quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Estado da arte (6)

Com um certo atraso, coloco aqui algumas imagens que foram trazidas pelo José Manuel, e que já tinham sido referidas no espaço de comentários em


Em concreto, referia-se a uma fotografia a um menir do cromeleche dos Almendres, onde José Manuel evidenciava uma forma em espiral ali cravada. A fotografia está na Wikipedia:

No entanto, trago-a aqui também porque reparamos que para além da forma no menir em primeiro plano, também é possível ver uma outra forma, que está no menir em segundo plano:
Almendres (Foto de JM, na Wikipedia)

Essa forma mostra uma parte da mesma lua que se encontra num menir de Portela de Mogos (não muito longe dos Almendres):
Portela de Mogos


- onde esse menir é descrito como «necklaced stone».

Como referi na altura, parece-me que há uma semelhança razoavelmente grande entre esta figura e a uma representação associada à deusa Tanit (Tânia):
Figura do British Museum - invocação à Deusa Tanit
(repare-se na meia lua com um ponto)

Há bastantes menires com inscrições (por exemplo: http://www.wikiwand.com/en/Statue_menhir), e não será de estranhar que este aparecimento fálico se associasse a divindades maternais, pelo lado feminino, como símbolos da fertilidade, onde se incluiria ainda Tanit.

A parte dramática irá ocorrer com o ideal da fertilidade.
Está muito bem representada no mito de Cronos e Zeus.
O problema, claro está... foram as cabras!
A lógica sai tão transparente, que chega a parecer uma verdade cristalina - por muito pequena que seja a base factual de sustentação.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Seguindo os pés de Barros (1)

João de Barros, no seu pouco conhecido "Livro das Antiguidades":

Libro das antiguidades e cousas notáueis de Antre Douro e Minho, 
e de outras muitas de España e Portugual. 
Por Ioão de Barros & Composto no año de 1549.

... começa por referir o propósito de servir como "testemunho de vista" para futuros escritores curiosos sobre Portugal:
E ainda que esta minha ajuda seria fraca para o que esta terra merece, contudo quis eu ser o autor para que quando alguém mais curioso quisesse escrever coisas de Portugal mais particular, muito do que aqui é feito, pudesse saber esse pedaço dela, e de mim, como testemunho de vista tomar, e suprir o que deixou Ptolomeu, e outros.
Nesse sentido, e como a obra está acessível apenas no manuscrito original, começo pela transcrição usando a mesma ordem alfabética que o autor. João de Barros cita essencialmente Ptolomeu, Plínio, mas também os Itinerários de Antonino, a que terá tido acesso privilegiado, e ainda obras mais contemporâneas de Rafael Maffei (Volaterrano), ou de Florian de OcampoDe Censibus de Siculo, parece ser obra do então celebérrimo e agora desconhecido Pedro Gregório Siciliano, que escreveu sob bula papal de Nicolau V.

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A
Andaluzia - província de Castela, sabia-se chamar Boetica, do nome do Rio Boetis, a que agora chamamos Guadalquibir. Também parece segundo Plínio que se chamavam os povos daquela terra Andalongenses. Esta província foi tomada pelos Vandalos, de cujo nome foi primeiro chamada Vandaluzia, como diz Volaterrano, Outros dizem que se chamava assim por estar antes da província da Lusitania, quasi anteLusitania, segundo Mario Aretro; cada um siga o que melhor lhe parecer.

Ave - é Rio __ três léguas do Porto, mete-se no mar em Vila do Conde. Chamava-se Avis, e Avon segundo Plínio.

Alhariz - vila do Reino de Galiza, tomou este nome de Alarico, Rei Godo que a fundou. Está a três léguas de Chaves.

Almafala - vila em Riba de Coa na Lusitania, é nome Arábico, que quer dizer arraial de gente.

