Alvor-Silves

quarta-feira, 31 de março de 2021

Fernão de Magalhães (6) missa nas Filipinas

Uma das coisas a que os Filipinos deram alguma importância foi à realização da 1ª missa nas Filipinas,

 

Portanto, parece que os filipinos não esqueceram de comemorar esse evento em Limasawa, algo que a igreja católica portuguesa ignorou, bem como todas as autoridades, porque se há coisa que a Covid trouxe foi uma total perda de memória, de vergonha, de coluna vertebral, etc.

Pelo menos o Vaticano não esqueceu por completo... porque afinal de contas há muitos filipinos (e qual Cristiano Ronaldo, o cristiano Francisco bateu o recorde de assistência nas Filipinas, com 6 milhões de fiéis numa missa).
ainda que se tivesse anunciado que não haveria comemorações.
Praia de Limasawa onde terá decorrido a Missa pascal em 31 de Março de 1521

Tudo correria bem, na evangelização das Filipinas, excepto em Cebu, onde Lapu Lapu decidiu não aceder a esta realização de missas pelas diversas ilhas. Magalhães tentou usar a força para converter aqueles filipinos. É assim que passado um mês lunar, em 27 de Abril, os guerreiros de Lapu Lapu vão terminar com a vida de Magalhães.

______________________
Nota adicional (01.04.2021):
Convém notar que, mesmo após a morte de Magalhães, o comando da expedição continuou a ser português e não passou para Elcano.
Por breves dias, o comando esteve com Duarte Barbosa e João Serrão, que foram ambos mortos num jantar oferecido por um rajá local, aparentemente por conspiração do intérprete malaio Henrique de Malaca, que deveria ter sido libertado após a morte de Magalhães.
Ainda depois disso, a expedição foi entregue a João Lopes de Carvalho, durante quase 5 meses, até que por rebelião/eleição passou para Gonzalo Espinosa, espanhol. 
Este Espinosa foi depois capturado pelos portugueses, pelo que Elcano nunca foi comandante da expedição, mas somente comandou o navio que regressou.
Quando os espanhóis tentam puxar para Elcano o sucesso da circumnavegação, é claro que ignoram tudo o que não interessa à narrativa... Para colocar-se ali o nome de Elcano, deveria ser no mínimo:
Expedição de Magalhães-Barbosa-Serrão-Carvalho-Espinosa-Elcano

Sobre João Lopes de Carvalho, remetemos um anterior postal:
porque, por estranho que possa parecer, João Lopes de Carvalho nem sequer tem página na Wikipedia, nem em português, nem em espanhol, nem em inglês:
Zero, nada, népias!

domingo, 28 de março de 2021

Annus covidianus

Passado um ano, é altura de ver o que foi escrito aqui. Cito algumas frases.
Isto é sempre bom para que se veja até que ponto exagerámos (ou não) em previsões.

