É difícil perceber como a proibição de descoberta da Austrália, ou da costa norte da América terá sido encarada pelos cartógrafos do Séc.XVI, e da forma como terão se adaptado a esse facto, sabendo que a História iria repetir-se, ocultando novos territórios durante mais uns séculos.
A incompetência dos navegadores seria implícita. Depois de percorrerem dezenas de milhares quilómetros, chegando a Timor, falhariam durante séculos um enorme território a escassas centenas de quilómetros (a Austrália)... uma navegação exequível num pequeno batel. Poderíamos falar no Estreito de (Luis Vaz de) Torres, onde seria quase difícil passar sem avistar a Austrália, mas a História é assim, e as mais perfeitas evidências não são "factos históricos".
Nem sempre há tormentas que afastam os navios da costa... Tormentas seriam, claro está, pois seria tormentoso o problema de reportar ou silenciar qualquer relato de novo território.
Porém, o assunto principal não é aqui esse... o assunto é este incompetente mapa da América do Sul, de Guillaume Brouscon, de 1543, que pode também ser um competente mapa da Austrália:
Brouscon (1543): América do Sul... ou Austrália?
(Colecção Huntington-Univ.Berkeley)
Há inúmeros exemplos deste genéro, mas que não são tão evidentes. Estes mapas não serviam os marinheiros, na maioria dos casos serviam as colecções da aristocracia. O problema de reportarem, ou não, uma verdadeira costa, colocar-se-ia mais nas discussões cortesãs.
Lembrei-me deste exemplo, a propósito do mapa de Ph. Buache em que aparesenta um continente Antártico separado... No entanto, apesar do erro grosseiro, é possível vislumbrar uma imagem da Austrália que encaixaria completando a informação que falta na metade do território atribuído a Tasman.
Ph Buache (1754) in Historic maps of Antarctica (elisezevitz.wordpress.com)
Desembarcamos logo na espaçosa
Parte, por onde a gente se espalhou,
De ver cousas estranhas desejosa
Da terra que outro povo não pisou;
Porem eu cos pilotos na arenosa
Praya, por vermos em que parte estou,
Me detenho, em tomar do sol a altura
E compassar a universal pintura.
Achamos ter de todo já passado
Do Semicapro pexe a grande meta,
Estando entre elle & o circulo gelado
Austral, parte do mundo mais secreta:
Eis de meus companheiros rodeado
Vejo hum estranho vir de pelle preta,
Que tomaram por força, em quanto apanha
De mel os doces favos na montanha.
A descrição poderia adequar-se aos indígenas da África do Sul, ou aos aborígenes da Austrália...
A parte do mundo mais secreta seria, no tempo de Camões, sem qualquer dúvida, a Austrália...
Afinal, Ceilão ou Sumatra, foram nomes usados para identificar a grande ilha Taprobana, mas essa grande ilha nunca chegou a poder ser a Austrália.
- Que "parte do mundo mais secreta", quando Bartolomeu Dias tinha passado o Cabo da Boa Esperança dez anos antes?
- Claramente... imaginação poética que tudo mistura, sem nada querer significar.
- Feliz infeliz quem assim o entender.
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