Alfama - uma parte de Lisboa é nome Arábico e Hebraico, porque uma com assento na Vltª, quer dizer banho de água quente. É porque na Alfama há muita compra de água quente, e muitas casas de água, e ao tempo dos mouros as havia, por isso lhe chamaram Alfama, a que o Gregos chamam termas, que significa águas quentes de natureza, cuja quentura se causa de minas de enxofre por onde corre. E por isso a água do Chafariz d'El Rey sai quente, e faz pé branco como liga de enxofre.

Alcalá de Henares - todos concluem que se chamava Complutum, Ptolomeu e Plínio.

Águeda - Rio na Província de Lusitania além de Coimbra, chama-lhe Ptolomeu Gatta.

Avilla [Ávila] - cidade em Espanha chamava-se segundo Plínio Obila.

Astorga - cidade na Espanha Terraconense chamava-se Astruria como diz o Itinerário & Asterica, os Godos lhe chamavam Roma.

Aranda - em Castela: Arunda.

Alvor - vila no Reino do Algarve, sabia-se chamar Porto de Aníbal, como diz Flor_

Algecira [Algeciras] - no Reino de Granada, é nome Arábico chamam-lhe Sola, como diz Antonino.

Arzila - cidade de África, chamava-se Zelis. Segundo Antonino e segundo Ptolomeu Zelia, e segundo Estrabão chamavam-lhe Abila. Parece boa conjectura que Zelis seria Cilee e Zelia seria Arzila.

Almada - em vida del Rey D. João o 1º, chamava-se Almadão

Algarve - é Reino misturado com Portugal que os Mouros partiram tendo Espanha, e é nome Arábico, Algarbi quer dizer poente.

Alcacere - cidade de África é nome Arábico, dizem que se chamava Exiliza.

Alemquer [Alenquer] vila, oito léguas de Lisboa. Ptolomeu parece que lhe chama Jerabriga, segundo o lugar onde assenta, e o Itinerário assim lhe chama e a põe 30 000 passos de Lisboa, que são oito léguas.

Alcaçar do Sal [Alcácer do Sal] todos assentam que se chamava Salacia na província da Lusitania.

Aveiro - vila na Lusitania junto ao mar na foz do Rio Agueda, parece que Ptolomeu lhe chamava Aritium, mas o Itinerário lhe chama Talabriga, porque diz que de Coimbra a Talabriga são cinquenta mil passos, pelo caminho de Lisboa que são doze léguas. Florião lhe chama Lavara, o que não me parece, porque Lavara é um lugar pique no sobre-o-mar no termo da Cidade do Porto, que hoje chamam assim.

Abrantes - vila na Lusitania junto ao Tejo, parece que Ptolomeu lhe chama LacobrigaInferis igit...
Mas segundo opinião do Autor a duas léguas da Vila de Abrantes, no seu termo mesmo, está um julgado que chamam Bretobel, e Ptolomeu põe ali uma vila a que chama Bretolium. Parece que esta deve ser Abrantes, parece que se lhe corrompeu o vocábulo de Bretolium Abrantes.

Almeirim - é nome arábico, assim como Alcoentre, Alcanede, Alverca, Alfizirão [Alfeizerão].

B
Bouga [Vouga] - na Lusitania além de Coimbra, que se mete no mar, chama-lhe Volaterrano Vacca e Antonino Vaccus.

Badaioos [Badajoz] - cidade na Boetica, pouco há que se chamava Vadalhouce [Badalhouce] e Ptolomeu chama aos daquele província Pacenses dos quais parece que fala a lei em Lusitania ff. de Censibus, diz o Siculo que se chamava Pax AugustaPacenses são os de Beja, quod Julia Pax dicebat.

Burgos - cidade na província Terraconense diz Antonino Venero que se chamava Musburgi, e assim parece que lhe chamava Tolomeu, mas o Siculo diz que se chamava Avia.

Baeça - chamava-lhe Antonio de Nebrija Biacia.

Birvista - chamavam-lhe Virovista.

Beja - em Lusitania se chamava Paça, e Pax Julia. O Doutor André de Resende escreveu era da antiguidade desta cidade um douto tratado.

Braga - chamou-se Bracara Augusta dos Imperadores para diante, e antes deles Bracara, e os moradores Bracantos.

