Alvor-Silves

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Sinais vermelhos

Quando há uns meses colocámos aqui um post com o título Traffic Signs, não estávamos exactamente a pensar no que Estrabo (passarei a usar esta variante do nome, mais apropriada) nos tinha para revelar (Livro 1):
All those who have sailed along the coasts of Libya, whether starting from the Arabian Gulf, or the Pillars, after proceeding a certain distance, have been obliged to turn back again on account of a variety of accidents;
Se tivesse sabido desta passagem de Estrabo, teria sido usada nesse cartoon de Março.
Mas podemos hoje acrescentar algo mais...
Estávamos concentrados na proibição em navegar para além dos Pilares (Estreito de Gibraltar), ao longo da costa de África, e faltou-nos o outro lado... que ele chama o Golfo Arábico, ou seja o Mar Vermelho.

Ao ler a transcrição somos imediatamente confrontados com alguns problemas que se colocaram aos tradutores... digamos que se viram gregos (língua do original, que desconheço largamente), e misturam termos recentes com termos antigos, nomeadamente sobre o Mar Eritreu (Erythraen Sea). A confusão será já própria de Estrabo, que invoca Eratóstenes sobre uma antiga passagem entre o Mar Vermelho e o Mediterrâneo, por inundação. Estrabo contesta a inundação argumentando que o nível do mar seria uniforme, pelo contacto entre todos os mares. Com o nível do mar elevado, podemos ver que essa ligação pode ter existido:
Médio-Oriente com o nível do mar elevado
(o Mar Morto seria mesmo um mar, ou baía, 
e a África ficava separada, como uma ilha)

Porém a verdadeira questão é outra... é que o Mar Eritreu também foi designação aplicada ao golfo que se situava no exterior das Colunas de Hércules, na altura em que a ilha Eriteia era situada a oeste dos Pilares, conforme já abordámos a propósito do Lago Tritonis.

Ou seja, havia um Mar Vermelho a Ocidente e outro a Oriente. Só para confusão?
Em parte sim, mas creio que havia outra questão que Estrabo torna clara:
- quem se arriscasse a navegar para além destes pontos, arriscava os mais diversos acidentes!
Acidentalmente, ou o acidental mente... porque os acidentes sistemáticos deixam de ser acidentes.
Se pensámos que o Acidental era Ocidental, Estrabo reporta que também se aplicava às navegações africanas pelo lado oriental.

Onde estavam os Sinais? 
- Um Sinai estava junto ao Mar Vermelho, próximo do Egipto...
- Creio que o outro Sinai estava do outro lado, na península que definia a zona de Tingis, a antiga Tanger, na Mauritania Tingitana.
Tratavam-se de Sinais Vermelhos... a proibição de navegar não poderia passar aqueles mares "vermelhos", em direcção a África.

Porquê?
Pela razão que Aristóteles invocava sobre Cartago... o medo de que os refractários se instalassem nos territórios paradisíacos. Se cidadãos instruídos formassem novas civilizações fora da alçada do controlo central, as colónias passariam a ser uma ameaça para os territórios originais. Dada a extensão africana... e americana, a proibição seria a primeira arma de controlo, caso contrário poderia formar-se um reino suficientemente poderoso que ameaçaria o poder instalado no Mediterrâneo, e os seus segredos sobre as terras virgens ficariam ameaçados. Esse problema teve que ser resolvido na Austrália, antes da sua descoberta oficial por Cook. Digamos que a América, os EUA, foram a primeira experiência autorizada para uma colónia independente dos velhos poderes europeus!

Aliás, se pensarmos bem, só uma política de ocultação justificaria a ausência de contactos reportados entre romanos, indianos ou chineses. Será ridículo pensar que a República Romana não sentiu curiosidade de enviar os seus navios pelo mundo fora, pelo menos na rota de Alexandre Magno... que já o teria feito! Há apenas o incidente relatado por Cornélio Nepote, de que já falámos, e processou-se no sentido inverso, com uma visita à Europa.


A partir daqui fica ainda mais claro que a passagem do Mar Vermelho ou Eritreu, tanto se poderia dar pelo lado oriental ou ocidental, indo no mesmo sentido daquilo que já dissemos sobre o Mar Eritreu e sobre os Ebreus do Ebro.


Aditamento (22/06/2011)
Esqueci-me de tornar explícita a relação com o texto sobre o Mar Vermelho apontado nos mapas do Séc. XVI de Ortelius, Ghisolfi e Agnese:
Os dois mares vermelhos, coloridos no mapa de Agnese, 1544.

O que estes autores pretenderiam colocar em evidência é que havia um novo Sinai Vermelho... a Califórnia! Esta península seria o novo Sinai, onde se colocava um novo Mar Vermelho - as navegações acima da Califórnia ficariam proibidas!
Não admira pois que essa seja o foco de concentração de muitos judeus, especialmente no Séc. XX, tratava-se de assinalar um novo Sinai... na Califórnia.

