No antepenúltimo Capítulo da Crónica de D. João II, Garcia de Resende relata:
Depois do falecimento d'el-rey o bispo de Tanger e o prior do Crato, secretamente e sós, com a casa despejada, por os outros senhores serem idos a suas pousadas ordenar sua partida para Silves, como ambas eram feituras d'el-rey e muy aceitos a ele, abriram uma sua boeta de que ele sempre trouxe a chave; por ouvirem dizer e haver entre alguns suspeita que el-rey trazia ali peçonha com que mandara matar o bispo Dom Garcia, para que sendo assim a deitassem no mar, e não se soubesse tamanha vergonha. E abrindo a boeta com esta boa e leal tenção de bons criados, acharam nela um confissionário e umas disciplinas, e um áspero silício, que era bem desviado do que cuidavam e tornaram a fechar a boeta. (...)
Garcia de Resende faz uma cuidada descrição dos últimos dias de D. João II, desde a sua ida às Caldas de Monchique até Alvor. Aqui tenta desmistificar que D. João II pudesse ter guardado algo inconveniente, mas ao fazê-lo desta forma, dá ainda a entender que todos estariam à espera que houvesse algo escondido, pelo menos na boeta.
A única coisa estranha nessa boeta parece ser o "áspero silício"... a que se pode associar uma descrição de uma cavalgada solitária pela Serra de Monchique, conforme descrito no Capítulo 209:
E ao outro dia terça-feira também entrou nas Caldas pela manhã, e à noite muito contente de si, e dizendo que se achava melhor. E assim entrou a quarta-feira pela manhã, e à tarde porque aí perto estavam porcos emprazados para monte, perguntou aos físicos se poderia lá ir, e disseram-lhe que sim. E bem forrado para o frio e coberto para o ar embuçado com touca e um chapéu por ordem dos físicos foi lá em cavalo muito manso, em que vinha no caminho. E sendo lá, ou pelos quatro banhos que tinha tomados, ou pelo abalo que fez se achou mal, e veio com muito grande dor de estômago e com fluxo que logo muito apertou, com que ficou muito agastado e triste porque por se achar os dias dantes bem, tinha muita esperança de sua saúde e com este fluxo ficou duvidoso dela; e por não poder mais esteve nas Caldas a noite da quarta-feira, e a quinta e a sexta-feira com grandes agastamentos.
Fica sempre aquela questão de saber se D. João II levou consigo todos os seus segredos, ou se ainda poderá ter deixado algum "Tesouro" na Serra de Monchique...