sábado, 8 de janeiro de 2011

A separação de poderes

Charles de Montesquieu ficou conhecido pela obra "Espírito das Leis", onde se encontra o princípio de separação de poderes:
  • Poder Executivo (exercido pelo regente)
  • Poder Legislativo (exercido pelo parlamento)
  • Poder Judicial (exercido pelos magistrados)
Este velho princípio de separação de poderes (que alguns traçam até Aristóteles) faz parte de qualquer constituição contemporânea em países democráticos. No entanto, apesar de ter sido introduzido nas primeiras constituições modernas (constituição da Córsega, dos Estados Unidos), convém referir que Montesquieu elaborou o texto em período absolutista francês e, nesse contexto, influenciado pelo exemplo inglês, advogava apenas uma Monarquia Parlamentar.
Charles Montesquieu (1689-1755) e Pasquale Paoli (1725-1807)
Constituição: Teoria e Prática

Já referimos que a prática da teoria de Monstesquieu foi concretizada por Paoli na Constituição da Córsega, que porém teve aí uma curta vida, ao contrário do que aconteceu nos Estados Unidos. A prática norte-americana acabou por se implantar e servir de referência.
Foi essa mesma prática que tornou claro a existência de um Quarto Poder - a informação, através da comunicação social. 

Numa república, sendo o povo chamado a escolher dirigentes, essa escolha deve ser informada, sem interferência dos restantes poderes. Caso isso não aconteça, a informação pode ser contaminada, pelo simples facto de não se assegurar uma independência semelhante à judicial. 

Ninguém consideraria razoável um órgão judicial dependente, em que os magistrados estivessem sujeitos a  remuneração condicionada por ditames económicos. Isso comprometeria a sua independência.
No entanto, torna-se cada vez mais claro que há julgamentos mediáticos, que comprometem a clareza da informação transmitida. A divulgação desiquilibrada pode confundir o receptor com vista a propósitos patrocinados.
Só uma independência informativa, pelo menos com um quadro de independência semelhante ao judicial, poderia garantir alguma viabilidade e credibilidade de um sistema eleitoral.

No quadro de uma antiga monarquia parlamentar poderia haver uma separação dos três poderes, já que o rei não estando sujeito ao escrutínio popular, teria um poder executivo efectivamente separado na nomeação do governo. 
No quadro actual são os partidos políticos que acumulam a função executiva e legislativa, pois os governos viabilizados dispõem do poder executivo, mas também do legislativo através da maioria parlamentar que é suportada nos mesmo partidos. 
Assim, apenas o controlo judicial escaparia a uma oligarquia capaz de controlar a comunicação social.
Porém, como sabemos, nem mesmo os órgãos judiciais conseguem isentar-se dessa influência. Basta uma campanha publicitária bem coordenada para mostrar a fragilidade desse poder, perante o descontrolo dos órgãos informativos.

Num sistema eleitoral, o ponto fulcral é a formação de opiniões através da informação.
Começa na parte educativa, pois é aí que se formam os esquemas cognitivos básicos, as certezas e os medos.
É na História que aprendemos os principais exemplos, e a informação aí transmitida condiciona a nossa percepção da sociedade, e dos seus conflitos. Se uma notícia da actualidade pode influenciar um governo, uma notícia histórica pode influenciar um regime, e a própria organização social.

Um sistema educativo, uma rede de publicações, de divulgação da informação, sob completo controlo de um grupo dá a esse grupo um poder oligárquico. Esse controlo estabelece-se para além da sua geração.

Quando Platão enuncia a Alegoria da Caverna, o exemplo vai para além da questão existencialista, e terá objectivos políticos. A ilusão da verdade na sociedade pode ser criada sem que os intervenientes se apercebam. Uma Odisseia no Mediterrâneo, um panteão de deuses, contrapõem-se à sua descrição da Atlântida, a um reino humano perdido no Atlântico, uma América, cujo conhecimento seria negado ao povo grego. O próprio Alexandre Magno poderia ter conquistado toda a Terra, conforme pretendia... e há registos que o colocam na Hispânia. No entanto, foram os seus cronistas, e a divulgação ao longo de séculos, que definiu não só a sua glória, mas também os limites do seu império, conforme avisava Poliziano.
(excerto da República de Platão)

O problema de condicionamento da informação, torna-se numa ilusão para além de sensorial, torna-se numa ilusão social. Não se trata de um problema de liberdade de expressão. 
As perturbações pela liberdade de expressão colocam-se apenas em meios restritos, e são facilmente abafadas por vários meios - uma descredibilização do locutor, um condicionamento dos ouvintes, ou em último caso, processos de eliminação mais literais.

Trata-se de um problema de divulgação. 
A informação pode ser quebrada eliminando, circunscrevendo ou contaminando a sua transmissão.
Quando há falhas, ou fugas, os processos de minimização do problema são vários, e a utilização de meios drásticos revela-se mais prejudicial do que útil. 
Uma pequena contaminação da mensagem acaba por ser mais eficaz. O indivíduo pode até ser reconhecido, mas a mensagem transmitida acaba por ser outra (divulgam-se os romances de Garrett e Queirós, mas não os seus textos de intervenção mais literais).
O elogio do indivíduo acaba por ser prejudicial à sua obra, e ao seu objectivo. A mensagem é reduzida e condicionada, interpretada por autores posteriores, cuja ignorância dos motivos tratará de iludir o conteúdo.

O autor que preze a mensagem da sua obra tem que deixar que ela se imponha por si, sem aparecer.
A obra tem que prevalecer sobre o autor, sob pena de se confundir consigo. 
A referência ao autor, e todas as associações externas posteriores, condicionariam irremediavelmente a mensagem. A única adição necessária a uma obra é a explicação do seu contexto.

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