  • 9 de março de 2020 - Cara ou corona?
    • Cidadãos mais circunscritos e limitados no seu raio de acção, são cidadãos cujas acções, mesmo descontroladas, podem ser contidas e tratadas no "foco da doença".
    • Ou seja, o que esta pandemia de gripe deixará claro é que o contacto cara a cara passará a acto perigoso face à mais saudável interacção no verso e reverso, coroa a coroa, com a distância assegurada pelos filtros sanitários adequados.
  • 10 de março de 2020 - dos Comentários (60) é-vento 201
    • (...) IRF sinalizou um evento que decorreu em 18 de Outubro de 2019, dois meses antes de ser sinalizado o primeiro caso da epidemia na China: Event 201 - A Global Pandemic Exercise
    • Portanto, para quem gosta de acreditar em coincidências, tratou-se de mais uma coincidência. Haverá quem diga que este tipo de exercícios de antecipação é considerado há muito tempo, e que a preocupação com pandemias é permanente. Mas, curiosamente, também acertou no vírus escolhido, um novo corona-vírus, e numa taxa de mortalidade, à volta dos 5%.
    • No entanto, nunca tal exercício tinha sido promovido, incluindo ainda o aspecto financeiro, a que se juntava a participação do World Economic Forum, e a fundação de Bill Gates, alguém que há muito mostrava preocupação pelo assunto, mais do que a sofrera com os vírus informáticos.
  • 14 de março de 2020 - dos Comentários (61) pan-demos
    • (...) José Manuel Oliveira sinalizou um detalhe importante, relacionado com a existência de «fundos pandémicos»
    • (...) No entanto, e numa altura em que haverá alimento para múltiplas teorias da conspiração, surgiu uma outra, relacionada com o projecto de identificação digital ID2020, que consiste em usar vacinas para uma identificação digital dos indivíduos.
    • Este será o primeiro teste de funcionamento de uma sociedade funcionando à distância, centrada em casa própria. Uma sociedade para o Séc. XXI com características medievais, nomeadamente na limitação do deslocamento físico, na ausência de propriedade real e na completa dependência de um funcionamento central para sobrevivência individual.
  • 22 de março de 2020 - Lavagem de Pilatos
    • Convém perguntar qual será a diferença entre as orientações das "entidades de saúde" e os conselhos das avós, quando éramos crianças. Rapidamente poderemos concluir que as nossas avós eram bastante menos mentirosas, atabalhoadas ou bobas. Só faltará às autoridades sugerirem colocar pimenta nos dedos, para não os levar à boca.
    • Entretanto, os cidadãos vão ficando numa prisão domiciliária ridícula, onde o simples passear é crime, e onde até parece que os carros são também transmissores de vírus... 
    • A vantagem do assunto é que a situação foi de tal forma exagerada que nem se dá espaço aos outros vírus para seguirem o seu caminho. Este distanciamento não bloqueia apenas o corona-vírus, vai bloquear toda a contaminação, e no final de contas, o que podemos ter a mais de mortes por um vírus, irá compensar o que temos a menos pelos outros... 
    • Ou seja, que amanhã, 23 de Março haverá ~ 2010 casos, depois 2500, 3080, 3750, etc... chegando a aproximadamente 8 500 casos no final deste mês.
  • 28 de março de 2020 - Corona spinea
    • Em períodos em que o medo impera, e em que ordens draconianas são aceites sem pestanejar, com um pseudo-argumento científico, tudo está preparado para uma perfeita arbitrariedade. Com novas fronteiras impostas pelo medo de propagação, o turismo tem os seus dias contados, as viagens a destinos exóticos são possibilidades do passado, mas pior que isso, a dureza de posições, remetidas a fronteiras, pode impor um novo militarismo descontrolado... com óbvias vantagens para os produtores de armamento.
    • Relativamente a Portugal, as contas que apresentámos no postal anterior foram completamente confirmadas durante a semana, praticamente todos os dias (com erros de 1% a 5%), mantendo a previsão de que o pico deverá ocorrer no dia de Páscoa... no entanto, as estimativas da DGS são agora outras, dilatam para Maio, talvez porque seja mais interessante dilatar o período de detenção.
    • E é óbvio que chegados à Páscoa, com 20 ou 25 mil casos, 300 ou 400 mortos, os valores vão continuar a aumentar até Maio, mas esses aumentos serão pequenos e residuais, dependentes das deslocações na Páscoa e da capacidade de recuperação da doença.
    • A situação não se irá repor com a mesma velocidade que se impôs. As restrições foram colocadas de um momento para o outro, mas cada uma delas só será levantada se for lutado para que assim seja. 
    • Portanto, o que agora preocupa não é o vírus, é o que a desmedida irracionalidade humana poderá fazer usando este e os próximos vírus como pretexto... Podendo não ser nada, não me parece augurar nada de bom, pela lógica do "quanto pior melhor" que observámos ao longo dos séculos.
Pequena conclusão.
Defeito profissional, a previsão do comportamento da curva de casos foi brincadeira de crianças.
A previsão (no dia 22) deu "sem dúvida" um pico até à Páscoa (dia 42). 
Confirmou-se em pleno.
Ninguém o quis reconhecer. Nem aqui, nem entre amigos, nem noutros sítios onde apresentei, onde estavam parodiantes "especialistas" do Infarmed ou que vão debitar loas à TV. Antes, ninguém acreditava, porque ia contra a numeração oficial que punha um crescimento até 175 mil casos em Maio. Nos próprios dias da Páscoa, a DGS ainda tinha dificuldade em reconhecer. Depois, não interessava, porque o problema era o desconfinar...
Quando se está rodeado de pessoas que vivem numa realidade distante dos factos, ou se alinha com esse discurso, ou há um perigo claro de "ser anormal". Desde essa altura, recuso-me a fazer previsões, mas ensinei uns vinte para o fazerem, que voltaram a acertar a um mês de distância, com precisão idêntica.
Calam-se todos, nunca mais falam comigo sobre o assunto, e ficamos por aqui.
Quando é tempo de errar, quem quiser acertar é um inimigo da sociedade!

segunda-feira, 22 de março de 2021

A África começa nos Pirinéus (5)

Normalmente era habitual os reinos colocarem nas suas moedas os seus símbolos distintivos.
Foi isso que se passou com as moedas cartaginesas, fenícias, mas então e as moedas judaicas?
Recupero um pouco a linha aqui interrompida sobre moedas.

Moedas fenícias

As moedas fenícias, os xequel, diferem segundo a cidade, relembrando que a Fenícia não era apenas Tiro, havia uma rivalidade com Sídon e também não seria desconsiderada a importância de Biblos. 

(1) Biblos

Começamos com Biblos, a cidade mais a norte. A típica aparência das moedas que encontramos é esta:
- uma embarcação com 3 guerreiros (ditos hoplitas gregos) sobre um cavalo-marinho alado; 
- no verso, um leão abocanhando um touro:

Séc. IV a. C.
Coin Archive: PHOENICIA. Byblos. Uzzibaal, circa 400-365 BC. Shekel (Silver, 23 mm, 13.22 g, 11 h).
Galley, with an eyed prow ending in a ram and a lion's head figure head, and with three armored
Greek hoplites standing left on deck, moving to left above waves;
below, Phoenician letters 'z above a hippocamp swiming to left with a murex shell below.
Rev. zb'l mlk gbl (in Phoenician) Lion attacking a bull to left.

