Alvor-Silves

sábado, 30 de outubro de 2010

Centum Cellas (por Calisto)

A propósito de Egitânia, é de recordar o texto sobre Centum Cellas num antigo comentário por Calisto, que deveria ter aparecido como post na altura, ilustrado com algumas figuras.

Torre de Centum Cellas

Sobre Centum Cellas vou tentar ser sucinto. Das poucas escavações que por lá se fizeram (presumo que Aurélio Ricardo Belo), é de registar um pote de barro com ossos de criança calcinados.


Sem avançar nas explicações técnicas a existência de rasgos para encaixe de aros nas 3 janelas cimeiras que dizem respeito a um terceiro andar levam a colocar fora de dúvida a adaptação do edifício primitivo, a funções diferentes daquelas para que foi construido.


Origem de enormes furos que atravessam as paredes laterais e a do fundo, que alguns autores tomam como portas pode-se prender com a lenda da existência de um boi de ouro enterrado...logo andaram uns poucos à procura do dito boi.


As ruinas situam-se a 11km em linha recta do cabeço das Fráguas.

Inscrições em Cabeço das Fráguas

A zona tem possantes jazigos de cassiterite, e o Zêzere descrevia uma curva de maior amplitude do que aquela que agora descreve "(...) recebia a ribeira da Gaia no sítio dos Catraios, em frente a Centum Cellas (...)"


Edifício composto de um nucleo com anexos ligados às paredes laterais. Núcleo tinha 2 pavimentos os anexos 1. A planta do conjunto é rectangular e este era absolutamente simétrico a 1 plano axial.
Fachada principal virada para o nascer do sol nos maiores dias do ano.


Nas ombreiras de todas as portas do R/ch, há rasgos horizontais, junto das vergas, onde se encaixavam os tabuões. As portas giravam sobre 2 espigões fixos. Rasgos semelhantes existem nas ombreiras de vão de portas de certos templos do antigo Egipto.
Ignora-se o significado das 3 janelas rectangulares e desiguais (vê-se na foto que incluiu no artigo) que assentam nas vergas das portas exteriores, em Efeso a pia baptismal tem um grupo de 3 rectângulos que dizem ser símbolo da trindade...

Éfeso: pia baptismal

De acordo com o autor, Vitrúvio não aplicou a secção dourada e não refere na sua obra Arquitectura, se a conheceu, guardou segredo.
Das relações geométricas, vou deixar 2 ou 3 apontamentos para não me tornar muito extenso.
  • Sala do 2º pavimento (abrangia totalmente o 2º pavimento e cujs aberturas davam para uma varanda que a contornava, provavelmente o motivo principal do edifício). Parede (que se vê) que fica à esquerda na foto, composta de porta pequena, janela, porta grande, janela, porta pequena. Portas menor dimensão: a relação entre as 2 dimensões (altura, largura)é a dimensão da planta do partenon (rectangulo do partenon), a razão entre a diagonal e o segmento que une um dos vértices ao ponto médio do lado maior, oposto, é igual ao número de ouro.
  • A parede de topo que aparece na foto de frente (1 porta de maior dimensão ladeada por 2 janelas que parecem quadradas):o arquitecto procurou inscrever 2 secções douradas, justapostas pelos lados menores, num rectangulo de comprimento igual à largura da sala e altura igual à distancia que vai do pavimento às vergas da janela, a mesma em 12 vãos da sala. Porem para manter a medida de 2,18m e conservar a razão entre as 2 dimensões da secção dourada perfeita, o arquitecto foi obrigado a aumentar ligeiramente o lado maior destas. Assim este lado ultrapassa, de perto em 11mm , a metade da largura da sala. Na grande piramide de Gizé existe um corredor com 2,18m de altura. Mero acaso?
Tudo o que escrevi (e muitas mais relações, realmente impressionante) encontra-se no livro que referi, o que achei notável e fascinante foram as relações arquitectónicas/geométricas que o autor encontrou. Desculpe a extensão, mas foi a forma que encontrei para mostrar que as relações realmente existem.


Autor: Calisto (texto em comentário sobre Brito Bluteau, com algumas ilustrações incorporadas)

3 comentários:

  1. Caro Calisto

    Centum Cellas deixa-me perplexa!
    A fachada Principal, está voltada a Oriente, logo, Centum Cellas é posterior a 10 500 a.C.
    Mas o corte das pedras é óbviamente Megalítico. Tem para lá uns enxertos mais recentes, que se percebem de imediato, porque são toscos, feitos à mão, sem rigor.
    Mas o corpo principal é feito de pedra cortada mecânicamente. É perfeito, como Tiahunaco.

    É isso que me confunde. A data.
    Centum Cellas deveria estar virado a Ocidente, onde o Sol nascia há 12 500 anos. Mas não está.

