segunda-feira, 25 de maio de 2020

dos Comentários (63) objectivos abjectos

Comentários ao postal anterior, e em particular um comentário de A. Saavedra suscitou a questão sobre quais seriam os objectivos que teriam motivado os diversos agendamentos, em particular, os mencionados - descolonização, colonização, descolonização, globalização...

Se formos pelo lado da maçonaria, veremos invocado o "humanismo", o que seria um propósito muito nobre, se não tivéssemos também sido habituados aos aspectos pouco "humanos" que as lengalengas de boas intenções nos trazem. A esse propósito, e para que fique claro, ainda pior registo nos deixaram todos aqueles que, em nome de boas intenções, fossem estas cristãs, muçulmanas, judiarias, ou outras, trouxeram à Terra um pouco do pior inferno que lhes atravessava o espírito.

Auto-de-fé, no Terreiro do Paço em Lisboa, Séc. XVII.
Deve entender-se em português "Auto" como "Acto", ou seja, Acto-de-fé.

Portanto, não podendo fiar nas próprias respostas, de gente pouco fiável, resta a arte de especular.
Especular significa observar de forma inteligente, algo que é conveniente confundir com disparatar.

Etimologia
Uma das primeiras coisas interessantes é tentar perceber se as palavras nos indicam algum caminho, já que o Português não é apenas uma língua, aparenta ter toda uma filosofia encapsulada... assim o queiramos perceber.

Objectivo, deriva de objecto, ob-jecto, e vou aqui citar algo que escrevi há uns anos:
Projectar resulta da composição do prefixo "pro" com "jactar" de onde vem "jacto".
Ora, jactar é lançar (como em "alea jacta est", os dados estão lançados).
Projectar é assim lançar para a frente, ou para o futuro.
Rejeitar, que é desvio português de rejectar (inglês: reject), será lançar para trás.
Outras variantes são "dejectar" ou "enjeitar" ambas ligadas a lançar para fora.
Outra ainda está no "sujeitar" (inglês: subject) ficar abaixo do lançado, ou em "injectar" como inserir no jacto.
O jeito português misturou essas raízes... o jeito de lançar substituiu o jacto.
Mas esse jeito de lançamento, provavelmente do dardo, ficou no gesto ou na gesta, e nalgumas povoações ainda se ouve o "ter jêto" em vez do "ter jeito".
O prefixo "ob" é de oposição, como em "obstar" (estar contra), e portanto "objecto" é algo que obsta ao jacto, ao arremesso, ou ao jeito. Esse algo pode ser o alvo, e assim funciona enquanto "objectivo", mas também o arremesso pode ser parado, quando alguém se põe à frente do alvo, e nesse caso diz-se "ele objectou"... O objector colocando-se como objecto, é alvo intermédio do jeito de arremesso.
De igual modo funcionam as palavras:
- "abjecto", arremetido para fora ("ab"), sem jeito; 
- "trajecto", que será o caminho através ("trans") do jacto, ou do jeito; 
- "ejectar", quando o jacto, ou o jeito, é de saída ("ex").

Neste caso, funcionando de forma similar nas línguas de raiz latina, haveria necessidade de invocar o português? Com efeito, "efeito" é suposta conjugação latina de "efectuar" enquanto "effectus", o que significa "é feito", só que em português não é preciso ir ao latim, para tirar "é feito" de "efeito".
Isso não acontece com o "effect" inglês, ou o "efet" francês, não tomam o sentido em "is done" ou mesmo em "est fait", que sonoramente é similar a "efet".
Só que o português vai mais longe, e numa arte milenar que hoje se chama "para inglês ver", não tem o verbo "efazer", tem o verbo "enfeitar".
A diferença entre "efeito" e "enfeito", é que no último caso não é preciso fazer, basta enfeitar...
Tal como passar por ter isso feito, ou ter feito isso, é "feitiço".
Na arte do feitiço, chamada feitiçaria, o povo era ludibriado pelos feiticeiros de serviço.

Filosofia dos abjectos
Este pequeno intróito serve para deixar claro que, na liturgia das palavras adquiridas, um objectivo pressupunha um trajecto e algo que se opusesse a esse trajecto. Ou seja, não supõe alcançar algo sem que nada objecte, sem que ninguém se queixe. Não se pretende algo que "que caia em saco roto".
Curiosamente, a minha perspectiva de "objectivo" foi sempre oposta, no sentido em que a comunidade é útil, mas dispensável, para avaliar da solidez dos objectivos. A solidez deve ser objectiva e não subjectiva, e não é por ter avalo de um ou de um milhão que isso se altera.

