Um facto razoavelmente intrigante é a forma como foram separadas a língua alemã e a inglesa.
Em inglês escreve-se Folk para povo, enquanto em alemão se escreve Volk... mas como em alemão o V é lido com F, o som é o mesmo. Daí obtivemos a palavra Folclore, que em alemão se escreve também Folklore e não Volklore... porque estranhamente usam ambos V e F com o som do F.
Um alemão se quiser escrever o som V usa a letra W, mas que os ingleses usam como U.
Portanto, pelo lado alemão usar ambos W e U com o som de U, é que poderá soar estranho.
Mas a "coisa" prossegue, e há palavras que podemos ver semelhança, como em When e Wenn (sendo que em inglês se lê "Uén" e em alemão "Vén"), ou em Will e Will (em inglês "Uíl", em alemão "Vil")... mesmo que nem sempre tenham o mesmo significado exacto. Ou por exemplo nos nomes, como William ou Wilhelm, que nos chegaram como Guilherme, por via do francês Guillaume...
Parece um pouco estranho que ao cruzar o Canal da Mancha, ou ao passar além da Alsácia, os povos esquecessem a sua pronúncia original, e invertessem sons, só para que as palavras soassem diferentes. O que ocorreu é muito mais facilmente justificado pela escrita do que pela língua falada... o problema é que no decurso da Idade Média os únicos alfabetizados eram praticamente os monges!
Ora, este "G" que torna Guilherme tão diferente, chegou a ter um significado mudo, como tem o H. E não é difícil concluir que Huillaume seria sonoramente mais próximo de William.
Este poderia ser um exemplo isolado, mas não é bem assim.
Se entendermos que "Gu" se relaciona com "W", em Guarda lemos Warda, e em inglês Warden significa mesmo Guarda. Um outro exemplo, Guincho daria Wincho, e Winch é mesmo um guincho. Não havendo muitas palavras em "gua, gue ou gui", não é tão evidente no caso de Guerra, já que Werra não deu Wer mas sim War, e falha ainda no caso de Guia, que em inglês é Guide (digamos que neste caso não foi precisa a mudança).
Relembramos que esta codificação não deve ser encarada como estranha novidade, porque já falámos do assunto nos Galos de Gales, em que Gales passou a Wales... e no caso galês uma conversão que ocorreu foi do "V" como "Gw", conforme foi explicado:
(...) whence Welsh gw as in Gwener (Friday) from (dies) Veneris; gwir (true) from Verus, - a change which was effected by the eighth century (later in Cornish and Breton).
Aqui a referência ao Séc. VIII é oportuna, porque é a altura em que Carlos Magno chega ao poder, e se vai revolucionar a Gramática no seu império. Ou seja, grande parte destas alterações, ou perversões, tiveram origem por via do Sacro Império, através dos seus obedientes monges.
O processo não chegou muito ao Convento Bracarense (que definiu o Galaico-Português), nem a Espanha, de um modo geral, porque o exército de Carlos Magno (aliado aos Árabes), foi travado no mítico desfiladeiro de Roncesvalles.
De qualquer forma, não esqueçamos que os Guimarães são Vimaranenses e não Guimaranenses... e não é claro se Vimara Peres seria ou não Guiomar ou Viomar, de nome original.
Passagem de Roncesvalles (Roncevaux Pass), onde Carlos Magno foi derrotado pelos bascos. |
Se o Império Romano estava unido por uma língua quase comum, que seria a língua Romance ou Romana, a separação em Constantinopla definiu como efectiva a concorrência da língua Grega, e os monges obedientes procuraram talvez imitar a divina confusão linguística como na Torre de Babel, punindo assim a heresia e depravação do pagão Império Romano. Ainda que o corpo comum, dito Latino, mais erudito, tenha sido passado por semelhança a quase todas as línguas europeias, houve perfeitas invenções - um dos muitos exemplos é em inglês dizer-se advance:
The -d- was inserted 16c. on mistaken notion that initial a- was from Latin ad-.
ou seja, os ingleses escreviam "avance", mas foram enganados e meteram um "d" para parecer latim... e antes tivessem feito como em Braga, que diriam a correcta palavra latina - "abante".
Chatos
O nome Carlos em Carlos Magno é ainda apropriado para vermos outra confusão.
Em inglês ou francês foi abandonado o som "C" pela interpretação errada do "Ch", onde o "h" normalmente só serviria para uma transcrição do Grego, mas que aqui tomou o som Charles, afastando-se completamente do alemão Karl, ou de Carlos ou Carlo (em italiano).
Exemplo mais estranho ainda é o de gato que em inglês se diz Cat, mas em francês se diz Chat, e será o único exemplo de língua europeia em que se perdeu por completo a ligação fonética, já que Gato é ainda razoavelmente próximo de Cat e até do alemão Katze.
A origem da palavra Gato é desconhecida, pois em latim seria "feles" (felino) e em grego "ailuro" (ailurofilia), mas implantou-se em toda a Europa como forma simples de "kat/gat"... e até os gregos dizem hoje "Gata".
Se é verdade que os franceses também se desviam no Cantar dizendo Chanter, não se trata aí de uma palavra usada nas línguas germânicas. Seria como um francês dizer "Chalar" e nós devermos entender isso como "Calar", para que o desvio se torne mais evidente.
Agora, este tipo de desvios, ou foi moda induzida, ou foi imposto à força... e não sendo por convencimento, conseguir que todas as mães ensinassem os filhos a dizer "chat" com a pronúncia de "chá", só poderia ter sido conseguido com medidas muito drásticas!
Muito drásticas mesmo... se não foi conseguido por alienação, com influência de uma moda, só vejo como hipótese que tenha corrido muito sangue, e tenham ficado muitos órfãos, o que corresponderia a algo arrasador, chato, como despedaçar (shatter) uma população. E abstenho-me de continuar a falar sobre outros chatos.
No entanto, para terminar, e tendo em atenção o título deste postal, faço notar que é uma questão de linga... e sim, não escrevi língua, porque já escrevi sobre isto.
Experimentem escrever a mesma piada (sim, é uma piada...) numa outra língua, por exemplo, em espanhol, lembrando que nuestros hermanos substituiram o "falar" por "hablar" e o "fazer" por "hacer"... ou seja, a eles atacou-lhes um vírus que comeu os "F" por "H"!