(2) Sidon
Neste caso de Sídon, cidade no meio, há dois tipos de moedas comuns, um que invoca uma fortaleza com 4 torres, que depois deixa de aparecer, talvez consequência de uma destruição persa. Em substituição aparece um navio multirreme. No verso, umas vezes aparece um rei dominando um leão, noutros uma quadriga (associada ao domínio persa).

Séc. IV a. C.
Coin Archives: PHOENICIA. Sidon. Baalshallim II, circa 401-366 BC. Double Shekel (Silver, 32 mm, 27.93 g, 12 h).
Phoenician galley to left over double row of waves; above, 'Beth' (Phoenician).
Rev. Persian king and driver in chariot to left; behind, king of Sidon walking left, holding scepter.

Séc. V a. C.

Coin ArchivesPhoenicia, Sidon AR Half-Shekel. Time of Ba'alšillem I - Ba'ana, circa 425-402 BC. City walls with four towers, before which a Phoenician galley to left; below, two lions leaping in opposite directions / Persian Great King or hero standing to right, holding dagger and grasping mane of lion held before him; all within incuse square.


(3) Tiro
No caso de Tiro, parecem ser claros dois períodos. Um anterior à invasão de Alexandre Magno, com o cerco de Tiro, que levou à conquista da cidade, e um posterior em que aparece uma águia/fénix.
No caso anterior a 332 a.C., as moedas tinham tipicamente um cavalo marinho alado (como em Biblos, mas aqui na parte superior), e no verso estava uma coruja. Após a conquista helénica, e sob o império seleucida, passou a estar uma cabeça de rei ou Melkart, e no lado oposto uma águia, com letras gregas.

Séc. V a. C.
Coin ArchivesPHOENICIA. Tyre. Ca. 425-394 BC. AR shekel (25mm, 13.18 gm, 8h). NGC Choice XF 2/5 - 3/5.
Uncertain king. Bearded deity (Melqart?), bow and arrow in left hand, reins in right, riding winged hippocamp right above waves; dolphin swimming right below, all in guilloche border /
Owl standing right, head facing, flail and crook over shoulder; guilloche border

Séc. II a. C.
Coin ArchivesPhoenicia, Tyre AR Shekel. Dated CY 10 = 117 BC. Laureate bust of Melkart to right /
ΤΥPΟΥ Ι[ΕΡΑΣ] ΚΑΙ ΑΣΥΛΟΥ, eagle standing to left on prow, palm behind;
LI (date) above club to left; ZB monogram to right, Phoenician letter beth between legs.

No entanto, convém referir que esta é já uma moeda típica do período helénico, após Alexandre Magno, que se encontra não apenas na parte seleucida, mas igualmente com o mesmo aspecto na parte ptolomaica. Não é assim uma moeda de Tiro, será mais uma moeda macedónica cunhada em Tiro.


(4) Cartago
Há várias inscrições típicas. Começamos por um estáter de ouro, com a deusa Tanit e o cavalo.

Séc. IV a. C.
Coin ArchivesCARTHAGE. Circa 350-320 BC. Stater (Gold, 20 mm, 9.19 g, 4 h).
Head of Tanit to left, wearing triple pendant earring, necklace, ... with seven pendants, and a wreath of grain leaves.
Rev. Horse standing to left; in field to right, before horse's fore legs, three pellets arranged as an inverted triangle.

Alternativamente, começa a aparecer a palmeira (tamareira), por exemplo, atrás do cavalo, na primeira moeda, e depois na face da moeda seguinte, com cachos de tâmaras.

Séc. IV a. C.
Coin ArchivesCARTHAGE. Circa 400-350 BC. Æ Unit (16.5mm, 3.50 g, 6h).
Carthage mint. Wreathed head of Tanit left / Horse standing right; palm tree in background.


Séc. IV a. C.
Coin ArchivesZEUGITANIA. KARTHAGO.1/10 Stater. ca. 350 - 320 v. Chr. Vs.: Palme. Rs.: Pferdekopf

(5) Cádis

Há ainda moedas com inscrições fenícias/cartaginesas em Cádis, onde tipicamente nesta Andaluzia sob influência cartaginesa um dos símbolos usados eram um ou dois atuns... do outro lado, a cabeça deixa de ser entendida como Melkart, e passa a associar-se ao equivalente Hércules. 

Séc. II a. C.
Coin ArchivesGades. Hemidrachm. 120-20 BC. Cadiz. (Abh-1308). (Acip-634).
Anv.: Head of Melkart on left, wearing a lion's skin. Rev.: Tuna right with Phoenician legend type B.

(6) Judeia
Há um registo de evolução de moedas judaicas aqui:


que começa com umas pseudo-variações de moedas de Tiro, que tal como as de Atenas tinham uma coruja (símbolo de Atena), dizendo que a inscrição com 3 letras num "paleo-" (paleio) qualquer, quer dizer "Yehud". Esqueceram o detalhe que a coruja tem cauda, como as de Tiro, e não tem olhos grandes como as de Atenas. Têm mais duas moedas, tipicamente uma helénica e outra cartaginesa, e um paleo-paleio para tentar argumentar que havia moedas judaicas anteriores à queda de Cartago. 
As que mostram seguidamente são posteriores, e são simples variações de moedas seleucidas, que até têm o símbolo do império que ali dominou de 332 a.C. até à chegada romana, com uma concessão breve aos macabeus e a Herodes.