A estória será esta... Moisés abriu caminho pelo Mar Vermelho, passando o Mar Proibido, sujeitando-se aos Mandamentos divinos, e assim atingiu a Terra Prometida. Conseguiu uma libertação temporária para o seu povo, mas esqueceram o problema de libertação universal... Digamos que os magos de Nabucodonosor fizeram lembrar aos judeus essa universalidade com o preço do cativeiro. Quando Ciro acaba por restituir alguma liberdade aos judeus, volta a estar implementada a restrição universal dos Sinais vermelhos! O que é surpreendente, é que esta restrição é de tal forma poderosa que não podemos olhá-la em termos europeus... nenhuma nação asiática entrou em contacto directo com a Europa, durante milénios.

Primeiro o Infante D. Henrique, e depois Colombo acabam por ter assim papel fundamental na nova autorização de levantar o cobrimento, ou seja, a autorização de descobrimento, dos novos territórios... em certo sentido figurado poderia ser-lhes atribuído um papel messiânico, ao nível de Moisés.

Porém, fica claro que houve uma nova proibição no Séc. XVI, que é ilustrada neste mapa de Agnese, e que já identificámos várias vezes... a Austrália e o Noroeste Americano ficariam proibidos até Cook, que será na mesma linha o próximo a ter autorização para descobrir a parte restante.

Se colocamos demasiado o foco no papel da Hispânia, é porque ele se vai revelando, mas não ignoramos o detalhe da migração judaica para a zona da Etiópia, também aqui marcando a transposição do outro Mar Vermelho. O Obelisco de Psamético na praça de Montecitorio, de que falámos, usado como relógio de Sol por Augusto, é afinal o último marco de conquista egípcia nos territórios núbios a sul. Nesse sentido pode dizer-se que se a alguns judeus foi aberta a passagem para a Etiópia, aos Egípcios ela esteve sempre fechada.

Para quem seguiu ainda o outro blog alvorsilves, saberá que no último dia de 2009 decidimos marcar a passagem para 2010 no fuso californiano, e desde então usámos aqui a hora do Pacific Time.
A estória vai batendo certo, e se isso é algo surpreendente pela positiva, é mais surpreendente pela negativa revelando a dimensão do controlo. Talvez quando houver autorização para passar ao Planeta Vermelho, Marte, nos seja autorizado perceber toda a nossa História!
Até lá, o novo Sinai Vermelho parece ser o planeta nomeado pelo deus da guerra... quanto a Vénus, planeta da deusa do amor, que tanto passou por Lucifer, portador da luz a nascente, como por Hesper, sinal de esperança a poente, Vénus continua proibido a observações!

10 comentários:

  1. E se a Passagem foi a do Mar Vermelho do Ocidente....como creio, vamos encontrar Moisés e os seus, do outro lado do Atlântico:
    Na Terra Prometida.

    É aliás o que se deduz das próprias palavras de Cristóvão Colombo, quando alude ao afastamento das águas no tempo de Moisés.

    O que explicaria perfeitamente a necessidade absoluta da interdição da América...

    Curiosamente, estes acontecimentos seriam coincidentes com aquilo que alguns descrevem como a última passagem do Elenin, Cometa ou Estrela Anã, pela Terra.

    A sua órbita seria de cerca de 6 Mil anos, pelo que teria passado há cerca de 12 500 anos,no tempo de Noé, e de novo, no tempo de Moisés.

    Não me é fácil, confirmar a Órbita do Elenin, mesmo que seja de cerca de 6 Mil anos, explicaria realmente as famosas Torres de Mousa, e as do Grande Zimbabwé, mas deixaria sempre em aberto, o mistério das alterações cósmicas contemporâneas da Morte de Cristo.

    E o que aconteceu nesse Tempo, e onde efectivamente toda a História se passou, é fundamental para que compreendamos o que se seguiu.

    Abraços

    Da Fonte

    ResponderEliminar
  2. 1 - onde arranja estes mapas tão bonitos de inundações?

    2 - em respeito à Eritreia ocidental? E se o mar estivesse, não mais alto, mas mais baixo (como terá estado na era glacial)?

    ResponderEliminar
  3. Cara Fonte,
    tenho que colocar um aditamento explicitando o outro Sinai vermelho - a baía da Califórnia!!

    Sim, parece haver um certo simbolismo coincidente entre essas figuras.
    Eu estaria mais inclinado para a seguinte versão da história... para Moisés a Terra Prometida seria apenas a Ibéria! Assim, teria sido contra esses povos ibéricos que Josué lutaria, conquistando essa primeira terra.