Uma necessidade de mérito por confrontação, que é essência do chamado "método científico", reflecte uma mentalidade tortuosa, que dá apenas valor ao que é alcançado por conflito - contra os outros, ou contra os elementos.
O valor sai de unanimismos e nisso não se afasta da mentalidade medieval.

Enquanto numa sociedade primitiva, nómada, um objectivo familiar seria afastar-se para procurar territórios de caça, sem conflitos com os vizinhos... quando a sociedade passou à filosofia agrícola, em que a dependência da terra obrigava à sedentarização, e à inserção numa hierarquia social de alimentação, a expulsão dessa sociedade passou a ser vista como um pior mal.
Abjecto, banido, ou ostracizado (na versão grega), o exílio era um castigo visto por muitos como mais severo do que a prisão ou a morte. Digamos, a prisão não existia, porque ninguém pensava em alimentar e alojar presos de graça. A prisão era o trabalho escravo. A escravatura foi simplesmente uma solução entendida como inteligente para resolver um problema prisional. Nenhuma família romana queria ter que alimentar prisioneiros gauleses, mas se estes servissem como escravos, pois aí dava jeito, mais jeito do que construir inúteis campos de concentração em Roma.

No Séc. XIX aquando da organizada política de emigração europeia, organizada pela maçonaria (e pela cúria romana), os pobres migrantes europeus sonhavam com propriedades americanas, e partiram em debandada como nunca antes. Partiam em magotes para países novos, independentes, muitos deles para uma língua completamente estranha. Curiosamente, na mesma altura que as potências europeias cimentavam o seu poder colonial em África e na Ásia, a maioria da emigração não se destinava a essas colónias. No caso português, a emigração ia essencialmente para o Brasil ou EUA, e em muito menor escala para Angola ou Moçambique. A maioria dos portugueses em África chegou só no Séc. XX, depois dos anos 50.

Vejamos isto em contraste com o que se passou no Séc. XV e XVI. Se a colonização da Madeira e Açores foi rápida e eficaz, não seria de esperar que os marinheiros contassem às suas gentes dos paraísos tropicais que viam?
No entanto, Portugal sempre quis reduzir a sua presença além-mar ao mínimo - a pequenas povoações fortificadas, destinadas ao comércio - as feitorias. Funcionavam como enfeitorias, disfarçando uma efectiva vontade de não-colonização.

As capitanias hereditárias do Brasil, pelo reduzido número, 14 dadas a 12 famílias da pequena nobreza, procuraram resolver o problema ao estilo feudal... ou seja delegar na nobreza o controlo de desses territórios, estendendo o braço da coroa real.

Assim, se a quase totalidade da população europeia não tinha qualquer posse de terra, também não iria ficar com ela, quando ao mesmo tempo haveria uma imensidão de posse a distribuir.
Da posição de servos na Europa, para os camponeses que emigrassem pouco se iria modificar o seu estatuto, já que iriam ficar apenas com diferentes senhores, diferentes paisagens, clima e doenças.
O entusiasmo com a ida para paisagens exóticas só entusiasma os cidadãos actuais. O nobre paraíso seria mais o jardim artificial do que a exuberância natural.
Na altura, ser remetido para paraísos tropicais, era um degredo, uma expulsão da pátria, e só com condenados ao exílio se conseguia uma povoação razoável no ultramar.

Tal como no caso das famílias romanas, as famílias das capitanias viram maior interesse na utilização de escravos, para aproveitar a extensão colonial, do que propriamente em incentivar um estabelecimento de marinheiros nacionais, que poderiam questionar a sua posse. Quando esse incentivo existiu, como para colonizar a Austrália, já no Séc. XIX, e à falta de melhor, uma solução era remeter para lá os condenados... e as despedidas eram encaradas como uma morte, já que dificilmente aos desterrados era pensado conseguir regressar à Inglaterra.

Em contra-corrente com esta filosofia de ver a tropicalidade como lugar de abjectos, mas ainda assim não se afastando dela, surgiu o movimento evangelizador dos jesuítas. Voluntariamente, ofereciam-se ao sacrifício missionário de cristianizar os indígenas. Não se afastava da visão medieval, porque era entendido como um sacrifício em favor da cristandade, e das "almas perdidas" dos indígenas.