Portanto, não há vestígios de moedas judaicas antes do Séc. I a.C.
Depois será discutível... mas já estamos no tempo de Jesus, com 30 dinheiros em "shekels de Tiro".
Quando se começa a ver uma produção minimamente significativa, é quando se dá a primeira revolta Judaica que termina numa Massada e no transporte da menorá (candelabro judeu) para Roma, como se vê no Arco de Tito (onde é praticamente a única coisa não vandalizada):

Curiosamente desse minúsculo período, os judeus vão fazer moedas que sobreviveram em boa quantidade, invocando outros símbolos judaicos... ou nem tanto quanto isso:

Séc. I
Coin ArchivesJewish War. 60-70 CE. AE Half Shekel (26 mm, 15.22g). Jerusalem mint.
Dated year 4 (69/70 CE). 'Year four, half' (Shekel) in Hebrew, two lulav branches flanking ethrog.
Reverse: ''To the redemption of Zion' (in Hebrew), palm tree with two bunches of dates, flanked by baskets with dates.
Séc. I
Coin ArchivesJudaea, The Jewish War. Bronze Prutah; Judaea, The Jewish War; 66-70 CE, Year 3=68/69 CE, Prutah, 2.53g. Hendin-1363, Meshorer-204. Obv: Amphora with broad rim, two handles, and conical lid decorated with tiny globes hanging around edge; "Year 3" around in Paleo-Hebrew. Rx: Vine leaf on small branch with tendril; "the Freedom of Zion" around in Paleo-Hebrew.

Séc. I
Coin ArchivesJewish War. The Jewish War. Year 3, Silver Shekel (14.02 g) 66-70 CE. Jerusalem, Year 3 (68/9 CE). 
'Shekel of Israel' (Paleo-Hebrew), ritual chalice with pearled rim, the base raised by projections on both ends; above, 'Year 3'. Reverse: 'Jerusalem the holy' (Paleo-Hebrew), staff with three pomegranate buds, rounded base.


Não encontrei nada com a menorá, aliás não se conhece que o símbolo apareça muito antes deste transporte registado no Arco de Tito. Diz-se que um sarcófago em Magdala (descoberto há dez anos) que tem uma menorá, pode ser algumas décadas anterior a Tito.

Faço notar a presença da Palmeira (Tamareira) na primeira moeda destas três.
- Por que razão é importante? 
Porque era um símbolo de Cartago. Aparecia também nas moedas de Cartago.
Ora se as tâmaras se associavam a Cartago, também a parreira (2ª moeda) se pode associar à vinha, ou as granadas (3ª moeda)... a Granada. Para não se dizer que as inscrições são variantes fenícias, diz-se que são paleo-hebraicas. 
Ora este paleio hebraico significa que na prática não existia língua hebraica consolidada, fala-se num "aramaico" para evitar uma relação directa com o fenício. Praticamente o que se falava na região eram apenas variantes, e seria natural que o fenício de Tiro tivesse variação em Biblos, etc.

Ora, as típicas representações em moeda das palmeiras/tamareiras usavam 3 ou 4 ramos para cada lado.
Isso é engraçado porque se o topo da menorá for destacável, basta inverter, para obter o símbolo da tamareira. Três ramos são usados para o templo, e quatro para o Hannukah.
... além disso, não esquecer que apareciam dois cachos de tâmaras, um de cada lado:
A essas coisas os judeus chamam etrog (uma das 4 espécies, sendo outra folhas de palmeira - lulav).

Tal como a Fénix é um bicho mitológico que renasce das cinzas após a sua morte, e que corresponderia a um renascer da Fenícia, depois dos habitantes de Tiro se verem sujeitos a manusear moedas com a águia imperial dos gregos seleucidas/ptolomaicos, também haveria a memória de fazer renascer as tamareiras de Cartago, arrasada pela águia imperial romana, virando a menorá, para matar saudades...

Quanto à destruição do Templo de Herodes, os judeus voltaram a revoltar-se, já no Séc. II, ainda não tinha passado um século da primeira revolta. Aí já encontramos os símbolos judaicos mais típicos, para além do lulav no verso, vemos o templo com a Arca da Aliança (notando que isto já seria uma visão de quem pouco ou nada tinha visto, pois eram já passados 65 anos):

Séc. II
Coin ArchivesBar Kokhba Revolt. Year One, 132-135 CE, Silver Sela (13.95 g). Jerusalem (132/3 CE). 
In Paleo-Hebrew 'Jerusalem' on three sides of the facade of the Jerusalem Temple; show bread table or Ark of the Covenant inside with semicircular lid seen from its end at center of entrance.
Reverse: 'Year one of the redemption of Israel' (Paleo-Hebrew), lulav with etrog at left. 

O que resta do Templo - o "Muro das Lamentações", acaba por ser outro lamento, já que claramente resulta de um empilhar de grandes pedras que pertenceriam... sabe-se lá a quê!


O muro das lamentações é essencialmente uma manta de retalhos, provavelmente
reconstruído empilhando grandes pedras (não tão grandes quanto Baalbek) de um ou mais templos.

