Alvor-Silves

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Nota de Rodopé

A Rodopé foi atribuída a mais pequena das três pirâmides de Gizé (Miquerinos). A situação começa logo por ser confusa porque aparentemente Rodopé era um pedreiro escravo no Egipto. Porém, a atribuição a si da construção de uma pirâmide faz pensar mais em "pedreiro livre". 
A sua ligação a Esopo, outro escravo, é feita por La Fontaine, e a ligação de La Fontaine a Esopo faz-se através das fábulas, que são surpreendentemente semelhantes... Se escreveu sobre ele, é provável que La Fontaine tenha também lido a fábula de Esopo sobre "a formiga e o gafanhoto", a história de uma formiga trabalhadora e de um gafanhoto folião, que depois se vê obrigado a pedir-lhe comida no inverno. Agora, o que é que esta história de Esopo tem a ver com a bem conhecida Fábula de La Fontaine entitulada "A cigarra e a formiga"? O gafanhoto ter passado a cigarra? Uma lista de fábulas de Esopo pode ser encontrada aqui, e as várias coincidências de histórias podem dever-se a um olhar inculto, que não capte a inovação. E, sendo irónico, ao mesmo tempo não sou - a outra hipótese não deve ser descartada, porque as pequenas subtilezas fazem o gosto do secretismo cortesão.

Ora, esta nota de Rodapé, encontrei-a num livro de 1665, de Olfert Dapper, "Description d'Afrique", pag. 67, onde pouco antes se encontram duas ilustrações que concatenei:
Assinalei com duas setas vermelhas dois bustos. Um, próximo do Nilo, será a Esfinge com corpo de leão, quanto ao outro busto... não faço ideia. Seria liberdade criativa do autor? Finges ou Esfinges?
E todas aquelas pirâmides juntas? Contavam-se 17, segundo o relato citado do Príncipe Radzivil, que diferencia as duas principais, atribui a 3ª a Rhodopé, que dizia ser a mais perfeita em acabamento... ao contrário do que se vê hoje.

Mas, hoje, também se sabe que as esfinges, quando lhes cresce o nariz, pode cair pela gravidade.
Conforme se ilustra na wikipedia há algumas imagens da esfinge (e talvez da outra estátua) ainda com o nariz, pelo menos até 1700. Depois, o nariz cai... e há quem diga que foram os soldados de Napoleão, mas há uma imagem reportada a 1755, de F. L. Norden, que mostra uma estátua sem nariz.
Porém, nestas coisas conviria haver menor suspeição. Não ajuda as imagens terem uma legenda em francês, reportando a uma tradução de 1798, consequentemente posterior à expedição. Por azar, não se encontram as imagens originais, e também por azar, há um inglês que tendo viajado em 1755 desenhou a estátua com nariz. O cuidado que a expedição francesa teve, em deixar tudo como tinha encontrado... ou quase(!), também ajuda pouco. Mas isso faz parte da história, e é preciso compreendê-la, antes de a julgar. 

Ora, fomos de Rodopé às Esfinges. As esfinges cumpriam um papel importante na mitologia, e lembramos imediatamente de Édipo e de Tebas, ensombrada por uma esfinge. O coitado do Édipo, apesar de resolver o enigma da esfinge, e libertar Tebas do pesadelo, não lhe bastavam as chagas nos pés, teve ainda uma vida desgraçada.
Porém, aqui é ilustrativo fazer uma pequena comparação abusiva. A esfinge que atormentava Tebas seria também aquela que serviria para lhe levar o melhor rei, ou pelo menos um rei suficientemente perspicaz para resolver aquele enigma. Nesse sentido, o papel de "mau da fita" da esfinge acabaria por servir o propósito de salvaguardar Tebas, e o próprio Édipo... assumindo que só ele poderia resolver o enigma. O inimigo dos falsos pretendentes seria amigo do pretendente correcto... afastando-se nessa altura.
A comparação abusiva é com o papel da gestação humana. Os espermatozóides surgem todos como inúmeros pretendentes a uma estrutura ovular, que faz de virgem ofendida, colocando uma parede à sua investida, deixando-os perecer à sua sorte. Normalmente o que o óvulo não saberá é que também se não escolher nenhum, estas coisas têm regras...
Entendido desta forma, o papel de Édipo é o do espermatozóide bem sucedido, que passa a parede da esfinge, para encontrar uma Tebas, que quer afinal cruzar os seus cromossomas com o os do sábio forasteiro. Imagino que este tipo de mitologia esteja presente desde os tempos do culto de fertilidade, e pode invocar uma replicação de estrutura fisiológica, para o campo social.
Porém, estas coisas nem sempre são como nós queremos, e parece que o destino de Édipo estava traçado... ao invés de pastar ovelhas, foi bater nas paredes de Tebas. E também sabemos, que se Édipo não fosse ter com a Esfinge, era natural que a Esfinge aumentasse o seu raio de acção, acabando por o apoquentar no seu pasto... como já dizia Maomé.

Podia falar, analogamente, da figura do "Mecias", e escrevo assim, sem "ss", porque o "c" permite uma pequena variação de letras para "em Isac", e referir como são sacrificados cordeiros para lembrar a poupança do filho eleito de Abrão. Ora eu não fiz a linguagem, mas não posso deixar de notar no Velo de Ouro, ou no Tosão de Hórus... enfim, trocadilhos a desvelar, com colares menos explícitos, já agora.

Na parte da mitologia que falta contar, em Gaia, há uma estrutura suporte, que detém a ordem, uma visão, metade do sistema... a outra metade é externa, será filha do caos, do exterior, e terá a outra visão. Nessa mitologia de contornos fisiológicos, mas que é uma figuração de ideias, a estrutura ovular é preservada, pois é dela que sairá o ovo. É claro que se não houver ovo, entramos numa figuração diluviana.

Por outro lado, se é preciso dar nome ao ovo, ele está há muito presente como ícone. Primeiro, porque se deve separar "i-cone". E o cone numa perspectiva, numa sombra, parece uma pirâmide, mas pela base é um círculo. Sobre o equilíbrio entre as duas estruturas, já falei aqui. Sem as duas visões falha a perspectiva da outra dimensão. De um lado, do lado da realidade, do entendimento da ordem, está a perspectiva mãe, do outro lado, naquilo que parece ser acaso, caos, está a parte paterna.
O cone tem figurações que escapam à pirâmide quadrangular, justamente porque a base não é de raiz quadrangular... tem como génese a "quadratura do círculo", ou se quisermos, a "circulatura do quadrado", e o seu nome é Pi, e "ainda não tem vida". Pi está no nome "pirâmide", mas não na sua estrutura... aliás o prefixo "pi", podemos encontrá-lo em "pico", "pilar", e mais não "falo".
Porquê?
Porque haveria de a relação entre uma estrutura e outra se estabelecer com um número particular?
Teria que ser algum... é claro, mas não há nenhuma razão particular de não se estabelecer de forma racional, e sim transcendental. Na nossa compreensão do universo essa razão estabelece-se. Essa é uma ligação entre a nossa compreensão racional possível e o universo. Uma limitação que eventualmente está ligada à nossa condição material, e até biológica... onde somos meros seres definidos pelo número 5. 

Em resumo, para a parte de História, o que interessará mais será perceber o que aconteceu aos monumentos das pirâmides... o resto pode ser visto, se quiserem, como fabuloso, não de fábula de La Fontaine, nem de Esopo, mas de quem está farto de assistir à tosquia.

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