No entanto, a vontade de libertação do senhorio alheio manifestou-se fortemente, e apareceram mesmo "reinos piratas", em Nassau, e noutras paragens caribenhas, que fracamente se aguentaram face ao poderio colonial europeu. Até ao fim do Séc. XVIII a ordem europeia visava manter as cabeças coroadas na Europa, e não criar novos reinos satélites... tal como Cartago punia os desertores que abandonassem os seus navios, escapando-se para paraísos tropicais.

Daquilo que sabemos, e podemos concluir, é que o processo de atribuir propriedade a qualquer cidadão foi um desiderato maçónico, iniciado com as repúblicas americanas, especialmente nos EUA.
Nesse aspecto, contribuíram para o efectivo fim do feudalismo no mundo medieval.

A maçonaria, enquanto organização de cariz secreto, mexeu todos os cordelinhos, e em conjunto com os judeus europeus, conduziu um controlo financeiro e editorial, começando a formar a mentalidade das populações na revolução industrial. Não bastava tirar as pessoas das aldeias, era preciso tirar a mentalidade aldeã dessas pessoas. Por isso, se empenhou tanto em formatar a escola, ao ponto de ser impingida uma outra história, que retirasse o catecismo do centro do indivíduo. Como tinha ficado claro, se ninguém interviesse, as pessoas continuariam a ver os paraísos tropicais como infernos, se tais paragens fossem entendidas como um desterro.

Para um observador exterior, é fácil concluir que, mais fácil do que levar alguém ao paraíso, seria  tentar convencê-lo de que tinha chegado... Percebeu-se que seria preciso dar um certificado carimbado de que era ali! O chavão "terra da liberdade" foi de tal forma assumido pelos EUA, e propalado pela Europa, pelas publicações editoriais, que a vaga migratória passou a ser vista como a única oportunidade de se verem livres do jugo senhorial.

Na Europa, as mentalidades começaram  a mudar pelo despoletar sincronizado de revoluções liberais, em 1848, que veio forçar um parlamentarismo em quase todos os reinos, abrindo os portões de poder.
Este plano maçónico foi trabalhado na Inglaterra, disso não parecem restar grandes dúvidas, mas a forma como conseguiu adesões estrangeiras, em todos os reinos europeus, continua a ser um notável caso de sucesso. Além disso, resultando de herança templária, as ligações à Ordem de Cristo, parecem-me inevitáveis, uma vez que o fim prático da autonomia da Ordem de Cristo em Portugal, em 1551, terá levado a uma consequente migração dos seus protagonistas e promotores internos.

Filosofia de eunucos
Os abjectos, excluídos da sociedade, desde tempos egípcios, foram inevitavelmente os escravos.
A prole de escravos gerava escravos, tal como depois a prole de servos gerava servos.
Como o postal vai longo e já falei bastante sobre este assunto:


realço apenas que se gerou nos bastidores do poder, através de serviçais dos impérios, em boa parte eunucos, uma filosofia de descendência que ia para além do benefício da própria prole.
No caso dos eunucos, escravos, isso era bastante claro, e essa tentativa de controlo da sociedade por uma elite de homens, abnegados da reprodução sexual, foi ainda promovida pelo próprio cristianismo - sem constasse em parte alguma dos seus requisitos fundadores que os padres devessem ser castos.

Assim, foi sendo criada a ideia de um objectivo humanitário além do grupo familiar, da tribo, do povo, do reino, cujo propósito maior foi sendo estabelecido pelos movimentos missionários católicos (nomeadamente os jesuítas), ao mesmo tempo que se invocava uma filosofia cristã desprendida do pressuposto religioso, o chamado humanismo. Todo este caldo esteve em ebulição na Europa do Séc. XVI. Já teria ingredientes mais antigos e muito semelhantes na disseminação do budismo, e similares religiões orientais, onde também era requisito uma abstinência dos seus monges.

O propósito de ser pela humanidade, e não tanto por uma classe, por um grupo, por um povo, ou por uma nação, passou a constar de novo da ementa mundial, como nunca antes teria acontecido, ainda que certas noções já existissem de forma localizada no império romano, e na civilização grega, mas que encravavam na noção do estranho, enquanto bárbaro.