Em conclusão...
Apesar de ser cultura popular, religiosa e não só, que os judeus têm uma tradição milenar que remontaria a tempos egípcios com Moisés, e depois com Salomão, a situação objectivamente traçada por confrontação com outros registos históricos, tem tantas pernas para andar quanto acreditar na sucessão da Monarquia Lusitana feita por Bernardo de Brito... ou talvez ainda muito menos.

Símbolos judaicos como a menorá, ou outros, não se encontraram antes dos tempos romanos.
Com o registo de moedas, língua, inscrições escritas, etc, tudo vai parar à altura de Herodes, na melhor das hipóteses... ou seja, já sob domínio imperial romano.

Os historiadores gregos não deram que existissem judeus, sendo certo que haveria por ali alguém, mas não com importância de ser mencionado. Alexandre Magno passou por ali como se não existissem, e só foi parado em Gaza, onde teve de fazer mais um cerco complicado, e exibir a sua gloriosa misericórdia com o valoroso general persa inimigo, arrastando-o pelo chão no seu carro de combate até morrer.

Ora, quem ali existia digno de referência pelos gregos e restantes, eram os fenícios.
Com a queda de Tiro por Alexandre no Séc. IV a.C., com a terraplanagem de Cartago no Séc. II a.C., e já sem Cartagena ou Cádis, pela mesma altura, aos fenícios só restava sucumbirem.
Segundo o consenso histórico, teria sido isso que aconteceu... depois de um brilhante período, desapareceram da História, no fim da última Guerra Púnica.

Não me parece...
Como uma Fénix, creio que o que os fenícios acabaram por fazer foi reinventar-se.
Absorveram diversas dissidências que foram convergindo para um mesmo objectivo:
- Não desaparecer da história...
No Séc. II a.C. já contariam com vários aliados no mesmo propósito... afinal até os egípcios começavam a perder a sua relevância e cultura, ficando definitivamente greco-romanos. 
Os fenícios ligavam os deuses a homens, os sacerdotes egípcios herdeiros do monoteísmo de Akenaton, seriam os mais interessados em fazer reavivar as ideias de um monoteísmo perdido.
Nada mais natural do que lavrarem uma sagrada aliança no monte Sinai.

segunda-feira, 15 de março de 2021

King Kongo (2)

King Kong. Em 1933 saiu um filme de Hollywood que fez furou pelo mundo:

King Kong (filme original em 1933) 

O argumento foi escrito pelo inglês Edgar Wallace que o intitulou "Kong". Embora não haja explicação sobre o nome, "Kong" seria tão natural como "Gabon", pois Gabão e Congo são as duas regiões onde há a maior quantidade de gorilas. Em alternativa, Wallace terá proposto "King of the Apes", mas surgiu então "King Kong".

Acontece que alguns ingleses e americanos sabiam perfeitamente que existia uma pessoa que reclamava o título "King of Kongo"O reclamante era Pedro VII, aqui com a sua mulher, em pose de estado, no ano seguinte, em 1934: 

King - Kongo: Pedro VII (1934)

Em virtude da Conferência de Berlim (1884), o reino do Congo tinha-se colocado como reino vassalo de Portugal (1888), e depois de uma revolta em 1914, os portugueses republicanos tinham terminado com esse reino. No entanto, continuou a haver pretendentes à sucessão, tal como no caso português.

Uma associação entre uma coisa e outra parece-me acidental, e é natural que não tenha passado pela cabeça de ninguém. Nem dos produtores de Hollywood que quiseram a mudança do nome, nem do inglês que escreveu o argumento.

Pelo lado do argumento inglês encontro mais semelhanças com a descrição de Richard Burton:


que 8 anos antes da decisão da Conferência de Berlim, proclamava que a permanência inglesa em África deveria seguir "o modo dos Lusitanos dos velhos tempos heróicos", de garantirem a influência territorial  no interior através de portos bem consolidados no litoral (Prefácio, pág. x). 

O capítulo XI tem como título "Mr, Mrs, and Master Gorilla", onde para além de atribuir a primeira viagem àquelas paragens a Hanno, o cartaginês que navegou de Cádis até ao Golfo da Guiné, de onde surgiu a designação "gorila", e desmistifica mais à frente preconceitos sobre gorilas:
 

Para os portugueses que conheciam África desde o Séc. XV, estas explicações deveriam ser escusadas, mas para toda uma Europa que estava agora empenhada em redescobrir o que já estava descoberto, era como se nada existisse antes. Basta ver que a Stanley é atribuída a brava missão de cartografar o Rio Congo até à rocha onde Diogo Cão deixou a sua assinatura. Foi como se desde 1485, e passados 400 anos, ninguém tivesse entrado mais no rio...

Os jornais deram eco a essa paranoia de publicidade imperial, feita a Livingstone, Stanley ou pelos franceses a Brazza (italiano, de onde vem o nome Brazzaville). O mais curioso é que estes intrépidos exploradores, ou digamos turistas, usavam na sua equipa para além de nativos, também portugueses.
É claro, os jornais oficiais nunca deixaram de cumprir a sua função oficial - vender uma verdade conveniente às políticas dos estados, ou dos grupos de influência, que os detinham.

