sexta-feira, 26 de abril de 2019

dos Comentários (49) 25 de Abril sem cravos

Em baixo, deixo os comentários de José Manuel de Oliveira, relativos ao postal


Destaco os seguintes pontos:

(i) O ensaio de Rui Ramos sobre "os generais de Abril", na realidade foca sobre a figura do general Costa Gomes (que foi depois Presidente da República), lembrando a sua citação de que as tropas mobilizadas para a revolução não chegavam a 2% do exército, e assim teriam sido insuficientes, havendo resposta do regime. 
É um passo no sentido de se querer saber quem estava por trás, mas Rui Ramos despista o assunto para canto das sereias, querendo focar nos generais, ou mais concretamente em Costa Gomes, ignorando a presença da NATO em Lisboa, com uma força suficiente para deixar a cidade em escombros. Parece preferir invocar que os EUA estariam entretidos com o caso Watergate, e faz por esquecer a forte presença naval canadiana, que até pelas fotos é impossível de ser ignorada.

(ii) Não estando no comentário de José Manuel, coloco em anexo ao texto duas fotografias que me parecem elucidativas. Num caso a fragata portuguesa Gago Coutinho com as armas ao alto (conforme relatado pelo oficial da Assiniboine), e noutro caso o contratorpedeiro canadiano HMCS Huron, com as armas baixas, e portanto em posição de combate. 
Neste ponto, estou convencido que os 5 navios da marinha canadiana participaram activamente no 25 de Abril, como força de dissuasão, e a prova disso é a presença do HMCS Huron, que era suposto já ter saído do Tejo. Aliás, o oficial da HCMS Assiniboine (o único a deixar acessível o registo escrito da operação) reporta que todos os outros navios já teriam saído, mas ao mesmo tempo fala da presença do comandante da HCMS Yukon.

(iii) Zero cravos! O mais difícil de encontrar nas fotografias do 25 Abril são cravos... 
Nos dias seguintes houve bastantes fotos de cravos, mas não do próprio dia! 
Encontrar um cravo numa fotografia do Largo do Carmo, é tão difícil quanto "Encontrar o Wally", ou mais ainda, já que neste caso é bem possível que não estivesse lá nenhum!
José Manuel dá aqui o relato na 1ª pessoa, estando todo o dia no Largo do Carmo.

(iv) Costuma-se falar em 4 mortos pela PIDE, que terá disparado indiscriminadamente contra a população, esquecendo também que um agente dessa polícia que terá sido abatido ao tentar fugir. Assim, e no final de contas, com contas trocadas, resta notar que nada muda quando à verdade fabricada pelo anterior regime se sobrepôs a falsidade descarada do actual.

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Comentários de José Manuel de Oliveira 
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(i) Ensaio de Rui Ramos - Os generais de Abril
Deixo aqui um ensaio de Rui Ramos, a lerem no Observador: 


Sem os generais, a revolução nunca provavelmente teria acontecido, como aliás um desses generais, Costa Gomes, fez questão de notar anos depois: no dia 25 de Abril de 1974, as tropas mobilizadas para a revolução – 150 oficiais e 2000 soldados, a maior parte instruendos das “escolas práticas”, sem qualquer experiência de combate — nunca, em circunstâncias normais, teriam sido suficientes para derrubar um regime que, nesse ano, mantinha mais de 150 000 homens em armas”,
Em 74 apareceu na casa onde vivi um livro com o título Portugal e o Futuro, perguntei o que era aquilo? “era para acabar com a guerra em Africa”, não li, só recordei ser do General Spínola, dele diz Rui Ramos no Observador:
Em Portugal e o Futuro, que em 1974 foi editado, reeditado e traduzido como o livro que explicava o 25 de Abril, Spínola desfiava o rosário habitual dos críticos internos do regime salazarista na década de 1960: o mundo mudara e havia outras expectativas. “O tempo dos dogmas está ultrapassado”. Não se podia fingir que a emancipação nacional não estava na ordem do dia em África, ou ignorar que os portugueses ansiavam por uma prosperidade europeia [a CEE pagava melhor que Salazar…] e não por morrer numa guerra africana, dispendiosa e sem fim. A “crise” era a “mais grave da história de Portugal”. Contra os que, para evitar a desagregação do país, não viam alternativa à ditadura na metrópole e à guerra em África, Spínola sugeria uma via liberalizante e federalista que preservaria a “nação” enquanto ligação entre povos de diferentes continentes, mas em paz e democracia
Pois, mas desde quando os franceses iriam permitir concorrentes com províncias ultramarinas lusófonas a fazerem-lhes concorrência! Spínola quis ser o De Gaulle português e saiu-se mal…

(ii) HMCS Huron
Vasos de guerra não fundeiam frente a posições onde possam ser bombardeados, nesse caso ficam em deslocação velocidade máxima, essa do Contratorpedeiro Huron da NATO bloquear a Gago Coutinho face ao suposto alvo a força de Salgueiro Maia, no Terreiro do Paço em 25 de Abril de 1974, não convence… 
(1)

(2)
(1) Fragata Gago Coutinho (F-473) com armas ao alto. 
(2) HMCS Huron (DD-281) com armas em posição de combate.