Este propósito, não sendo alcançável na sua utopia, estilhaça as diferenças entre nações, ao querer vergar a diferença a uma unidade monocromática. Tornou-se anti-nacionalista em vez de celebrar as diferenças virtuosas dos diversos nacionalismos. Numa tentativa progressista desesperada, foi buscar mais igualdades, onde elas pouco sentido faziam... chegando-se ao cúmulo jurídico de pretender igualdade de direitos para animais, quando estes direitos estão ainda muito longe de ser adquiridos por muitos humanos.
Quando se continua a caminhar em frente, ignorando a paisagem à volta, é que se percebe que os supostos pastores só continuam a ostentar a vara, porque não querem assumir a sua cegueira.
Nada mais vêem em frente, mas ninguém os ensinou a largar o cajado do comando.

quarta-feira, 6 de maio de 2020

Descolonização, colonização, descolonização, globalização

Estava convencido que tinha publicado aqui um texto sobre os dois processos de descolonização, mas constato que não publiquei.
O assunto é interessante, e em ambos os casos envolve a maçonaria... com um pequeno detalhe, a maçonaria esteve fortemente envolvida no segundo processo de colonização, que começou assim que fez terminar o primeiro.
Apesar das evidências serem mais que muitas, ninguém menciona o assunto.

1) Descolonização das Américas
Na transição para 1800, quando Napoleão exibia o seu poder, as únicas colónias independentes eram os recém-formados EUA e o Haiti.
Em 1825, passados apenas 25 anos, em praticamente toda a América havia reinos independentes.
E é claro, já havia repúblicas feitas à medida dos EUA, ou seja, produtos da maçonaria.

Repare-se que na 1ª Grande Guerra "Mundial" (1803-1815) o adversário era Napoleão, o grande portador da Revolução Francesa, que foi completamente derrotado, não sem que os ideais dessa revolução, ou seja, uns tantos versos da maçonaria francesa, dita do "grande oriente", se tivessem imposto nas agendas liberais, e tivessem alterado a sociedade do Séc. XIX.
Aqui, a Inglaterra derrotou a França, sem ajuda dos Estados Unidos.

Será que a descolonização na América foi total?
É claro que o império espanhol foi totalmente estilhaçado, ficou com umas ilhas, entre as quais Cuba.
Os portugueses, antecipando destino similar no Brasil, com a liderança de D. Pedro IV, inventaram uma independência manhosa, mantendo o território ligado à coroa nacional.
Mas e os outros, a Inglaterra libertou o Canadá, a França e a Holanda saíram das Guianas?
Claro que não! Aí o ardente desejo de independência não ardeu.
Libertadores, segundo o credo da maçonaria: San Martin, D. Pedro IV, Simon Bolivar

2) Colonização da África e da Ásia
Ok, mas os ideais maçónicos eram bons, visavam a igualdade, a libertação do homem, etc, etc...
De facto, os ideais maçónicos parece que visaram sempre atacar as dimensões ibéricas, e pouco mais do que isso. Nesse aspecto, parecia cumprir-se o rancor judaico contra as potências ibéricas que os expulsaram, com requintes inquisitórios.
Ao mesmo tempo que a Espanha e Portugal eram libertados das suas colónias americanas, poderia pensar-se que os holandeses iriam ter movimentos independentistas na Indonésia, os ingleses iriam ser pressionados na África do Sul, na Índia, Austrália, etc... 
Nada disso!

Com efeito, se a colonização americana pelos europeus já tinha sido feita, a presença dos europeus em África, ou na Ásia, mesmo na Índia, era razoavelmente suave. 
Não tinha havido propriamente uma exterminação das culturas anteriores, como aconteceu no caso azteca ou inca. A África talvez por ser demasiado caótica, e a Ásia por ser demasiado populosa, tinham resistido, e mantinham-se sob grande influência europeia (exceptuando talvez a China e Japão), mas ainda como reinos razoavelmente autónomos.

Como poderia a maçonaria entrar subrepticiamente nesses poderes, desconfiados dos europeus?
Pois, por isso, antes de descolonizar, era preciso forçar a colonização.
Surgiu assim na segunda metade do Séc. XIX, uma vontade incontrolável de colonizar.
Foi o tempo dos grandes (!) "exploradores de África", como Stanley e Livingstone, que basicamente se arrastavam, e arrastavam consigo inúmeros carregadores, para se conseguirem deslocar em África.