Um outro detalhe está no capítulo XII, onde Richard Burton associa uma ilha do Corisco (já aqui referida) a uma certa "ilha Gorila":

Acidentalmente ou não, encontramos aqui registos que sugerem o entendimento de gorilas enquanto fantásticas criaturas diabolizadas, e a existência de uma ilha Gorila, ligada às ilhas do Corisco. Referindo ainda que essas ilhas derivam o nome dos relâmpagos e tempestades que as assolavam. Ou seja, o enredo que foi usado no filme King Kong poderia encontrar-se nos mitos da época meio século antes, e não seriam poucos os que se lembrariam disso.
 
Ilha de Corisco, e a sul, à esquerda de Mbanié, existe uma minúscula ilha "Conga".

Heart of Darkness
Em 1899 Joseph Conrad publicou Heart of Darkness (Coração das Trevas), referindo a viagem pelo rio Congo em direcção a um estado idealizado pelo psicopata Kurtz, ou digamos, pelo rei Leopoldo II da Bélgica, para quem o Congo foi propriedade privada, para experiências sociais avançadas, que eliminaram milhões de "brutos" (sic). 
Uma curiosa adaptação desta obra é depois usada no filme Apocalypse Now, onde o rio deixa de ser o Congo, e sendo no Vietname, passará a ser o Mekong.

Mais uma vez, esta ligação entre Kong e Mekong será possivelmente fruto de coincidências encadeadas, não tanto porque não seja vislumbrada qualquer relação entre os rios, ou mesmo entre a situação política... digamos que Nixon não corresponderia a Kurtz, da mesma forma que isso poderia ser feito com Leopoldo. 

Zaire
O que não é completamente claro para mim, ainda hoje, é até que ponto não houve um conhecimento dos dois rios Congo e Mekong, e dos respectivos reinos associados, ainda ao tempo de D. João II.
A esse propósito desde logo adiantei que me pareceu que a viagem de Diogo Cão pode ter corrido no sentido oposto, passando pelo Estreito de Magalhães.
Porquê? 
Porque Fernão de Magalhães refere usar um mapa de Martin Behaim, para passar o estreito, quando acerca de Behaim só me parece haver registo que tenha viajado com Diogo Cão.
O rio Congo passou depois a ser designado como rio Zaire, supostamente vindo de palavra indígena n'zere, ao passo que a palavra original para o rio no Vietname seria mesmo khong.

quarta-feira, 10 de março de 2021

King Kongo (1)

Na literatura inglesa, rei do Congo é designado "King of Kongo". Estas eram as suas armas reais, onde se lê Rei de Mani Cõgo:


D. João II sempre se orgulhou de ter conseguido a conversão do primeiro rei do Congo à religião cristã, baptizado em 1491, e que adoptou o mesmo nome, João.
A partir daí todos os reis do Congo usaram nomes portugueses, até hoje.
Franceses, belgas, etc, usam por vezes um nome indígena, para evitarem ter que explicar que os reis do Congo prezavam a sua ligação a Portugal, e o nome português. Mesmo outras casas dinásticas que governaram o Congo usaram o símbolo das Quinas, como a Casa de Coulo (em francês, inglês Kwilu):
D. Álvaro I, rei do Congo em 1568.

De certa forma, os reis do Congo mantinham um controlo sobre os locais, e dominavam o comércio de escravos. Para evitarem que fossem os seus a serem usados como escravos, fariam guerra às tribos vizinhas, e vendiam os prisioneiros aos negreiros portugueses. 
O problema começou logo com D. João I do Congo, que assim que morreu D. João II, abandonou a religião católica. Os portugueses apostaram na sucessão, e quando este morreu em 1506, provocaram uma guerra cívil, apoiando D. Afonso I, o irmão que iria garantir que o Congo seria sempre católico, e até com embaixador em Roma.
O rei D. Afonso I protestou contra o comércio de escravos, que ia já além do seu controlo, e começava a haver transacção com pessoas livres, vendidas como escravos. Apesar de estar sujeito às "ordenações manuelinas", perante tal lista diz-se que ironizou, perguntando ao embaixador português, Rui de Aguiar:
  • Qual é então a punição por pôr um pé no chão?
Este reino do Congo foi varrido da memória nacional, mesmo que todos os seus reis continuassem a usar nomes portugueses. Os portugueses estavam de certa forma confortáveis com o controlo que Francisco de Almeida propusera na Índia - sempre que o governante começasse a ter ideias próprias, era mudado, por golpe palaciano ou efectiva disputa com irmãos mais obedientes.
Claro que Francisco de Almeida não imaginaria que 500 anos depois Portugal seria sujeito ao mesmo, quando cedesse a sua independência (por exemplo, a Bruxelas, ou ainda antes ao FMI).

Indo directamente ao assunto.
Com o crescimento do Império Alemão, Bismarck começou a fazer birra pelo facto de não estar a calhar nada à Alemanha como potência colonial, e promoveu a Conferência de Berlim (1884-85), que foi especialmente apadrinhada pelo rei Leopoldo II da Bélgica, visando ficar com o Congo, em nome de uma "sociedade internacional", de que por acaso era dono. Da rainha Victoria de Inglaterra, sua prima, Leopoldo recebeu o turista Stanley, muito promovido (ainda hoje), por ter andado a mapear uma África que os portugueses conheciam há séculos...