Barcellona [Barcelona] - cidade em Catalumnia na foz do rio Rubricato chamava-se Barcinon segundo Ptolomeu e segundo Marineo, Siculo, Barcine Faventia.

Beyra [Beira] - comarca deste Reino, não veio a minha notícia como, nem quem, lhe pôs este nome, parece por que confina com Castela e isso lhe chamaram Beira desde que este reino é partido.

Bargança [Bragança] - cidade de Portugal, cabeça do Ducado chamava-se Brigetium, ou Brigantium.

Blaves - vila de Aragão chamava-se Blanda, como diz M. Aretro.

Barcellos - vila de Entre Douro e Minho, parece que lhe chamava Ptolomeu Cenobriga na Guineia [província] dos Celerinos. Vercelos dizem os livros antigos quasi versus caelum. E chamam a Cernãocelhe  [Sernancelhe] lugar da Beira in oppido cernocaelum. Outro Vercelos é em Piamonte. 

Beiara [Béjar] - cidade da Lusitania dizem Aretro e Siculo que se chamava Culmentaria, e Antonio Nibrija chama-lhe Beiarra com dois R.

C
Caminha - vila em Portugal na foz do Rio Minho parece que lhe chama Ptolomeu Eminium.

Carmona - cidade na Bética, chamava-se Augusta ferma e Astigicolonia como dizem Antonio e Volaterrano.

Çaragoça [Saragoça] - cidade de Aragão, dizem Mario Aretro e Siculo que se chamava Saldiba, e foi edificada por El Rey Juba, e Volaterrano diz que se chama Flama Caesarea Augusta, ou Augusta Caesarea, como diz Ptolomeu.

Calahorra - cidade de Terragona donde foram naturais S. Domingos e Quintiliano, chamavam-lhe Colagurium e diz Mario que não sabe se por ventura seria Calatayud.

Cabo despichel [Espichel] - em Lusitania chama-se Barbaricum promontorium (Ptolomeu).

Coria [Curia] - cidade na Lusitania, Caurium.

Cavado - rio que corre junto de Braga chamam-lhe todos Cavus.

Cuenca - cidade na província de Terragona [Tarragona] chamava-se Concia, e Valeria e Cauca.

Cartagena - chamou-se Nova Cartago porque Asdrubal a edificou vindo de Cartago, mas Antonio diz que Nova Cartago se chamava Spartaria, que esta se chama Cartago vetus.

Ciguensa [Siguenza] - chamou-se Serguntia e não Saguntum.

Cabo de S. Vicente - lugar conhecido no Reino do Algarve, chamam-lhe os cosmógrafos Sacrum Promontorium, onde era este o lugar que se chama Sarges [Sagres] e antes se chamava assim. E desde que ali veio estar o corpo de S. Vicente de Valença de Aragão lhe chamaram o nome que tem.

Calis - cidade na Boetica chama-se Gadis, Gadir, Gaditana, e Eritrea (Siculo e Florião do Campo). E segundo a mim, me parece estes nomes tão mudados, segundo os possuídores, porque os Latinos chamaram a qualquer Ilha cercada de água Giaris, e daqui se chamou Gadir corruptamente, e os Mouros chamam à ilha pequena Gezir. E assim chamavam às Liziras de Santarém, e nós corrompendo o Arábico lhe chamamos Leziras. Depois os Castelhanos lhe chamaram Caliz.

Castello da Feira - em Lusitania chama-lhe o Itinerário de Antonio Langobriga

Carpio [El Carpio] - vila, Carbulo.

Camnia - em Aragão chamava-se Lastania, segundo Mario, Siculo e outros muitos.

Ceita [Ceuta] - cidade de África, chamava-se Septa, quasi coisa cercada porque o mar "a tinge" de toda a parte, mas Volterrano diz que tomou aquele nome de dois nomes iguais, o Itinerário lhe chama "Septe Irmãos" porque tem derredor sete montes. Justiniano lhe chama Septa, os Mouros como quer que quebram a sua fala nos dentes lhe chamaram Ceuta, e nós agora Ceita. E na tomada desta Cepta diz o cronista que acham em escrito por Mouros mui sábios que Ceta em Arábico quer dizer começo de formosura, e que foi fundada por um neto de Noé.

