A expressão "jogo da bola" é hoje praticamente associada apenas ao futebol, mas há diversos registos antigos que mencionavam este nome, muito antes do futebol ter sido estabelecido na Inglaterra, por volta de 1850.
Assim, alguns sítios com o nome "rua do jogo da bola" ou "travessa do jogo da bola", não se reportavam ao desporto mais recente, mas sim a uma forma bastante mais antiga, e pouco relacionada.
Procurei um pouco mais sobre o assunto, mas apesar de haver registos de popularidade entre o Séc. XVI e o Séc. XIX, caiu em completo desuso, tendo-se praticamente perdido.
A melhor informação que encontrei sobre este jogo está num livro de Manuel J. Gandra
Jardim do Cerco (Mafra) - campo do "jogo da bola" (foto in M. J. Gandra) |
Nesse livro encontram-se algumas regras, tal como se pode encontrar uma referência a elas num tratado sobre vários jogos (incluindo cartas e dados) escrito em 1806:
(Jogo da Bola - Tomo IV - páginas 225 a 232)
Nesta forma mais sofisticada, que exigia um recinto apropriado, o jogo terá sido praticado entre cortesãos, e M. Gandra refere mesmo que houve leis de D. Manuel para proibir o jogo no paço, e que o ambiente escaldante dos ânimos teria provocado a morte do Conde de Vimioso pelo cunhado, o Conde de São João.
Tratando-se de um jogo de derrube de paulitos, teria alguma correspondência com o mais popular jogo da malha, ou chinquilho, ou ainda com o actual bowling. Apesar da popularidade nacional, a sua origem é provavelmente exterior, e mesmo em território nacional haveria mais do que uma variante de regras.
Por vezes é considerado que a origem do futebol remete mais ao Calcio Florentino, um jogo praticado em Florença, muito mais semelhante ao râguebi, dado o seu contacto extremamente violento.
(Barbaric Version of Soccer Is the Original Extreme Sport)
Vídeo acerca do Calcio Florentino - uma brutal variante histórica de futebol
Este Calcio Florentino, de onde resulta em Itália o nome "calcio", dado ao futebol, tem possivelmente origens ainda mais remotas, sendo ligado a um desporto romano (e grego) denominado "harpastum", do qual restam poucos relatos, mas que seria usado para manter a forma física das legiões romanas.
Surge isto atrasado face ao propósito do recente Euro 2016, mas ainda a tempo dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro de 2016, que se vão iniciar em Agosto.
Apesar de sabermos bem que os Jogos Olímpicos existiram na Grécia, servindo de referência a data da primeira Olimpíada de 776 a. C. (ou seja, 23 anos antes da fundação de Roma), cai-se na ideia habitual que o desporto é uma actividade recente. Ou ainda, que as populações na Antiguidade não perderiam tempo com desportos, dedicando-se directamente ao trabalho ou à guerra.
Essa parece-me ser uma ideia que resultou da Idade Média, onde praticamente tudo o que não fosse trabalho ou devoção a Deus, era considerado uma actividade pecaminosa. Uma filosofia bastante conveniente para manter os servos focados no trabalho, resultante de um fundamentalismo religioso, que pouco tinha de religioso, e muito mais tinha de manipulação social.
De qualquer forma, é extenso o registo de jogos e actividades desportivas que foram existindo ao longo dos tempos. Os jogos de dados eram bastante populares na Antiguidade, a origem do Xadrez também se perde no tempo, podendo ter entre 1 a 3 milénios, consoante as versões.
No decurso da Idade Média, a recriação era mais um privilégio dos cortesãos, mas isso não impediria alguma actividade lúdica, ainda que reprimida religiosamente. As justas ou torneios serviram várias vezes para resolver conflitos entre as partes, faltando motivação suficiente para convocar exércitos.
Interessa que a ideia de sociedades antigas extremamente violentas e muito distintas das actuais, é muitas vezes uma enfabulação moderna, que não resulta apenas da vertente medieval, mas é também alimentada com o propósito de criar a ideia de que os novos tempos são sempre muito melhores do que foram antes...
São lembradas as arenas romanas com os gladiadores, e os martírios cristãos, mas se isso foi uma parte infeliz da história, também convém não esquecer que essas arenas romanas serviam igualmente para grandiosos espectáculos de recriações históricas, nomeadamente Naumaquias, e portanto as arenas romanas funcionavam como autênticos pavilhões multiusos da Antiguidade.
Passam agora 80 anos sobre a Guerra civil de Espanha, e haverá ainda quem se lembre de ver transformadas as arenas tauromáquicas, em areias ensanguentadas pelos fuzilamentos que ali tiveram lugar. Reduzir o Séc. XX espanhol a esse episódio, seria daqui a uns mil anos dizer que as arenas espanholas serviam para o toureio, mas também para a matança de opositores políticos. É também assim que julgamos o jogo da pelota maia, que era suposto redundar sempre na morte da equipa perdedora, ou ainda que alguns atribuem o nascimento do futebol com cabeças humanas em vez de bolas de couro.
Essa simplificação do discurso, ainda que possa ter alguma parte de relação histórica ou suposição verosímil, serve sempre a ideia favorável aos tempos modernos, por comparação com os anteriores.
No entanto, basta olhar para alguns mosaicos da Vila Romana del Casale, para vermos que já na Antiguidade se praticavam desportos com troca de bolas, e que o Bikini não foi nenhuma invenção "explosiva" do Séc. XX:
Villa Romana del Casale |
Sem comentários:
Enviar um comentário