    Maria da Fonte

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  2. Cheguei dez anos atrasado a esta publicação, mas o tempo não nos deve impedir de olhar para os temas com olhos de ver.
    Estive no Colmeal da Torre, em Belmonte, em Outubro de 2018. Sítio incrível e, na minha humilde opinião, muito mais enigmático do que o habitual selo "construção romana" dos nossos arqueólogos e historiadores faz crer. Neste país continua-se a dizer que tudo o que é antigo e construído por não se sabe bem quem é "romano", tal como o povo há décadas atrás dizia que tudo o que era antigo era "dos mouros", fosse uma mamoa com cinco mil anos ou um santuário rupestre dos lusitanos com dois mil e quinhentos anos.
    A primeira foto que aparece na sua publicação deixou-me curioso, já que apresenta estruturas que não se encontram hoje visíveis no local. nomeadamente uma área murada, com alguma profundidade (deve ter, pelo menos, um metro, dado o ângulo em que foi tirada a fotografia) e vêem-se até o que parecem ser os restos de duas colunas cilíndricas. A foto foi tirada olhando para a Torre a partir de nordeste, na direcção sudoeste, mas o local que aparece na foto está, presentemente, coberto com terra.
    Veja-se esta foto em 360º disponível no Google Maps e percebe-se que hoje seria impossível tirar essa foto porque o muro em causa estará, presumivelmente, soterrado.

    https://www.google.com/maps/@40.3776263,-7.3429177,3a,75y,344.62h,67.22t/data=!3m8!1e1!3m6!1sAF1QipNTiGaE-TD6XgUShtjHDitwqtzbNGXly9YrERcl!2e10!3e11!6shttps:%2F%2Flh5.googleusercontent.com%2Fp%2FAF1QipNTiGaE-TD6XgUShtjHDitwqtzbNGXly9YrERcl%3Dw203-h100-k-no-pi-4.265847-ya318.3512-ro4.855926-fo100!7i5472!8i2736

    Porque se fez isso? Com que objectivo? Terão sido espaços alvo de trabalhos arqueológicos que, após terem terminado as escavações, voltaram a ser enterrados? E que é feito dos vestígios ali encontrados? Estarão no depósito escuro e bafiento de algum museu municipal ou até nacional, convenientemente escondidas da vista do público?

    Acrescento um outro dado que pode ser relevante para este tema.
    São Cornélio, a quem era dedicada uma igreja que existiu perto da Torre de Centum Cellas e da qual hoje quase nada resta, foi o 21º papa da Igreja Católica num dos momentos mais conturbados do Catolicismo, num período de cisma e grandes perseguições. Em Março de 251 d.C. é eleito papa, contra a sua vontade, mas após o recomeço das perseguições dos cristãos acaba por ser exilado, em Junho de 252 d.C., na cidade de Centum Cellae (hoje Civitavecchia, em Itália) vindo a falecer um ano depois.
    Temos assim uma narrativa com elementos históricos devidamente fundamentados que ocorreram em Itália, nos primórdios da Igreja Católica, e que é transportada para o interior de Portugal, para um local que ostenta o mesmo nome (Centum Cellas ou Centum Cellae) que a localidade onde São Cornélio esteve detido. Existe uma ligação directa entre São Cornélio e o nome do local. As histórias viajam para sítios inesperados...

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    1. Obrigado.
      Acho que o único atraso é quando nos chega ao olhar e recusamos ver... porque todos os outros atrasos raramente são culpa própria.

      Sim, estou completamente de acordo com a excessiva simplificação da classificação monumental ibérica, que no caso português ainda é mais agravada.

      Deixei essa observação sobre as Pontes:

      https://alvor-silves.blogspot.com/2011/06/pontes-o-lethes-do-esquecimento.html

      porque praticamente, ou não houve, ou não resistiram outras pontes, que não fossem romanas!

      Não sabia que o local tinha sido soterrado.
      Já fiz planos de lá ir, e ainda não fui lá... digamos que não tem sido um ponto de atracção turística para a família, e não me dispus a ir lá sozinho.

      Essa observação sobre São Cornélio em Centum Cellae italiana, Civitavecchia, é bastante interessante, até porque se repararmos nas suas Termas Taurinas:

      https://it.wikipedia.org/wiki/Civitavecchia#/media/File:Terme_Taurine_Caldarium.jpg

      reparamos que o edifício dá uma ideia tosca do que poderia ser talvez a coisa que mais assemelhasse a esta construção.

      No entanto, a Centum Cellas portuguesa nada tem a ver com construção romana... são blocos tipicamente megalíticos, próprios de construções associadas a tempos anteriores, e eu diria que mesmo anteriores às Citânias.

      Em Espanha-Catalunha também há uma Centcelles:

      https://es.wikipedia.org/wiki/Villa-mausoleo_de_Centcelles

      mas nesse caso os mosaicos são tipicamente romanos, e a associação a construção romana parece legítima.

      No caso português, se as escavações tivessem dado qualquer coisa relacionada com Roma, pois teriam prosseguido e divulgado resultados... assim temos a habitual postura dos historiadores, que é um discurso recorrente:
      - não sabemos, é um mistério...
      ou
      - é uma construção romana, não pode ser outra coisa

      porque os lusitanos eram umas bestas incapazes de fazer o que quer que fosse.

      As tentativas europeias (especialmente francesas) de forçar que a época pré-romana não seja mais sofisticada em Portugal do que foi em França, Alemanha, etc... chegam a meter dó.

      Cumprimentos.

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