É claro que, como os "descobrimentos terrestres portugueses" não podiam ser sabidos, agora era tudo coisa nova, novidade do mais novo e progressista, que só a maçonaria poderia alcançar.
Tudo o que era projecto de país na Europa ocidental teve direito à sua nesga de terreno para colonizar, inclusive a Bélgica, que garantiu o Congo. É claro que o pedaço de leão ia para a Inglaterra e a França, duas versões do mesmo avental. Portugal aguentou Angola e Moçambique, que antes pouco mais eram que Luanda e Benguela, Lourenço Marques, Nampula e Sofala.
À Espanha, para não ficar a chorar de pranto, depois de ter perdido todas as colónias americanas, ficou com a Guiné Equatorial. 

A França abocanhou quase toda a África Ocidental, para além da Indochina, na Ásia.
Onde andavam os direitos humanos, aquela linda carta que a revolução francesa trazia?
Estavam em stand-by... por mais umas décadas, que era preciso entrar em força, para depois sair.

Convém lembrar que o Sião, talvez por causa do nome que agradava à judiaria, escapou à colonização, mas os seus reis (da Tailândia) tudo fizeram para não apoquentar os europeus. 
A China depois das Guerras do Ópio, viu-se forçada a ceder na influência, e quando tal correu mal, foram as 8 nações dar um pulinho para invadir Pequim em 1900. O Japão, apesar dos prantos dos samurais e da Madame Butterfly, acabou por aceder à modernização, e tratou de invadir a Coreia, como forma de se juntar aos grandes, e evitar a pressão do vizinho gigante... a Rússia.

Com efeito, a Rússia foi o primeiro país a efectuar a grande colonização, tão grande que ninguém se lembra da Tartária que era suposto existir antes de Pedro I, o Grande. É que antes disso, a Rússia não passava do campo europeu... só depois ousou atravessar os Urais até Vladivostok.
A agenda maçónica nesse aspecto sempre trabalhou bastante bem na Rússia.

3) Descolonização da Ásia e da África 
Estando garantidos todos os desejos, certamente existentes (na Ásia), e quando inexistentes, inventados (na África), após a 2ª Guerra Mundial - e é de perguntar - por que não após a 1ª Grande Guerra? - reuniram-se as condições, para as conspirações da treta, que levaram os países à independência. 
É claro que houve um Ghandi, um Amílcar Cabral, e outros tantos heróis locais que lutaram pela independência dos respectivos países... mas o problema é que todos se podem reduzir às mesmas décadas 1950-1970, o que torna os seus actos heróicos num aspecto menor, do maior acto encenado, que era a descolonização.
Já antes teriam havido movimentos, em muitos casos, mais louváveis, porque sem apoios lutaram contra uma dimensão incomensurável para si, mas estiveram condenados ao insucesso.
No entanto, após 1950, a ordem era descolonizar, e foi cumprida quase sem atrasos, e nem mesmo o caso português se atrasou muito... pois, porque afinal de contas não surgiram os guerrilheiros da Guiana, e mesmo assim a Holanda lá libertou o Suriname, mas só em 1975.
Quanto à França... não nos digam que a França se esqueceu de libertar a Guiana Francesa?
Ah! É claro, é para lançar os foguetões da ESA...

Sim, porque isto havia alucinados portugueses que viam o país de Timor ao Corvo, mas já quando são franceses, ingleses ou americanos, não são alucinados.

4) Globalização ou Colonização (2)
A fase de descolonização tinha que estar pronta nos anos 70, porque vinham aí as décadas da globalização. Com efeito, logo no princípio dos anos 70, acabada a Guerra do Vietname, Nixon foi à China tratar desse papel principal na fase seguinte, que seria liderada por Deng Xiaoping.

A Rússia tinha sido importante na fase de experimentar o comunismo... e com que consequências(!), mas era tempo de finalizar o ensaio, arrumar tudo, e declarar o capitalismo como vencedor da Guerra Fria. Claro que foi bastante útil no apoio a todos os movimentos independentistas, contra o colonialismo europeu, mas havia chegado o fim dessa fase, e entrava-se na nova era.