Coimbra - quase que retém ainda o seu antigo nome, posto que dos antigos uns lhe chamaram Conimbrica, como diz o letreiro da Ponte da Táboa, e outros lhe chamam Colimbrica. Nunca vi que lhe chamasse Conimbriga, e cada um destes três nomes pode ter sua razão. E derivaram Conimbrica de Conus, que quer dizer Pirâmide, porque o monte onde está o parece, ou de Colis que quer dizer monte alevantado [colina]. Ou de Brigo, rei de Espanha donde outros lugares tomaram o nome. Como é cidade muito antiga que parece que os Gregos fundaram de primeiro (Fr. Roiz de Sá de Meneses escreveu sua antiguidade, e de suas insígnias um breve tratado).

Chaves - vila de Portugal na província da Galiza, segundo Ptolomeu, dizem que tomou este nome do Imperador Cláudio, mas segundo vi por letreiros que ali estão os Romanos lhe chamavam Aquis Flavis, porque estão ali uns banhos, e fontes quentes, e aos vizinhos lhe chamavam aquaflavienses. E era lugar muito frequentado dos Romanos, e de Braga vinham ali pousar indo para Roma. E pelo caminho há calçadas antigas e piares [pilares] com letras que declaram as léguas que há até esta vila, e nela há muitos epitáfios de defuntos e outros letreiros.

Celorico - é um concelho nesta Guineia [provincia] de Entre Douro e Minho, cinco léguas de Guimarães ao sul, e segundo o seu edifício parece que é obra antiga, e posto em monte alto, e creio que este deve ser o que Ptolomeu chama Celiobriga, que em seu tempo era cabeça dos Celerinos, que estão naquela parte. Segundo ele os assenta e pelo tempo se corrompeu o vocábulo que não divirja muito.

Corunha - vila da Galiza chamava-se Corona, e os povos daquela terra Coronenses, como diz Siculo e Antonio diz Coronium, e Florião diz que se chamava Clunia.

Çamora [Zamora] - diz Volaterrano que se chamava Egitania, o que não me parece porque Egitania se chamava a cidade da Guarda, e ora se chama na Chancelaria de Roma, e aí estão dois lugaras antigos que se chamam Idanha Velha, e Nova, que tomou este nome de Igitania e dizem que tomou este nome del Rey Egita [Egica] Godo: Mas o Siculo diz que Çamora se chamava Sispona, outros querem dizer que se chamasse Saguntum, o que é falso. Outros dizem que se chamava Sentica como Florião do Campo, nas decretais lhe chamam Zamora que parece nome Arábico, como Zamor.

Cezimbra [Sezimbra] - vila da Lusitania, chama-lhe Ptolomeu Cetobrix,e Calepino Cetobrica.

Corduva [Cordova] - cidade na Boetica chamava-se Colduba, mas muito hás Séneca, Mela, e Martial, que foram de lá naturais, lhe chamaram Corduba.


Coa - rio na Lusitania, que se mete no Douro, e é grande rio mas não vi quem lhe faça menção.

Condexa [Condeixa] - vila três léguas de Cuimbra ao poente onde os Romanos tiveram grande habitação, e há ali grandes letreiros, e epitáfios, e se chamava Condensa.

Castro Marim - vila no Reino de Portugal, no Algarve, a que parece que Ptolomeu chama BalsaCastrum marinum e Castrum viride [Castro Verde] no Campo de Ourique são nomes antigos. E Castro Marim foi a cabeça da Ordem de Cristo antes que se tresladasse a Tomar, e parece que ad arcendos hostes [para repelir] ali estava naquela parte convenientemente em frontaria de castelos dos Mouros.

