, deu a capitania a Lourenço de Brito. Em Cochim o mesmo, e capitão D. Afonso de Noronha. Neste ano fez Pero danhaya [de Anaia] a fortaleza de Sofala, de que teve a capitania. 
No fim deste ano, ou na entrada do outro, mandou o Viso Rey a D. Lourenço seu filho às ilhas de Maldiva, e com tempo contrário, arribou às ilhas, a que os antigos chamaram Tragana [Taprobana?], e os Mouros Itterubenero, e nós agora Ceilam [Ceilão], onde saiu em terra, e assentou paz com os de ali, tornou a Cochim ao longo da costa, deixando-a toda sabida. No meio desta ilha está hum pico de pedra mui alto, e uma pegada de homem, e na sumida dele que dizem ser do nosso pai Adão, quando subiu aos Céus, têm-no os Índios em grande veneração.

No ano de 506, depois da Rainha Dona Isabel falecer, veio El Rey Felipe, e a Rainha Dona Joana sua mulher a Espanha tomar posse, El Rey D. Fernando se foi a Aragão por ser seu património: e neste meio ano faleceu El Rey Felipe, e tornou governar Castela El Rey D. Fernando, e deu licença aos Espanhóis que pudessem ir à terra nova e Antilhas salvo os Portugueses. E neste mesmo ano, e mês de Maio faleceu Christovam Columbo, e sucedeu em seu lugar seu filho dom Diogo Columbo.
Neste mesmo ano de 506, e entrada do mês de Março, partiu Tristam da Cunha, e Afonso Dalburquerque para India, e quatorze velas em sua companhia, foy surgir em Bezeguichi, pera refrescarem, e antes que chegassem ao cabo de Boa Esperança em trinta e sete graus daltura acharam umas ilhas, que se agora chamam de Tristam da Cunha, onde lhe deu tão grande tormenta, que se espalhou toda a frota. Tristam da Cunha, e Afonfo Dalbuquerque que foram ter a Moçambique, Alvoro Telez, correu tão largo, que foi à terra de Samatra [Sumatra], donde se tornou ao Cabo de Guardafui deixando descuberto muitas ilhas, mar, e terra, nunca até àquele tempo por Portugueses vista. 
Manoel Telez de Menezes também varou por fora daquela gram ilha de sam Lourenço, e correu toda sua costa, foi ter a Moçambique com Tristam da Cunha, que foi o primeiro capitaõ que ali invernara, e por lhe dizerem que nesta ilha havia muito gengibre, cravo, e prata, tornou a descobrir muita dela pela parte de dentro, e não achando nada se tornou a Moçambique, donde partiram pera Melinde, correram aquela costa, saíram em Brava, e daí passaram à ilha de Sacatorá, onde fizeram Fortaleza, capitão dela dom António de Noronha.

No ano de 1507, no mês d'Agosto partiu Tristão da Cunha para a India e Afõso Dalbuquerque que ali ficava com cinco, ou seis navios para guarda da costa, e boca daquele estreito, não se contentando disto se passou Arabia, e correndo-a toda, dobrou o Cabo de Rosalgata, que está no Trópico de cancro. 

No ano de 1509 partiu Diogo Lopez de Seqyra [Sequeira] de Lisboa com quatro velas para a ilha de sam Lourenço, andou derredor dela quasi um ano, e no 19 do mês de Maio chegou a Cochim, o VisoRey lhe deu mais um navio. E na entrada do mês de Setembro, partiu para Malaca, passou por entre as Ilhas de Nicobar, e outras muitas: e foy à terra de Samatra às Cidades de Pedir, e Pacem: e por toda essa costa até à Ilha da Polvoreira, e baixos de Capacea: e daí se passaram a Malaca, que esta em dois graus d'altura da parte do Norte, e por lhe matarem, e cativarem nesta cidade gente, se tornou para a India deixando quinhentas léguas descobertas. 