Qual o propósito da Globalização?
A Globalização é a versão 2.0 do Colonialismo. Pode-se falar em Colonização (2).
Porquê?
Porque todos os estados quiseram ser independentes, para depois concluírem que é melhor estarem todos unidos, numa grande família. 
Qual seria o melhor exemplo? - A união europeia!
Não havia estados com maiores rivalidades, cuja acção tivesse dilacerado vidas atrás de vidas.
A Europa era o barril de pólvora, que seria apaziguado em união, na prodigiosa UE.
Isso serviria para um domínio global?

O que ficava claro é que os países (africanos, em especial), que tinham acabado de ficar independentes, estavam imediatamente dependentes de ajudas externas, endividavam-se até ao tutano, e eram corrompidos de alto a baixo, pelas elites locais.
No fundo, a sua independência passava a ser uma dependência completa dos mercados.

Só que isto não acontecia apenas para os recentes países, acabava por acontecer com todos!
Governos sobreviviam ou caíam, consoante a saúde financeira da sua economia, e portanto passava-se a um novo termo experimental de colonização, já praticada pelos portugueses na Índia - os marajás que se portavam bem, eram favorecidos, enquanto os outros tinham problemas (ver texto).

Por muito que isso custe aos franceses, ganhou-se uma língua universal de comunicação, que é o inglês, e esse aspecto, a que se uniu a circunstância "casual" de existir uma internet, uma organização mundial de comércio, um fundo monetário internacional, etc... são tudo pequenos detalhes que foram relevantes para o sucesso desta história.

Agora estamos na fase de perceber se isto serve para alguma coisa, para algo mais do que inventar mentiras (como o aquecimento global, ou a ameaça islâmica), e fazer com que todos acreditem nelas...

No fundo, o ponto primordial de todo o animal é ser auto-suficiente, e com isso livre. Isso só não acontece em animais sociais, por clara incapacidade de sucesso, de outra forma.
Se a sociedade quiser continuar a evoluir no sentido de formar monstros gigantescos, a que se chamam estados, organizações, companhias, sociedades, empresas, grupos, etc... só mais tarde perceberá que esse caminho não levará a lado nenhum, que não seja irracionalidade e desgraça.
Como já aqui mencionei, a única organização social que deve existir é aquela que, garantindo a máxima liberdade aos cidadãos, impeça qualquer protagonismo de outra organização social. Nenhum homem deve ficar exposto solitariamente contra a vontade de uma multidão.

Ficamos à espera... entretanto, se esta pandemia serve para alguma coisa, é para perceber do quanto dependemos uns dos outros, e que o isolamento não será certamente nenhum caminho a trilhar.

sexta-feira, 1 de maio de 2020

Carnaval revolucionário

Num artigo intitulado
publicado na revista científica Contemporary British History, em 2014, Oscar Martin Garcia, um investigador espanhol, comenta sobre a quase inexistência de artigos sobre o papel inglês na "Revolução dos Cravos". Porém o objecto do artigo serve ainda para ver esta revolução como a última de uma série de revoluções europeias, que entendeu como carnavalescas, citando:
«To help remedy this oversight, this article analyses the economic, political and diplomatic measures employed by the British Foreign Office to establish parliamentary democracy in Portugal, which brought an end to the final chapter in the ‘carnival’ of revolutions that had spread throughout Europe over the preceding two decades.»
O 1º de Maio de 1974 foi o último de paz e alegria revolucionária - a festa durou uma semana.
A diferença para o 1º de Maio de 2020, mostra que ao Estado Novo uma pandemia do tipo Covid teria sido uma panaceia sem contra-indicações conhecidas.
1º de Maio em 2020 (à esquerda) em 1974 (à direita).

A marcar o 1º de Maio de 1974 estava o protagonismo dado a Álvaro Cunhal e a Mário Soares. 
Os militares do 25 de Abril, nem passada estava uma semana, e já tinham ido para casa, plantar batatas. Um detalhe importante, normalmente varrido para baixo do tapete...
A Junta de Salvação Nacional, formada a 26 de Abril, dispensou os capitães, até porque se eram capitães de Abril, já não estavam a fazer nada no 1º de Maio.
  • Presidente: General António Spínola (Exército);
  • Exército (2): General Costa Gomes, Brigadeiro Silvério Marques;
  • Força Aérea (2): General Diogo Neto, Coronel Galvão de Melo;
  • Marinha (2): Capitão mar-e-guerra Pinheiro de Azevedo; Capitão de fragata Rosa Coutinho.