Ciudad Rodrigo - cidade na Lusitania em Castela, chamam-lhe na Chancelaria Apostólica Civitatensis, parece que Ptolomeu lhe chama Desbriga

Calatayud - em Aragão, dizem muito que é onde Ptolomeu chama Bilbilis terra de Martial, o que Siculo nem aprova nem reprova. 

Castello Rodriguo [Castelo Rodrigo] - vila na Lusitania em Riba de Coa, dizem que foi edificada por El Rey D. Rodrigo, derradeiro dos Godos, e uma torre está aí junto do Mosteiro da Giar [Mosteiro de Santa Maria "de Aguiar"] que é fama que ele foi.

D
Douro - rio insigne que reparte a Lusitania de Galiza, detém seu nome porque lhe chamam Durius.

Denia - vila na pCuincia [província] de Cartagena, diz Siculo que se chamava Dianium.

E
Esija [Écija] - cidade na Bética diz Siculo que chamava Astigis.

Ebora [Évora] - cidade na Lusitania chamava-se Elbora, Ebura, é muito antiga, e parece ser edificada del Rey Hibero, Annio [Annio de Viterbo] diz que lhe chamavam Ubida. O mestre André de Resende, varão douto do nosso tempo fez de sua antiguidade uma notável digressão.

Ebro - rio de Espanha chamava-se Hibero do nome do segundo Rey de Espanha, segundo diz Annio [Viterbo].

Espanha - tomou este nome de um Rei antigo dela que se chamava Hispan, e depois se chamou Hiberia do Rio Hebro, e depois Hispéria.   F [Florian de Ocampo].

Freixo de Espada Cinta - vila em Portugal na Guineia [província] Terracona [Tarraconense], creio que tomou este nome de um que se chama Freixo, que a edificou na destruição de Espanha, e era primo de D. Rezendo [Rosendo de Celanova] que jaz em Cellanova, que fundou o Mosteiro do Monte em Cordova, e trazia por armas uns feixes com uma espada e as pôs nesta vila donde lhe chamam, e isto é o porque a geração dos Freixes em Galiza traz esta espada por armas.

Favaios - é uma vila na parte de Galiza, e agora em Portugal na comarca de Trás os Montes, chamou-se Flavia como dizem letreiros antigos que ali vi. Parece que Ptolomeu lhe chama Flaviobriga, daqueles que edificou el Rey Briguo [Brigo].


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Oportunamente espero ter a possibilidade de completar a transcrição desta lista que Barros organizou. Nem interessa muito saber se as suspeitas de Barros foram confirmadas, se concordamos com elas ou não, se eram conhecimento difundido e acessível, ou se as fontes de Barros eram fidedignas. Interessa que Barros sentiu necessidade de organizar a lista, e percebe-se bem a razão.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Mesa para Sandwich

Estava já a juntar demasiados tópicos, para vários postais, mas o tempo não chega para tudo, e assim vou deixar algum material para outra altura.

Há um tópico que não posso deixar de referir, e voltamos a Sandwich... neste caso, o subtítulo seria "Havai para a Mesa". 

E a razão por que vai para a Mesa, ilustra o habitual. Vou buscar uma ou outra coisa a um livro, guardo o pdf, mas não leio tudo, longe disso. Por vezes, pego neles de novo. Aconteceu com o

de Joaquim Casado Giraldes, 1825

Porque, como em 1825 a Austrália tinha sido "descoberta" há pouco tempo por Cook, ainda mantinha a designação "Nova Holanda", e é sempre curioso saber como a informação era passada naquele tempo para instrução dos petizes. A obra de Casado Giraldes está extremamente bem organizada, como era raro ver antes nos autores portugueses, ou mesmo estrangeiros. 

Interessou-nos esta passagem sobre o Havai (pág. 26) 
SANDWICH - (ilhas e arquipélago de), compõem-se de 11 ilhas no oceano Pacífico, que foram descubertas em 1542, por Gaetan, Hespanhol, e terão 40 000 almas. O clima é assaz temperado, o terreno é fértil e fazem algum comércio.
Que Gaetan era este?
Num tempo sem Google seria complicado saber, até porque o nome não constava na Wikipedia (entretanto irei lá colocar algo sobre este assunto). Mas assim é fácil, e aparecem várias obras referindo Juan Gaetan, o tal "descubridor" do Havai... depois dos polinésios, está claro!