Esta ilha de Samatra [Sumatra] é a primeira terra que lá sabemos, em que se come carne humana, umas gentes que vivem nas serras que se chamam Bacas, douram os dentes, dizem que a carne dos homens pretos é mais saborosa que a dos brancos: e assim as bufaras [bufalas], vacas, galinhas que há naquelas partes, são de carnes tão pretas como esta tinta. Diziam haver aí homens a que chamam Dara que dara, que têm rabos como carneiros, aqui há azeite que tiram de poços: El Rey de Pedir me disse que por sua terra corria um rio dele; não se deve de haver por muito, pois se acha escrito, que na Batriana há uma fonte de óleo: e assim contam haver aqui uma árvore que o çumo [sumo] dela é forte peçonha, e se toca em sangue logo a pessoa morre, e bebendo-o é coisa muy provada contra ela, assim que dá morte e vida: bate-se aqui moeda d'ouro a que chamam dragmas, dizem que os Romãos a trouxeram a esta terra, parece alguma coisa, porque daqui por diante não se bate moeda d'ouro, mas corre-se ele por mercadoria.

No ano de 1508 armaram à sua custa com licença del Rey D. Fernando, Alonso de Hijada, e Diogo de Recusa, para ir povoar, e conquistar a rovincia Doriem, e descobrir a terra firme, onde se chama Uraba que puseram nome Castella do Ouro, pelo que acharam na areia ao longo da praia, e foram os primeiros Castelhanos que isso fizeram: porque um tinha a governança de Uraba, e outro de Beraga. Partiu primeiro Alonso de Hijada da Ilha Espanhola, e cidade de Santiago com quatro navios, e trezentos soldados, deixando o bacharel Ansiso, que depois fez um livro deste descobrimento, para ir atrás dele num navio com mantimentos e munições, e cento e cinquenta Espanhóis: Chegou Alonso de Hijada a Cartagena, onde tomou terra, e os dela lhe mataram, e comeram oitenta soldados, de que ficou muito agastado. 

Neste mesmo ano de 508 armou Diogo de Nequisa no porto de Beata sete velas para ir a Beraga, e levou nelas perto de oitocentos homens. Chegado a Cartagena, achou aí Alonso de Hijada assaz agastado pelo que lhe sucedera, saíram ambos em terra, tomaram vingança, e se foram cada um à sua governança, Diogo de Necusa foi descobrindo a costa que é de Nombre de Dios aos Roquedos [Rochedos] de Dariem chamou porto de Misas ao rio Pico: chegado a Beraga deu com a armada à costa, por os soldados perderem esperança de tomarem a Espanhola: e ainda que este ardil de guerra tivesse depois Fernam Cortez, não foi ele primeiro naquela terra (como alguns têm, e cuidam) Alonso de Hijada começou uma Fortaleza em Caribana Solar dos Caribas, e foi a primeira vila que os Castelhanos em terra firme fizeram, e assim em Nombre de Dios, cidade de Nossa Senhora del Antiga, e a Villa de Uraba, donde deixaram por capitão, e teniente Francisco Piçarro [Pizarro], que levou aí assaz trabalho, (e descobrirá depois a de Peru). E assim fizeram outras que não nomeio, porque estes capitães não tiveram tão bom sucesso como cuidavam, e isto abasta a meu propósito.

No ano de 1509 chegou o segundo Almirante dom Diogo Colom à ilha Espanhola, com sua mulher, e casa, e como era nobre, e fidalga, levou muitas mulheres, e de boa casta que lá casaram, e começaram de Castelhanos de encher a terra, porque el Rey D. Fernando tinha dado licença que pudessem lá ir descobrir, povoar, todos os povos de Espanha, por onde aquela terra foi mais enobrecida, e frequentada e também este Almirante deu ordem como se povoasse a ilha da Cuba, que é cousa grande, e pôs nela para isso por seu adiantado a Diogo Valhasquez que fora com seu pai na armada segunda.

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