Maçonaria impõe Palma Carlos
O primeiro-ministro seria Palma Carlos, um nome ditado pela maçonaria, decidido numa reunião do Grande Oriente Lusitano na Av. Manuel da Maia. Ao que consta, em artigo do Expresso, Spínola quereria um governo militar, ou então Veiga Simão como primeiro-ministro. No entanto, o MFA, enquanto entidade abstracta detinha poder de veto, e manifestava-se algum controlo maçónico.

Este primeiro governo tinha como ministros Sá Carneiro, Mário Soares, Álvaro Cunhal, entre outros, como Maria de Lourdes Pintasilgo, Magalhães Mota, Salgado Zenha, Almeida Santos, etc. 
A misturada estava destinada a terminar menos de 2 meses depois de tomar posse.

Em Julho de 74, Spínola aceita nomear Vasco Gonçalves, e parece ficar claro quem coordenou o processo revolucionário dentro de portas, pois foi ele quem sucedeu a Spínola:

General Francisco da Costa Gomes
Conforme era assinalado pela revista Time, durante o Verão quente de 1975, havia a Lisbon Troika, que era constituída por Otelo, Vasco, e Costa Gomes.

Para esse efeito, convém entender que o próprio Costa Gomes, talvez um bocado farto do "mito dos capitães" veio depois notar que  (ver texto de Rui Ramos):
Sem os generais, a revolução nunca provavelmente teria acontecido, como aliás um desses generais, Costa Gomes, fez questão de notar anos depois: no dia 25 de Abril de 1974, as tropas mobilizadas para a revolução – 150 oficiais e 2000 soldados, a maior parte instruendos das “escolas práticas”, sem qualquer experiência de combate — nunca, em circunstâncias normais, teriam sido suficientes para derrubar um regime que, nesse ano, mantinha mais de 150 000 homens em armas
O golpe de bastidores, teve como cabeça em Portugal o general Costa Gomes, que tinha sido nomeado por Marcelo Caetano como Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, em 1972.
Quando Marcelo dizia que a PIDE não conseguia "entrar no exército", parece claro que o problema estava na chefia, ou seja no próprio Costa Gomes.

Costa Gomes conhecia bem a NATO porque esteve no comando SACLANT de Norfolk com Humberto Delgado. Além disso, foi secretário de estado quando o General Botelho Moniz era ministro, ou seja, trabalhou directamente com dois dos opositores a Salazar. Mas foi o seu sucesso em Angola, onde optou por cativar as populações, em vez de confrontar os guerrilheiros, que lhe granjeou o prestígio no Estado Novo, já que a situação em Angola ficou totalmente controlada.
Já antes havia sido referido pela embaixada americana que Costa Gomes, melhor que Botelho Moniz, poderia fazer a mudança de regime. Ou seja, é natural que os EUA encarassem positivamente a mudança sob liderança de Costa Gomes.

Mesmo num relatório sobre a situação em 1975, enviado ao General Walters, da CIA, é dito:
Options about Costa Gomes' role ranged from his being a very powerful figure to a balancer between the left and the moderates, to one with a very little influence.
Essa ambiguidade conseguiu-a  manter até ao fim. Enquanto figura tremiclitante, sem poder, até aquele que se foi mantendo como figura de topo no Estado, independentemente do sentido da revolução. 
  • Era Costa Gomes, e não Spínola, o chefe de todo o aparelho militar em Março de 1974.
  • Se Spínola foi indicado por Caetano, isso pode ter agradado a Costa Gomes, que precisava de uma primeira transição menos abrupta. Ele manteve-se como 2ª figura, o que levou à sua designação para a sucessão de Spínola, em Setembro.
  • Sustentou todos os governos caóticos de Vasco Gonçalves, com o país em pseudo-estado revolucionário de semi-anarquia, com assaltos a propriedades e "reforma agrária".
  • Apadrinhou todo o caótico processo de descolonização, tendo presidido aos Acordos do Alvor.
  • Figurou como figura de esquerda, até 25 de Novembro de 1975, sendo completamente passivo face à hostilidade da esquerda revolucionária, ligada a Otelo e aos Gonçalvistas.
  • Mais complicado foi certamente dar meia volta, no 25 de Novembro, aparecendo ligado aos "moderados" vencedores.