Uma delas é de Oskar Spate, intitulada "The Spanish Lake"(1979), que nas páginas 108-109 (edição de 2004) diz assim:
On the maps of today the Hawaiian Islands lie so blatantly between the east and west-bound tracks of the Galleons, that it seems almost mandatory that some stray must have found them. The inference was first drawn by La Pérouse, who deduced from Spanish charts that islands named "La Mesa", "Los Majos", and "La Disgraciada", in the right latitude but too much far to the east were in fact the Hawaiian group, La Mesa ("the Table") in particular being the main island with the great table-massif of Mauna Loa; the error in longitude was put down to Spanish failure to allow for currents. On one such chart is a note saying that Juan Gaetan, who was with Villalobos in 1542, discovered the group, and named it Islas de Mesa, in 1555; unluckily this chart also gives Cook's name, the Sandwich Islands. One must admit that if a non Polynesian name were to be used, La Mesa would be much preferable to Sandwich.
Pronto, está aqui a razão do título deste postal.
As ilhas que Cook nomeara Sandwich, tinham sido nomeadas Mesa por Gaetan. Mas, nem ficaram Ilhas Sandwich (há outras), nem ficaram Ilhas Mesa, acabando por se impor o Havai local.

Poderíamos ficar por aqui, mas a questão é que não ficámos, e encontrámos um relato mais detalhado dessa viagem de Gaetan, no 16º volume de

ou nouvelle collection de toutes les relations de voyages 
par mer et par terre, qui ont été publiées jusqu'à présent 
dans les différentes langues de toutes les nations connues 
contenant ce qu'il y a de plus remarquable
(tradução francesa)
 Peter de Hondt (Haia) 1747-1768

há um capítulo denominado

onde se relata a descoberta de Gaetan - não exactamente com os mesmos nomes de terras - ilhas dos Reis, ilhas Coral, e ilhas Jardins... mas Oskar Spate também diz que o nome "Mesa" teria sido posto por Gaetan só em 1555.

Reparemos que a edição deste volume 16 é de 1758, numa altura em que os Távoras iriam ser levados no processo, duzentos anos depois da viagem atribuída a Gaetan, e doze anos antes das viagens de Cook. Estamos antes das viagens de Cook, mas os autores holandeses editados por Peter de Hondt, juntam um mapa da Austrália, ou melhor da "Nova Holanda":


Este foi o primeiro mapa que encontrei, anterior a Cook, com a Austrália "fechada". As representações anteriores de Hessel Gerritsz, limitavam-se a apresentar a parte ocidental - que, como se vê, é a parte desenhada com grande exactidão. Aliás as linhas mais imprecisas estão comentadas como sendo "conjecturas", com base na viagem de Tasman, patrocinada por Van Diemen. Aliás, por essa razão, a Tasmânia era antes denominada Terra de Van Diemen, e aqui a Tasmânia aparece incorrectamente ligada à Austrália. Depois de Van Diemen, e durante mais de cem anos, não houve mais dinheiro para explorar a Lua, perdão, a Austrália, até que a Cook bastou a vontade de Sandwich. 

Mais interessante ainda, é termos os próprios holandeses a reconhecerem a presença de Pedro Fernandes de Queirós na Austrália, em 1606, na península da Carpentaria. 
A "Terre du St. Esprit" está bem visível no mapa, acrescida com a menção "découvert en 1606 par Ferdinand Queir(ós)". 
Recordamos que Queirós tinha usado o nome "Austrália do Espírito Santo", mas também na nomenclatura a parte "Espírito Santo" faliu, e só "Austrália" ficou. E acrescenta-se que já falámos dos bancos, dos velhos bancos, denominados "Abre-olhos", constantes mesmo de mapa de Gerritsz.

