Os cartagineses desapareceram de cena por volta de 150 a.C., e será de suspeitar que houvesse um resto de cultura fenícia no Médio Oriente, pelo menos implantada entre o sul da Síria e o norte de Israel, incluindo aí o actual Líbano, a localização predominante da cultura fenícia. Mas convém notar que um resto de cultura cartaginesa tinha ainda espaço na Ibéria, em Gades, ou seja Cadiz, entre tartessos e cónios. Essa parte irá sucumbir também com o avanço romano, especialmente após o assassinato do lusitano Viriato, e eventualmente com a sua cumplicidade, na eliminação cónia.
As viagens cartagineses, fenícias e dos tartessos, além dos pilares de Hércules, podem ter sido quebradas, e isso gerou um problema comercial em todo o Mediterrâneo, porque era através deles que se processava uma boa parte do comércio em grande escala na Antiguidade.
Os romanos não substituíram logo esse papel, e houve diversos problemas sociais, resultantes de uma desigual distribuição da propriedade, e de um crescimento de Roma. Menos de 15 anos depois da queda de Cartago, as desigualdades sociais começaram a fazer-se sentir, levando a uma Lex Sempronia Agraria, ou seja, uma tentativa de Reforma Agrária dos irmãos tribunos Tibério e Caio Graco, que acabaram ambos assassinados...
Tibério e Caio Graco
Os Gracos eram plebeus ricos, consta que
educados por mestres gregos, e tinham como mãe
Cornélia Africana, ou seja, a filha de Cipião Africano, que derrotara Aníbal em Zama. Portanto, se o pai Graco era de ascendência plebeia, a mãe era da fina flor patrícia, libertadora do perigo do general cartaginês Aníbal (... ainda hoje se ouve em Itália "
Hannibal ante portas", para referir um perigo iminente).
Tibério Graco, portanto neto de Cipião Africano, consta ter sido o primeiro a escalar as muralhas de Cartago, no cerco consumado levado a cabo pelo seu cunhado, Cipião Emiliano. Tibério esteve depois na Hispania, e conseguiu uma rápida fama com a formação do partido Popular, defendendo claramente os plebeus, tal como depois aconteceu com o seu irmão, após a sua morte, ambos mortos por inimigos do Senado. Foi esse aliás um destino habitual dos membros do partido Popular - começou com os Gracos, e terminou com César. Os membros do partido Optimal, aristocrático, usavam de métodos mais tradicionais.
Portanto, a Roma vencedora de Cartago, viu-se a braços com sucessivas guerras civis, e de escravos, durante um século, praticamente até à ascensão de Augusto, curiosamente com intervenientes pelo lado hispânico, entre os quais Sertório foi protagonista, ao decretar a Hispania independente.
Mas nestes conflitos entre Mário e Sula, e depois entre César e Pompeu, apareceram as revoltas de escravos na Sicília, que fora província cartaginesa, e a principal razão da guerra com Roma. Uma dessas revoltas, bastante bem sucedida, foi a de Spartacus, que a ameaçou Roma como só Aníbal o havia feito.
Qual a razão de tanta instabilidade política e social no espaço de um século?
Em minha opinião, há aqui uma possível ligação à aniquilação de Cartago que, deixando de ser um interveniente activo, passou a actuar nos bastidores, apoiando peças especialmente bem escolhidas no xadrez romano, num império que começava a atingir grandes proporções.
De um controlo comercial do mundo antigo, que ia da Fenícia à Hispania, em 146 a.C., os que restaram em Cartago foram vendidos como escravos, mas certamente que muitos outros fugiram e tentaram organizar-se.
Conforme já referimos, é nessa altura, com Judas Macabeu, que se começa a falar dos judeus, ao ganharem alguma autonomia na região abaixo das paragens fenícias, numa cidadezinha, então pouco ou nada falada, chamada Jerusalém. Até aí, Heródoto não os refere, ainda que haja outras tentativas de identificação, e para a maioria dos historiadores antigos, anteriores a 150 a.C., é como se os judeus não existissem.
A construção do templo de Salomão, que é assumido ser o segundo (mas não há registo do primeiro), é feita por Herodes, um rei efectivamente vassalo do poder romano. Ora, o que se passa é que na mesma região original dos fenícios, vai aparecer um povo com as apetências comerciais que tinham os fenícios, e que passam a identificar-se como judeus. Através do cristianismo, atingem uma dimensão subversiva que se espalha por todo o império romano.
Toda a história sem registos ou fontes histórias concretas, passa por mitológica, à excepção do velho testamento judaico... há quase uma tentativa forçada de fazer aparecer esse registo, mas tirando as partes que se encontram nos textos mesopotâmicos de Gilgamesh, o resto parece basear-se em pouco mais do que uma novela familiar.
A parte mais importante da sucessão do velho império egípcio vai efectivar-se com o romance de César e Cleópatra, que marca também a passagem da República Romana ao Império Romano. As disputas deixam de ser ideológicas, e passam a ser efectivamente disputas de poder, para decidir a sucessão do imperador... e são terminadas assim que se declara um imperador, ou em casos mais complicados, se faz uma divisão de poder entre Ocidente e Oriente.
(continua)