Spínola e Costa Gomes seriam os dois únicos a serem nomeados Marechais pelo novo regime.

Curiosamente, se o Marechal Gomes da Costa implantou o Estado Novo, o Marechal Costa Gomes, terminou com ele. Provavelmente, nem sequer este detalhe será tão casual, quanto possa parecer.

Turismo revolucionário
Um dos focos do artigo mencionado, é que a revolução portuguesa serviu de transição entre os movimentos revolucionários esquerdistas, de Che e Fidel, às Brigate Rossi, aos Baader-Meinhof, às revoluções no sentido ocidental, da Espanha e Grécia, até à queda do muro, e ocidentalização dos antigos regimes comunistas.

Com efeito, é sabido que o estatuto soft da revolução tuga, revolução das flores, paz e amor, etc, causava um fascínio na intelectualidade, que é sempre de esquerda, e que durante 1975 veio ver as novas "instalações democráticas", ao nível de curiosidade turística... Com efeito, dada a anarquia que se foi instalando, era um excelente campo de novidades sociológicas.

O artigo fala do papel do governo de Harold Wilson nessa evolução 1974-76, no sentido de promover contactos e apoios para que Portugal não descarrilasse para a extrema-esquerda, mas pouco menciona do papel inglês anterior a 1974. Esse seria o período a ser investigado, sem acesso limitado pela maçonaria, amigos ou análogos.

O papel da maçonaria não passou só por apontar o nome de Palma Carlos, se o fez era porque tinha estado completamente a par, e apoiado o MFA. Dito de outra forma, isso significava o conhecimento de Londres e Paris. Acontecia o mesmo que se garantira na República, com a vantagem de não ter havido nenhum Paiva Couceiro a oferecer resistência pelo anterior regime.

Harold Wilson, em 1973 (na oposição) recebera Mário Soares, e promovera o boicote à viagem de Marcelo Caetano. Conforme já referimos, em 1973 deu-se a constituição do PS, com um financiamento da Fundação Ebert e da CIA. Mário Soares, também ele mação, encontrou apoios pela Europa, para fundar um partido de poder em Portugal... o que veio a acontecer, da noite para o dia.

Quando Harold Wilson ganha as eleições em Fevereiro de 1974, estavam criadas as condições para uma benção inglesa à revolução portuguesa, ao mesmo tempo que nos EUA, Nixon estava no fim da linha devido ao escândalo Watergate. O livro de Spínola sai em Fevereiro, e a crise da demissão de Spínola e Costa Gomes dá-se a 13 de Março, uma semana depois de Wilson tomar posse. Logo de seguida há o golpe das Caldas a 16 de Março, que terá direito a um bis em 25 de Abril... agora já com o apoio estratégico da frota da NATO em Lisboa.

As acções do MFA só ganham sentido se colocarmos Costa Gomes à cabeça de uma conspiração feita por dentro e por fora, com a cumplicidade da maçonaria (que estava proibida).
Foi Costa Gomes que chamou Spínola para vice-chefe do Estado Maior, que o incentivou a publicar o livro, de certa forma permitindo que ele encabeçasse a face visível do 25 de Abril.
Otelo nunca referiu quem lhe dava ordens, nem qual era o plano do MFA... que aparentemente não era nenhum, até chegar Spínola para negociar com Caetano. 
Só aparentemente era nenhum, porque tudo se desenrolou com uma precisão notável, ao ponto de no 1º de Maio, o futuro político do país, com Mário Soares e Álvaro Cunhal juntos, dava garantias de ser passado o Estado Novo.

O carnaval revolucionário que decorreu entre 1974-76 não foi do agrado americano, sendo sabido que Kissinger pensou em intervir militarmente. No entanto, ainda mais nos bastidores, testava-se a vacina contra o romantismo de golpes anárquicos. Ao fim de um ano de regime Gonçalvista, sob patrocínio de Costa Gomes, o direito às experiências sociais tinha-se acabado, e era tempo de arrumar as coisas nos seus lugares. Tal como sempre acontecera, Costa Gomes limitou-se a gerir tendências, acordos, e pacificações, de forma a que Portugal não terminasse num cenário de guerra civil, o que seria péssimo para o turismo revolucionário, encantado com a revolução dos cravos.
Esse aspecto foi plenamente conseguido, o que não deixou de ser notável, dadas as circunstâncias.
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02.05.2020