    Depois, numa segunda fase, especialmente com Salomão, devem ter seguido através do navegadores hispânicos as rotas para além do Mar Vermelho.

    A Terra prometida misturou-se assim... primeiro a Hispânia de Moisés, depois as terras americanas de Salomão, a mítica Ophir. Não será à toa que na nossa toponímia a praia de Ofir está junto à Maia!

    Quanto ao Elenin... não sei nada, e não me fio em informações de Nubiru, e outras coisas tornadas populares, sem que perceba exactamente de onde vem esse fundamento.

    Cumprimentos!

    ResponderEliminar
  4. Cara Olinda,
    os mapas sou eu que faço, ou seja programo, a partir de mapas de terreno que estão disponíveis na internet, como o Google Maps.
    Uma das coisas curiosas é que se quisermos mapas desse género temos que ser nós a fazê-los!!
    Já antes, há vários anos, quando se falava do aumento do nível do mar, me perguntara por que razão não se viam mapas desses (simulações com diferentes níveis de mar), agora acho que percebo porquê... não era conveniente!

    Quanto à outra questão, eu tenho muitas dúvidas sobre o que foi a era glacial, que já deixei expressas aqui:
    elefantes-pelos-mamutes.html
    especialmente depois de ver a descrição do Buffon sobre a quantidade de ossos de elefante que eram retirados da Rússia!
    A "idade do gelo" é uma noção solidificada no Séc.XX, e como eu tenho tendência a desconfiar de toda a selecção de achados recentes, fico também desconfiado dessas provas.

    Segundo Estrabo, o Eratóstenes argumentava mesmo que teria havido uma ligação fechada nas Colunas de Hércules... e que depois foi aberta.
    Isso daria sentido ao mito associado à abertura do estreito por Hércules... pode ter sido ele a iniciar o projecto!
    Bom... porém parece-me mais algo do domínio figurado, e a abertura de Hércules terá sido mais no sentido de levantar a primeira proibição - passar as colunas e permitir o contacto com a Europa Ocidental.
    Ou seja, haveria um confinamento autorizado apenas à bacia do Mediterrâneo.

    Se quiser, pode entender que os carcereiros tinham os presos separados em diversos grupos... os da China não contactavam com os da India, e nenhum destes com os do Mediterrâneo.

    Cumprimentos!

    ResponderEliminar
  5. Anteriormente já tinha lido o post sobre os elefantes/mamutes. Contudo, um nível do mar mais baixo teria inúmeras ilhas atlânticas que permitiriam a navegação. A subida do nível do mar daria origem a mitos (Atlântida e Dilúvio), não estranhos, quando as civilizações crescem perto do mar e de rios.

    Entretanto encontrei um sítio muito interessante: http://flood.firetree.net/?ll=40.7259,-8.6037&z=6&m=6
    Mas os seus mapas pressupõem subidas muito maiores do nível da água. Uma questão pertinente é: até que ponto pode subir o mar? (relacionado com a quantidade de água existente no planeta, e a possibilidade (impossível) de todo o gelo derreter

    ResponderEliminar
  6. Cara Olinda,

    muito obrigado pelo link, é sempre bom confirmar as coisas com outros sítios. Tem razão, eu coloco o nível de água mais alto do que 60 metros, podendo ir a mais de 100 metros nos mapas mais exagerados. Não tomei nota do valor que aumentei, pois interessava-me mais ver a situação geográfica e não tanto o valor. Posso ver isso, mas implica fazer de novo...

    Tem toda a razão, admitindo um volume de água constante, o que está nos pólos podemos fazer umas contas com a Antártida:
    - espessura de gelo média = 2 000 metros
    - superfície de gelo = 13 milhões Km2
    - superfície de oceanos = 71% de 510 milhões Km2

    Isto dá aprox. 72m de altura com o gelo da Antártida.

    A Maria da Fonte já tinha falado em 120 metros no post sobre o Cáspio, o que baterá certo se juntarmos 50m para a parte um pouco menor que cobre o Pólo Norte.

    Porém, a mesma questão sobre o volume constante da água, colocada pelo Calisto, levou-me ao post sobre o Raio da Terra (em Fevereiro)... e de acordo com a teoria tectónica em vigor, pela pressão interna das correntes convectivas do manto, o raio deveria aumentar, e as contas que colocariam Eratóstenes certo dizem 1% em 2000 anos. Isto não dá grande diferença - passaria de 120 a menos de 125 metros... mas se o processo tiver sido mais violento antes, nos 2000 anteriores, poderá chegar a 150 metros (acho que a simulação mais drástica tinha 200 metros).

    Mas a questão nem é tanto essa, é que a deposição de areias, etc... distorce as coisas - pode ter dunas de 50 metros junto à praia, e serem temporárias... é mais nesse sentido que não é errado colocar um valor mais alto. As zonas onde se sabe que eram portos em Portugal no séc. XIX, p.ex. Alfeizerão, têm pelo meio até S. Martinho algumas elevações arenosas de dezenas de metros.

