Alvor-Silves

terça-feira, 26 de julho de 2011

As sete monarquias

Segundo Manuel de Figueiredo teriam existido 7 monarquias até à época em que escrevia:

  • 1ª Monarquia - Assírios (2183 a.C - 823 a.C) - de Nembroth (Nimrod) a Sadanalapo (Sardanapalo)
  • 2ª Monarquia - Medas e Caldeus (823 a.C - 531 a.C) - de Arbaces a Astiages; de Beloco Sul (??) a Baltazar (Belshazar)
  • 3ª Monarquia - Pérsia (531 a.C - 329 a.C) - de Ciro II a Dario III
  • 4ª Monarquia - Macedónica (329 a.C - 46 a.C) - de Alexandre Magno à linha sucessória dos generais
  • 5ª Monarquia - Romana (46 a.C. - 331 d.C) - de Júlio Cesar a Constantino Magno
  • 6ª Monarquia - Constantinopla (331 d.C - 800 d.C) - de Constantino Magno a Carlos Magno
  • 7ª Monarquia - Germânica (800 d.C - .... ) - de Carlos Magno até então (1603).
A 7ª Monarquia terá terminado em 1806, pois de facto com Francisco II terminou o Sacro-Império Germânico... momentaneamente terá passado para Napoleão, que se sagra imperador em 1804, mas a potência que se estabeleceu como reinante foi a Inglaterra, de Jorge III, definitivamente com a vitória de 1815 em Waterloo. Esse domínio foi consolidado alguns anos depois, com a Rainha Vitória e Disraeli, mas já era efectivo desde a vitória na Guerra dos Sete Anos (1756-63). Podemos por isso falar de uma 8ª monarquia britânica, que se estende na Commonwealth.

O que era entendido por Figueiredo nesta divisão por monarquias seria a definição da potência dominante. Não vemos aí listada a Grécia, o Egipto, a Fenícia, ou Cartago... mas vemos uma sequência ininterrupta!
A origem está na Babilónia, e mantém-se nessa parte até ao advento de Alexandre... são quase 2000 anos, e como só Júlio César a levará para Roma, temos aí depois outros 2000 anos. 
Os grandes protagonistas, os "Magnos", estão aí listados, mas também estão outros personagens menos conhecidos.

(1) Para ilustrar Nimrod, que Figueiredo diz ser "o inventor da monarquia", basta apresentar o conhecido quadro de Bruegel sobre a Torre de Babel:
Nimrod é visto como alguém que desafiou o poder de Deus, procurando que o homem atingisse esse estatuto divino. Na prática teria tentado essa perfeição instaurando uma tirania, que originou fugas. Uma das fugas dessa tirania teria desembarcado em Lisboa, de acordo com Pinho Leal. Tendo havido múltiplas fugas, de cuja migração surgiram várias nações, faz sentido associá-lo à questão da divisão em várias línguas. O ponto comum dessas várias tribos dissidentes seria o repúdio à tirania de Nimrod.
Dante coloca-o preso no seu Inferno, soltando a frase enigmática: "Raphèl maí amèche zabí almi".

(2) Há um excepcional quadro de Delacroix que ilustra a queda de Sardanapalo... o último rei desta primeira monarquia, deposto por Arbaces.
Apesar de Arbaces ser uma figura "demasiado" pouco conhecida, terá dividido o poder entre duas potências - os Medas e os Caldeus/Babilónia. Aqui não haveria apenas uma potência, tendo surgido dois focos de poder. Assurbanipal e Nabucodonosor serão protagonistas desse domínio...
É difícil perceber até que ponto Figueiredo ignora tudo o resto... 
Por exemplo, nesta divisão, a Guerra de Tróia não tem qualquer efeito na alteração da potência dominante. A vitória dos Aqueus sobre os Troianos é um facto lateral que não teria tido importância no domínio da potência Assíria. Isto já para não falar na omissão dos reinos orientais, hindús, mongóis ou chineses... Sobre os Egípcios, Figueiredo irá fazer uma divisão em dinastias, mas não os inclui nas monarquias!
Uma possível interpretação é que se os Assírios exerciam um poder sobre o resto do mundo (pelo menos europeu), os Egípcios teriam conseguido apenas manter alguma independência.