Portanto, como vemos, não havia dificuldade em 1753, dois anos antes do terramoto, em considerar a presença de Queirós na Austrália, na viagem de 1606. Curiosamente no mapa não se assinala o Estreito de Torres, que foi descoberto nessas viagens com Queirós.

Regessando a Gaetan, convém apenas notar que dizer que Sandwich estava pronta em 1542, é extremamente inconveniente para a versão oficial de Cook. 
Porque, Pedro Nunes dizer em 1535 a D. Luiz que os Portugueses "tinham descoberto, não apenas todas as ilhas, mas também todos os penedos, e todos os baixios", e que "não há quem ouse dizer o contrário", é uma afirmação que nem sequer é comentada, e assim hoje, nos dias do politicamente correcto, pretende-se passar por tonteria do maior sábio português. Outra coisa é ter estrangeiros, holandeses, a reconhecer que o Havai tinha sido descoberto em 1542. 

É que fica um "bocadito mais estranho" dar-se com o minúsculo Havai no meio do Pacífico logo em 1542, e ter-se falhado tão rotundamente toda a Austrália durante mais de dois séculos, praticamente até a chancela ser passada a Cook em 1769.

Para terminar, no mesmo livro de Peter de Hondt, logo no primeiro volume (p.15) está uma descrição notável do que foram as viagens com "Talent de bien faire":
Il paroit que ces nouvelles decouvertes avvoient fait alors beu d'impression, puisqu'en 1525 Garcie de Loyasa Chevalier de Malte étant arriver aux Isles Moluques avec une Flotte Espagnole, y trouva des Portugais, avant qu'ont sçut en Portugal qu'il y en êut ces lieux. 
Et le même Amiral s'étant avancé au seconde degrée de latitue méridionale, jusqu'à l'Isle de Saint Mathieu, qu'il trouva déserte, y remarqua néanmoins plusieurs traces des Portugais; car, sans compter divers arbres frutiers, & quelques troupeaux apprivoisés, il lut sur l'écorce d'un arbre une Inscription que lui apprit que les Portugais avoient été dans cette Isle dix-sept ans (24 no inglês) auparavant.
Ils y avoient joint la célébre divise du Prince Henri, Talent de bien Faire, suivant l'usage des Matelots de leur Nation, qui lassoient ce témoignage de leur arrivée dans tous les lieux où ils abordoient.
Portanto, não é de admirar que os outros, tal como Garcie de Loyasa, sempre que chegassem para uma descoberta, eram confrontados com a possibilidade encontrarem uma chapa zero do Infante...

Já é suficientemente mau estar lá 1501 (ou mesmo, 1508, conforme mete o tradutor francês), numa altura em que não se sonhava ir para as bandas das Molucas, mas sugere mesmo que possa ter sido ao tempo do Infante a inscrição do lema, e a data 1501 ser colocação posterior, à parte.
Como ficava a Malta, do cavaleiro, com tal desplante? Bom, pelo menos julgo que não se sabe que ilha de S. Mateus é essa, entre tantas nas bandas das Malucas, o que mostra que não devem ter apreciado o gesto, e apagaram o nome.

Mais elucidativo é o discurso inicial dos autores sobre D. João II.
Diz-nos que D. João II sabia perfeitamente que as outras nações iriam ter inveja das posses portuguesas, e por isso enviou uma carta a cada príncipe europeu dizendo que as navegações em África prosseguiam a bom ritmo, mas que precisava de ajuda. Quem quisesse ajudar, teria uma parte na partilha das conquistas. No entanto, explicam os autores, os príncipes europeus consideraram que ao contornar a África teriam fortes confrontos com os muçulmanos, e abdicaram de participar. Só depois é que D. João II solicitou ao papa a demarcação da linha para reivindicar os territórios (inicialmente o paralelo das Canárias). Depois, quando os príncipes europeus perceberam que as explorações davam acesso às riquezas orientais, já era tarde demais, e a única forma de meter a mão nesse bolso, foi questionar a autoridade papal. Lutero deu então muito jeito...