(iii) Cravos, nem um...
E mais, não me lembro de ver UM cravo vermelho nos canos das G3, estive lá e no Carmo das 9:00 às 23:00, hora em que os mirones civis foram expulsos pela força da rua da sede da PIDE, antes vi tiros e mortos, cravos vermelhos essa é a mais bacoca desta “revolução”!
Salgueiro Maia no Largo do Carmo. Muita gente... mas zero cravos! Experimente procurar... nesta e noutras fotos.


(iv) A PIDE/DGS abre fogo sobre a população
--- Citações do que pode ser lido em https://journals.openedition.org/lerhistoria/1894
Nas imediações da sede da PIDE/DGS, as ruas estavam cheias de gente que se interrogava sobre o destino da polícia política e exigia a sua ocupação, gritando e, por vezes, atirando pedras ao edifício.
A PIDE/DGS disparou, a partir da sede, por duas vezes, a última das quais pouco depois das 20 horas, o que causou dezenas de feridos e 4 mortos: 
  • Francisco Carvalho Gesteiro, empregado de comércio de 18 anos, 
  • José James Hartley Barneto, de 37 anos, 
  • José Guilherme Carvalho Arruda, estudante de 20 anos, e 
  • Fernando Luís Barreiros dos Reis, um soldado de 24 anos.

O comandante da primeira força militar a chegar ao local após a retirada inicial dos fuzileiros, o regimento de Cavalaria 3 de Estremoz, afirma no seu relatório:
«Cerca das 20h 30, fui alertado pela população de que elementos da DGS tinham aberto fogo (…) Em face desta informação, dirigi-me para a rua António Maria Cardoso e fim de evitar mais derramamento de sangue. Foram enormes as dificuldades para [atingir] o local pois a população com o seu desejo de vingança e completamente fora de si impedia qualquer manobra. (…) A população pedia vingança e que se atacasse o edifício, em cujas janelas se viam alguns elementos da corporação. Verificando que a força era pequena para iniciar o cerco, ordenei a comparência de reforços que estavam junto ao Quartel do Carmo (…). Verificando [ainda] que as forças eram insuficientes, solicitei ao comando do Movimento instruções e reforços para fechar completamente o cerco. Como não foram recebidas ordens para um ataque que continuava a ser exigido pela população, este não foi realizado. Tentei explicar à população a nossa atitude. Após bastantes esforços, fui compreendido e, apesar de não arredarem pé, não interferiram, pedindo unicamente para não os deixarmos fugir. Durante o espaço de tempo que mediou [entre] a chegada das forças de RC3 ao local e a vinda de reforços, constituídos por dois destacamentos da Marinha (…), foram capturados doze elementos da DGS e abatido um que fugira ao dar-se-lhe ordem para se entregar».
Publicado em Almeida, Diniz de, Origem e Evolução do Movimento dos Capitães, Lisboa, Edições Sociais

Tratou-se do servente António Lage, um funcionário da DGS, de 32 anos, morto, pois, nessa situação.
Costa Correia recorda que as forças sob o seu comando, chegadas à sede da PIDE, após os «assassinatos de civis e os feridos causados», eram compostas por um destacamento de fuzileiros especiais e uma companhia de fuzileiros.
«Fizemos o cerco em coordenação com as forças do Regimento de Cavalaria de Estremoz que já lá estava. Tinham pouca gente, por isso combinámos que eles ficariam na parte das traseiras e nós na parte mais dianteira”. O cenário era “de alguma calma durante a noite, mas com populares inquietos com o facto de a PIDE ainda não estar ocupada», lembra Costa Correia.
Perguntando a Costa Correia se não havia agitação pelo facto de terem morrido várias pessoas, este responde: 
«Sim, isso sim. Mas tenho a impressão que muitas pessoas tinham ido para casa ouvir as comunicações e as notícias. Não havia muitos populares na rua naquela noite. De manhã, depois, começou a haver muito mais».
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... e isto é pouco correto pois um comandante chegou ao local da PIDE já noite escura do 25 (diziam que estava a jantar…) e já lá estava nas traseiras da PIDE uma Chaimite, e um pelotão na frente (o tal servente da PIDE já tinha sido abatido antes!), onde tinham na mira das armas uma dúzia de pides nos degraus da porta, este comandante chega ao local a pé e ao meu lado sacou dum revolver à cintura, não usava a Walther… deu um berro 
à minha ordem manda avançar um a um para revistar, ao mínimo movimento suspeito fogo à matar”, 
os pides foram um a um encostados ao muro em frente debaixo de triangulação de atiradores, nesse momento fomos empurrados pelas G3 dos soldados a evacuar os civis… os fuzileiros só chegaram no dia seguinte!

Estive em perigo de vida sem o saber - a Chaimite estava nas traseiras provavelmente para evacuar alguém… como no Carmo!

Provável suspeito de pertencer à PIDE é rodeado por espingardas.
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3 comentários:

  1. Os Últimos Dias da PIDE Ep 1 - Assalto à PIDE-DGS https://www.youtube.com/watch?v=WbiYAdOG0lE

    não encontrei a segunda parte...
    cumprimentos
    José Manuel

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    1. Obrigado. Também procurei a 2ª parte e não a encontrei online.
      É um trabalho do jornalista Jacinto Godinho que saiu em 2015:

      http://www.rtp.pt/programa/episodios/tv/p31738

      "Os últimos dias da PIDE":
      - A primeira parte é esse: "Assalto à PIDE"
      - A segunda parte (que parece perdida): "Caça à PIDE"

      Por razões "inexplicáveis", a RTP parece não guardar online o material que é pago para como serviço público.

      Obrigado.

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