Nestas coisas, os facínoras movem-se sempre pelo "progresso da humanidade civilizada". 
Usaram ideais anti-racistas, quando queriam efectivamente dominar outras "raças", argumentando que existia escravatura em África, nos territórios islâmicos e sob controlo indígena... o facto desse comércio de escravatura existir umas décadas antes, promovido pelos próprios, não interessava nada.
Não usaram ideais libertadores, porque a contrario iam efectivamente colonizar, isso só seria usado depois da 2ª Guerra Mundial. 
Não usaram ideais de uma cândida verdura, porque iam efectivamente explorar a selva, e porque as agendas do clima, LGBT, etc... eram coisa para ficarem de molho, para cozinhar agora.

No Congo, que Leopoldo tanto queria, havia um problema:

King Kongo, D. Pedro V:

Sejamos claros, nesta conversa toda, que sabemos ser conversa para crianças numa loja de doces, havia um reino que era cristão, que tinha uma história muito mais antiga que a da Bélgica (que nem sequer tinha um século), que nunca se recusara a usar costumes europeus, que não apreciava o uso de escravos, e onde não era propriamente fácil usar de qualquer argumentação LGBT (liberdade, garantia, bonomia, e trabalho), para chegar lá e cortar como se não existisse...

O que é que isso interessou? Nada!
O rei do Congo teve que ficar sob o protectorado português de Angola, e o resto do território, foi para belgas e franceses. 

Portugal estava numa posição complicada, porque se via ameaçado por todos os lados, e só encontrou como aliado a Inglaterra, para evitar que o Congo entrasse por metade de Angola. Depois pagou isso, porque a Inglaterra achou que a ambição de Portugal ligar Angola a Moçambique, era demasiada.

O rio Congo seria um rio internacional, e através dele, Leopoldo teria acesso ao mar.
Leopoldo depois pode explicar os seus ideais progressistas ao reinar sobre o Congo, a escravatura passou a chamar-se trabalho (forçado), e outros requintes de civilização, ou seja, atrocidades, com estimativas que variam entre 1 e 15 milhões de mortos. Vivam os ideais progressistas!

Para percebermos como Portugal é que era uma nação racista, que espezinhava os negros, ao contrário das outras sofisticadas e progressistas nações europeias, veja-se esta pequena diferença, em que Rafael Bordalo Pinheiro apresenta a rainha do Congo, D. Amália, dando um sermão ao emissário que a iria representar na conferência:


Bordalo Pinheiro, que dedica uma série de números ao assunto, comenta:
  • A rainha do Congo, D. Amalia, que é incontestavelmente a pessoa mais interessada na questão que se está discutindo na conferencia de Berlm, acaba de investir de poderes de accessor pratico em aquela conferencia ao popular Zé Augusto que vae encarregado de pregar sobre a morte do Congo o mesmo sermão de lagrimas que costuma pregar por occasião do enterro do bacalhau.
Irei dedicar mais uns números a este assunto, porque isto tem pano para mangas...

Por isso, quando ouvimos a malta da nossa praça falar de "racismo" em Portugal, convém fazer notar que os únicos a invocar a questão racial são na esmagadora maioria auto-denominados "anti-racistas".
Também nenhum careca gosta de ser chamado "careca", e não é por isso que vou classificar comentários como carequistas, ou fazer a apologia do anti-carequismo
A maioria dos "anti-racistas" são brancos que querem chamar "pretos" a quem não pertencer ao seu clube de ignorantes. Ou seja, querem ser racistas à sua maneira. Como a maioria, estão-se totalmente a borrifar para os negros, mas usam esse pretexto para censurar pessoas e opiniões, como qualquer inquisidor medieval.
Na quase totalidade, desconhecem os contornos manipulatórios onde são usados como marionetas.
Já agora, quero ver aparecer o primeiro anti-racista militante, que mencionou, ou sequer conhecia os reis do Congo com nome português.
Haja paciência, porque falta paciência para tanta estupidez militante...

sábado, 6 de março de 2021

Fernão de Magalhães (5) a chegada a Guam

Em 6 de Março de 1521, há 500 anos, Magalhães avista Guam, e encontra de novo indígenas, o povo Chamorro, os primeiros após os patagões, e ter atravessado o Pacífico desde o fim de Novembro de 1520. Terá antes avistado ilhas a que chamou São Paulo e Tubarões, mas estas foram as primeiras habitadas que viu depois de sair do Estreito de Magalhães.

Magalhães chamou-lhe Ilha das Velas Latinas, porque os chamorros apareceram em barcos com velas latinas, mas o nome que passou foi ilha dos ladrões, devido à descrição contada por Pigaffeta, onde se notava que aos nativos lhes faltava a noção de propriedade individual.

Uma das peculiares construções existentes em Guam são os chamados "latte" ou seja, "menires com chapéu", a que já tinhamos feito referência nas Lendas da Micronésia, e que nessa particularidade do chapéu, parecem ter alguma conexão com com os moais da ilha da Páscoa. Porém faltou-lhes um rosto e o mesmo tipo de publicidade...