(3) Da Babilónia, passamos a Persépolis com Ciro II, o Grande. Ciro derrotará os arianos, e estabelecerá o Império Aqueménida/Persa. Se na tradição bíblica as figuras anteriores são mal retratadas, o mesmo não se poderá dizer de Ciro, que libertará os judeus do seu cativeiro. 
Ciro visita os corpos do Rei de Susa (tornado seu aliado) e da mulher que se suicida.

Com Ciro há também uma substituição religiosa, com a instituição do Zoroastrismo, de Zaratustra, e parece ter havido alguma harmonia multicultural sob o seu império. No entanto, nem Ciro, nem Dario ou Xerxes, seus sucessores, iriam deixar a política de conquistas... tendo os gregos sido uns dos principais visados! É especialmente estranha esta insistência na rivalidade greco-persa que só se terá manifestado acentuadamente com os Aqueménidas, tendo passado despercebida antes, com Nabucodonosor ou Assurbanipal, por exemplo.

(4) Como contraponto, serão os gregos macedónios a conquistar a Pérsia e a destruir todo o legado cultural existente em Persépolis, com a vitória de Alexandre Magno sobre Dario III, em Ipsus, 333 a.C. Alexandre que morrerá aos 33 anos e por isso rapidamente a sua monarquia é dividida pelos generais.
O estatuto de potência única deixará de existir, convivendo na rivalidade entre Seleucidas, Antigonidas, e Ptolomaicos. É especialmente instrutiva a menção sobre o testamento de Alexandre, ao dizer que pretendia circumnavegar... a África(!), mas especialmente que pretendia uma migração de populações de ocidente para oriente e vice-versa, com o propósito de miscigenação. Que ocidente tinha ele em seu poder? Toda a sua conquista não tinha sido feita no sentido oriental?
Se este último desejo tivesse sido satisfeito, pois seria natural encontrar populações ocidentais deslocalizadas em territórios orientais, talvez mantendo o seu antigo nome, mas em territórios diversos, prestando-se à confusão!

(5) Este domínio multipartido dos generais de Alexandre será quebrado com a ascenção de Roma.
O protagonista fulcral será Júlio César... mas parece aqui claro que o seu principal papel na consolidação do império pelo lado romano ocorrerá na destituição do último reduto do legado de Alexandre. Ou seja, no domínio sobre o Egipto dos Ptolomeus... na cedência de Cleópatra. A última resistente vai sucumbir, depois da vitória de Octávio Augusto sobre Marco António.
César e Cleópatra

Porém, é aqui que importa parar um pouco... não há dúvida de que Roma passou a ser a monarquia dominante... mas, antes de Júlio César era uma República!
Ou seja, a Roma é dado este estatuto, de sucessor para a 5ª monarquia, justamente quando muda esse regime político... como se isso fosse condição necessária para um poder que já estava consolidado desde a queda de Cartago! (Roma já nessa época não teria rival à altura...)
Acrescenta-se a isto que os próprios romanos vão ficar muito limitados nas suas progressões.
Sintoma destas monarquias... atingem rapidamente uma grande expansão territorial, mas depois estabilizam nesses territórios, não havendo propriamente uma segunda expansão significativa.
Há vários factores, que há muito nos fazem suspeitar que este poder monárquico não seria o último degrau na cadeia de poder... Sejamos mais precisos. De que forma se instituiu o primeiro poder monárquico e de que forma caíu? Será que caíu? Será que não se manteve activo? 
Será que os magos afastados pelo Zoroastrismo Aqueménida não procuraram restabelecer o seu poder, nem que tivesse sido para isso necessário apoiar um Alexandre estrangeiro, que foi efémero no seu império... Podemos compreender as restrições romanas nas conquistas, mas dificilmente é compreensível a sua estagnação técnica e de exploração marítima... quanto mais não fosse, progredindo pela costa africana, como teria sido desejo de Alexandre. E essas mesmas restrições vão-se manter de umas monarquias para as suas sucessoras.

(6) A sexta monarquia parece ser uma passagem formal sem sobressaltos, feita pelo próprio Constantino. Há uma mudança de capital para Bizâncio, e uma mudança de religião... só isso são motivos para considerar uma diferença. Até porque a profunda divisão que se irá seguir, entre Império Romano Ocidental e Oriental, justifica isso mesmo.
Constantino - estátua em York, onde foi aclamado imperador.