    Estou de acordo que acima de 200m seria exagerado sem outra explicação.

    Não é impossível o nível de gelo ter sido muitíssimo menor, se toda a temperatura fosse mais alta, e ao mesmo tempo se colocar a ausência dos meses de noite constante.

    É por isso que a questão das estações é tão importante... com a inclinação a 10º e não a 23º, isso significa colocar os círculos polares a 80º e não 67º... ou seja, só uma pequena parte das calotes polares ficaria sob noite permanente durante o inverno.
    Essa sim é uma poderosa mudança, que explicaria a questão do gelo permanente ser muito menor, e consequentemente haver bastante mais água nos oceanos!

    Eu acho que o nível mais baixo da água existiu, mas muito, muito antes... ou seja, alinho na hipótese da água ter resultado da colisão de algum grande cometa, ou melhor de mais do que um!
    Se existiam civilizações à época, leva-nos ao mito da Atlântida...

    Deixe-me só finalizar dizendo que quem conseguia navegar no Mediterrâneo sem seguir a linha de costa... quase todos os antigos, também chegaria à América, é uma questão de arrojo pessoal e persistência. É quase impossível não ter acontecido em séculos com Fenícios, Gregos, Egípcios, Romanos, etc...

    Cumprimentos, e obrigado pelas perguntas pertinentes.

    ResponderEliminar
  7. Os movimentos tectónicos não poderiam alterar cursos de rios? De modo a que regiões acessíveis por barco o deixassem de ser?

    Sobre isto, há registos gregos de terramotos que fizeram crescer fragas. E recordo também, de ter lido algures há já algum tempo, sobre a alteração do curso do Tejo em 1755. :D

    ResponderEliminar
  8. Os movimentos tectónicos (conhecidos) nunca foram registados com magnitude de provocar alterações de paisagem significativas... apenas coisas "pequenas", ainda que grandes para as consequências humanas.
    As inundações/maremotos foram sempre mais devastadores, do que sismos isolados ou vulcões.
    Será de admitir que tal fosse mais frequente nos tempos antigos, mas será apenas suspeita, sem saber exactamente onde e o quê! Passa-se o mesmo com colisão de meteoros ou cometas...

    Sobre 1755 pois... parece que houve alterações na zona de Sacavém.
    Tem aqui dois links a propósito disso:

    http://alvor-silves.blogspot.com/2010/12/batalha-do-tres-reis.html

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Da_f%C3%A1brica_que_falece_a_cidade_de_Lisboa

    Será que havia uma ponte sobre o Tejo há "muitos mil anos"?

    Cumprimentos!

    ResponderEliminar
  9. Muito obrigada pelos links.

    Entretanto descobri uma coisa, que não tendo nada a ver, certamente gostará: http://mitologia.blogs.sapo.pt/72707.html

    Cumprimentos!

    ResponderEliminar
  10. Cara Olinda,
    isto funciona melhor com troca de cromos...

    Muito interessante o "Alexamenos"!
    E o que lá está escrito?
    O que eu leio (... mas não sou perito) é o seguinte:
    - AVE MARIENOS CEBETE (JEOVI)
    ou seja:
    Avé, Mariano (filho de Maria),
    e Cebete (Sebete pode também ser)
    pode referir-se a Cebete Tebano:
    http://it.wikiquote.org/wiki/Cebete_Tebano
    e à citação
    "Você prefere viver mal ou bem morrer?..."
    Quanto a Qeon ou Theon parece forçado, também posso ler Jeovi de Jeová!

    Quanto ao Y representa Jesus, em suma - não há nenhum Alexamenos!

    Quem interpretou presumiu uma confusão com os Lambdas e Xi gregos, esquecendo ainda a grafia antiga do R... e que as letras apareciam rodadas às vezes!
    Mais, acho que colocar Alexamenos e ignorar Cebete é um erro autorizado e propositado.

    Para termos uma ideia do que é a arte divinatória de perceber o que está escrito caligraficamente, aconselho a excelente compilação de escritos de Pompéia:
    http://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Ancient_Roman_inscriptions_in_Pompeii

    Já fiz uma vez um post sobre isso aqui:
    http://odemaia.blogspot.com/2011/02/romanas-maiusculas.html
    ... mas mais uma vez o material é tanto, que dava para uma dezena de posts!

    Quanto ao "deus de cabeça de burro"... é assim mesmo, não deixar de interrogar razões banais que podem não ser banais, para expressões comuns. Fez-me lembrar a história do príncipe de orelhas de burro do José Régio.

    Obrigado pelo link e cumprimentos!

    ResponderEliminar