 
As chamadas construções "latte" da ilha de Guam

Guam é actualmente um território sob controlo dos EUA, ou seja é na prática uma das várias colónias americanas, sendo a mais famosa Porto Rico, que não tem direito ao estatuto de estado, e cuja maior parte saiu de anexações feitas aos espanhóis na Guerra Hispano-Americana (1898), onde perderam as Filipinas, Guam, Cuba e Porto Rico. Até 1959, nem o Havai, nem o Alasca, eram estados americanos, e portanto também funcionavam como colónias.

Estas construções latte são consideradas que poderiam funcionar como pilares para suster o chão de uma habitação, como se pode ver neste exemplo em Guam (Umatac, 1937):
... em que as colunas servem para colocar a habitação a uma razoável altura do solo (impedindo a entrada de animais).
A baía jacente a esta povoação Umatac, tem a rocha de Fouha (ou Fua): 
... um megalito natural, onde se centra o mito de criação chamorro, de que já demos conta

Como os mitos costumam gostar de unir coisas, é também tradição local ter sido aqui que Magalhães aportou após ter atravessado o Pacífico.

Há o Guam Discovery Day, mas nem consegui saber se este ano foi comemorado... em Portugal, é certo que fez um bonito blogue Magalhaes500.pt, onde me parece que se o 500 serve para indicar alguma coisa deverá ser o dinheiro dispendido (em milhares de euros), só para benesses e comendas para uma comissão inútil.
Para meu espanto, creio que este é o único site que se foi lembrando de comemorar estes 500 anos.

Conforme já se foi percebendo, Magalhães foi completamente esquecido e este pequenos apontamentos nem sequer servem jornais, quanto mais telejornais, mais preocupados com a compra de computadores "Magalhães" (de onde virá o nome?) para as escolas, por causa da "pandemia".

Não, não se trata de uma pandemia, estamos mesmo no meio de um pandemónio.

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Nota (07/03/2021). Links para os textos anteriores a este respeito:

sexta-feira, 5 de março de 2021

Costas de Portugal


Há costas e costas...

Por alguma razão, temos dois significados:
  • as costas da zona costeira
  • as costas do corpo humano 
e isto é particular da língua portuguesa! 

Se há uma certa ligação latina no termo "costa", que é aplicada à zona costeira, depois no que diz respeito às costas do corpo humano, mesmo os espanhóis usam "espalda", os italianos "spalla, schiena", os franceses "dos", os ingleses "back"... ou seja não há propriamente uma tentativa de ligar a costa às costas!
No entanto, essa primitiva ligação às costas ficou-lhes nas costas... por exemplo, quando se referem a costela, os espanhóis dizem "costilla, chuleta", os italianos dizem "costola", os franceses dizem "côte", e só os ingleses vão buscar "rib". O mesmo se passa com "costoletas", onde espanhóis, italianos e franceses também vão usar termos semelhantes e só em inglês é diferente (o alemão usa também "kotelet", talvez por influência francesa).

Portanto, parece-me que há alguma evidência que o termo "costas" aplicado às "costas" tem um sentido mais antigo, já que as línguas derivadas vão buscar a essa designação primeira, para as variantes de costelas e costeletas, mas só o português manteve a ligação à costas do corpo humano. 
Porquê?

Creio que é mais ou menos claro olhando para o mapa onde se fala português, e que se pode estender bem até à Galiza, e olhando para o aspecto das costas, neste caso ilustrei com a espinha, que está virada para a frente, mas poderia ser igualmente feito com o perfil das costas de alguém, nesse caso virado de costas para o mar.

Acontece que aparece muitas vezes, com um significado algo arbitrário, ligado a um esoterismo rosacruxiano, a comparação que Fernando Pessoa invocou, dizendo que Portugal era o rosto da Europa:
A Europa jaz, posta nos cotovelos 
(...)
O rosto com que fita é Portugal.

Noutros casos aparece como cabeça, e talvez o caso mais conhecido é este mapa atribuído a Heinrich Bunting (Séc. XVI) "Europa Prima Pars Terrae in Forma Virginis":



Quando escrevi os textos Tarso e depois Carpo, fiz notar que as designações não pareciam surgir literalmente do "pé para a mão", e que havia uma possível associação das partes geográficas às particularidades do corpo humano. 

Neste caso, isto parece ainda mais evidente no caso das Costas, já que o perfil da costa portuguesa, aparece como se fossem as costas de uma figura humana. Em particular a espinha iria corresponde à região entre Tejo e Douro, que foi onde se decidiram instalar os Turdúlos Velhos, o povo mais antigo de que há menção em Portugal. Essa seriam as costas que levariam até um sacro na Roca, e que terminavam sem cabeça na Cale, a Gaia do Porto. A cabeça seria o correspondente Minho... ou noutra versão mais antiga, o corte da cabeça seria feito pelo Minho para a Galiza, e não pelo Douro.

Isto é apenas uma observação fortuita, que não significa nada de especial, excepto que este exemplo junta-se a dezenas de outros que fui aqui mencionando, que parecem mostrar que a língua portuguesa poderá preceder as restantes, ditas de origem "latina"... ´