Figueiredo acaba por considerar que a linha sucessória da Monarquia será continuada por Bizâncio, e só regressará ao lado Ocidental com Carlos Magno.

(7) A importância que é dada a Carlos Magno tem justamente a ver com essa recuperação do ceptro imperial para o lado ocidental, passando para o Sacro-Império Germânico - até à queda dos Habsburgos... formalmente representada na derrota austríaca contra Napoleão em Austerlitz.
Carlos Magno

Aliás, a relutância ibérica em abdicar do calendário hispânico, que começava em Augusto, estará ligada a essa reforma educacional medieval levada a cabo por Carlos Magno. Perante a derrota de Carlos Magno em Roncesvalles, os hispânicos não reconheciam por completo esse carácter imperial germânico, chancelado por interposto papal e cúria romana. Continuavam a colocar a sua monarquia de referência como sendo a de César e Augusto... vemos aqui como a questão religiosa não era tão importante quanto a política. O calendário com o Ano Domini, nascimento de Cristo, podia esperar pelos desenvolvimentos políticos. Assim, não é de estranhar os sucessivos contenciosos com o papado ao longo da 1ª Dinastia Portuguesa.
Poderiam navegar fora da chancela imperial, mas isso seriam actos não reconhecidos... até que com D. João I a situação muda. O calendário AD é finalmente aceite e o Infante D. Pedro vai-se colocar ao serviço do Imperador Segismundo, e segue-se a autorização de "des-cobrir". Os reinos europeus parecem independentes, mas estão interligados e condicionados pela chancela imperial que é efectivada pela cúria romana e bulas papais.

(8) O poder do Sacro-Império sofre um grande revés com a derrota dos Habsburgos espanhóis na Guerra dos Trinta Anos, entrando em declínio acentuado, concentrando-se especialmente em assegurar o poder do Império Austro-Húngaro. Perante esse desfecho, segue-se um período de nações, de absolutismo local, sem a restrição do poder imperial, e ficam por definir os territórios ainda "não descobertos"... Da Guerra dos Trinta Anos até à Guerra dos Sete Anos, esses "novos" territórios ficam em suspenso, e é após o desfecho vitorioso inglês, em 1763, que se seguem, passados poucos anos, as explorações de Cook.

A queda formal do Sacro-Império na derrota de Austerlitz, coloca um Napoleão na posição de reclamar o ceptro Imperial, e é mais curioso pois é ele próprio que decide colocar a coroa na sua cabeça, e depois na cabeça de Josefina... não haveria ninguém com mais poder do que o próprio!
Aparentemente seria assim, mas a partir daí acabaram-se as vitórias napoleónicas... e começa o acentuado declínio que o levará a Elba e depois a Santa Helena. Apesar dessas derrotas, a França emerge facilmente, sem os constrangimentos financeiros que vão atormentar os aliados ibéricos no Séc. XIX, destinados a pagar a factura das guerras. Isso tem um motivo estratégico... de qualquer forma, o Sacro-Império acabava de tombar graças à França e a Napoleão. O último episódio da transferência de poder, e fim completo do Império Austro-Húngaro, irá dar-se com a Primeira Guerra. E é claro que podemos ver a Segunda Guerra como uma tentativa gorada de recuperar o ceptro imperial para o lado germânico, entre múltiplos outros factores concorrentes e divergentes...
Porém, como dissemos, isto apenas revela uma componente da movimentações, pelo lado visível das monarquias dominantes, pelo que não podemos ignorar as componentes menos visíveis...

3 comentários:

  1. Fica a questão: e quem está por detrás? E quem está, hoje, por detrás?

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  2. Cara Olinda,
    os nossos olhos estão sempre apontados para frente, por isso mesmo quem está por trás acho que dificilmente estará convencido de que é o último.
    É claro que há quem a meio da fila julgue que é o último e vê tudo, mas eu diria que é só uma questão de tempo...

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  3. Mas eles sabem que nós sabemos....
    Será que ainda assim não têm medo?

    Maria da Fonte

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